O conteúdo do celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do presidente Jair Bolsonaro (PL), veio a público nessa sexta-feira (16), após o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirar o sigilo das mensagens, tornando pública a análise da Polícia Federal.
Registros encontrados no aparelho de Mauro Cid mencionam cinco militares em diálogos sobre atos e movimentos contra a democracia, em uma tentativa de manter Bolsonaro no poder. São eles: Coronel Jean Lawand Junior, General Édson Skora Rosty, Tenente-coronel Marcelino Haddad, Major Fabiano da Silva Carvalho e Sargento Luis Marcos dos Reis.
Saiba quem são os citados:
Coronel Jean Lawand Junior
Jean Lawand Junior é coronel de Artilharia do Exército e de acordo com a Polícia Federal, foi identificado em uma troca de mensagens com Mauro Cid sobre um possível convencimento de Jair Bolsonaro para uma tomada autoritária de poder.
"Pelo amor de Deus, Cidão. Pelo amor de Deus, faz alguma coisa, cara. Convence ele a fazer. Ele não pode recuar agora. Ele não tem nada a perder. Ele vai ser preso. O presidente vai ser preso. E, pior, na Papuda, cara", afirmou o coronel Jean Lawan Junior, em mensagem enviada a Cid, em dezembro de 2022. Segundo a Polícia Federal, o então auxiliar de Bolsonaro respondeu que o "PR [Presidente da República] não pode dar uma ordem...se ele não confia no ACE [Alto Comando do Exército]".
Na última troca de mensagens com Cid, Lawand demonstrou estar decepcionado com a inação de Bolsonaro. "Soube agora que não vai sair nada. Decepção irmão. Entregamos o país aos bandidos". Cid respondeu: "Infelizmente".
Lawand é formado desde 1996, em Ciências Militares pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Tem pós-graduado em Ciências Militares pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO) e Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Entre 2017 e 2020, chefiou o 6º Comando de Mísseis e Foguetes. Antes, foi Oficial de Ligação do Exército na empresa Avibras Aerospacial. Também exerceu o cargo de comandante do Corpo de Alunos da Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), em Campinas (SP).
Em março de 2021, Jair Bolsonaro, então presidente, concedeu a ele a Ordem do Mérito Militar no grau de cavaleiro. Recentemente, foi nomeado para um posto diplomático nos Estados Unidos, mas o ato foi suspenso após a divulgação das mensagens. Atualmente, Lawand exerce o cargo de supervisor do Programa Estratégico ASTROS do Escritório de Projetos do Exército.
General Édson Skora Rosty
Édson Skora Rosty, então general de Divisão do Exército, também foi identificado pela Polícia Federal em um áudio encaminhado por Lawand a Cid. Em dezembro do ano passado, o coronel do Exército escreveu ao então ajudante de Bolsonaro que "ele [em referência ao então presidente] tem que dar a ordem", em alusão a tentativas de mantê-lo no poder. Na sequência, Lawand encaminha o áudio, que afirma ter recebido de um "amigo do QG [Quartel-General]".
“Meu amigo, na saída do QG [Quartel-General] encontro bom o ROSTY, SCmt COTER. Foi uma conversa longa, mas para resumir, se o EB [Exército Brasileiro] receber a ordem, cumpre prontamente. De moto próprio o EB [Exército Brasileiro] nada vai fazer porque será visto como golpe. Então, está nas mãos do PR [presidente da República]", diz a mensagem.
Segundo a PF, o "nome ROSTY pode estar relacionado ao General de Divisão, Subcomandante de Operações Terrestres do Comando de Operações Terrestres do Exército Brasileiro, EDSON SKORA ROSTY", cargo que exerceu entre julho de 2022 e abril de 2023, quando foi transferido para a reserva pelo presidente Lula.
Durante o governo Bolsonaro, também exerceu os cargos de diretor de Ensino e diretor de Civis, Inativos, Pensionistas e Assistência Social do Ministério da Defesa. E recebeu do então presidente, em maio de 2022, a Ordem do Mérito da Defesa no grau de Grande-Oficial.
Rosty tem mestrado em ciências militares pela Escola de Comando e Estado Maior do Exército e pela Academia de Guerra do Exército do Chile. Foi comandante da 16ª Brigada de Infantaria de Selva das Missões em Tefé (AM) e comandante da 12ª Região Militar da Amazônia Ocidental, em Manaus.
Tenente-coronel Marcelino Haddad
O tenente-coronel Marcelino Haddad Aquino Carneiro, atual comandante do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro, é apontado pela Polícia Federal como o responsável por encaminhar a Mauro Cid um conjunto de arquivos sobre o emprego das Forças Armadas para a "garantia dos Poderes constitucionais". À época, ele era tenente-coronel de Comunicações. Os arquivos defendem a tese das Forças como "poder moderador" e incluem uma consulta ao jurista Ives Gandra.
Nas respostas às questões, o tenente-coronel Haddad defende a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal atribui às Forças o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de "inimigo externo ou crise entre poderes". No entanto, essa tese foi refutada por juristas de diversas tendências, como o ministro Joseli Camelo, presidente do Supremo Tribunal Militar (STM), ministros do STF e entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Antes de assumir sua posição atual, o tenente-coronel Haddad foi assessor da Cooperação Militar no Paraguai. Sua carreira no Exército teve início em 1996, e ele desempenhou funções como instrutor da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) e da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO). Além disso, ele comandou o 16º 1º Pelotão de Comunicações de Selva, em Tefé (AM), e a 20ª Companhia de Comunicações Paraquedista, no Rio.
Major Fabiano da Silva Carvalho
O tenente-coronel Fabiano da Silva Carvalho, atualmente exercendo o cargo de adjunto da Seção de Doutrina e Estudos do Centro de Comunicação Social do Exército, é mencionado no relatório da Polícia Federal como o destinatário inicial da mensagem do jurista Ives Gandra sobre a tese de que o artigo 142 da Constituição Federal confere às Forças Armadas o papel de poder moderador, que poderia ser empregado em caso de "inimigo externo ou crise entre poderes".
No entanto, ao consultar o Portal da Transparência, que reúne informações sobre servidores públicos da União, constata-se que existe apenas um Fabiano da Silva Carvalho vinculado ao Ministério da Defesa. Vale ressaltar que ele ocupa a patente de tenente-coronel, que é superior à de major.
Sargento Luis Marcos dos Reis
O sargento do Exército Luis Marcos dos Reis, que está atualmente na reserva, recebeu uma seção especial na análise realizada pela Polícia Federal do conteúdo do celular de Mauro Cid. Dos Reis foi um dos presos pela PF em maio durante uma operação que investigava fraudes em cartões de vacina do ex-presidente e seus auxiliares.
Dos Reis aparece pela primeira vez em uma conversa com Cid sobre manifestações com tendências golpistas em frente ao Quartel do Exército de Goiânia (GO). Na época, Cid estava cotado para assumir o comando do Batalhão de Ações e Comandos de Goiânia, uma unidade de Operações Especiais. No entanto, a posse foi suspensa pelo novo comandante do Exército, Tomás Miguel Ribeiro Paiva.
A PF destacou que, quando questionado sobre a manifestação, Mauro Cid afirmou: "Mais fácil eu ajudar os caras do que tirar de lá". De acordo com a PF, Dos Reis também participou dos atos golpistas em 8 de janeiro, chegando a subir na cúpula do Congresso. Ele ainda esteve presente no acampamento no Quartel-General do Exército em Brasília e incentivou a "tomada de poder pelas Forças Armadas". A PF enviou um documento ao ministro Alexandre de Moraes, no qual indica que o sargento enviou vídeos e imagens de suas participações nas invasões às sedes dos Três Poderes.
Dos Reis ingressou no Exército em 2004, no Rio de Janeiro, e participou de missões no Haiti. Entre 2013 e 2016, atuou como motorista e segurança pessoal do comandante do Exército. De janeiro de 2020 a julho de 2022, desempenhou o cargo de supervisor na Ajudância de Ordens da Presidência da República 8, diretamente ligado a Cid. Em julho de 2022, assumiu o cargo de coordenador-geral de Mobilidade e Conectividade Turística no Ministério do Turismo, mas foi exonerado em janeiro pelo governo Lula.