Já é amplamente reconhecido que a atividade física faz bem ao corpo, mas seu impacto sobre a saúde mental é igualmente poderoso. Mesmo assim, muitas pessoas continuam tratando esses dois aspectos como áreas separadas, quando, na verdade, fazem parte de um mesmo processo de cuidado integral.
Grande parte dos treinos segue focada apenas no desempenho físico: gastar energia, ganhar força, melhorar a postura ou aumentar a mobilidade. O que geralmente fica de fora é a intenção — o ato de se movimentar não apenas para moldar o corpo, mas também para nutrir o equilíbrio emocional e mental.
Diversos estudos já demonstram que praticar exercícios de forma regular reduz quadros de ansiedade e depressão, aprimora a capacidade cognitiva e melhora a qualidade do sono — um pilar fundamental para o humor e a estabilidade emocional. Porém, quando o assunto é saúde mental, não é qualquer tipo de movimento que gera os mesmos efeitos. A maneira como nos exercitamos faz toda a diferença.
Com mais de vinte anos de atuação como treinadora mente-corpo no esporte profissional, acompanhei atletas de alto rendimento desenvolvendo força, flexibilidade e resistência, ao mesmo tempo em que fortaleciam a resiliência emocional. Técnicas de respiração, consciência corporal e regulação do sistema nervoso fizeram parte desse processo — e são ferramentas acessíveis a qualquer pessoa que queira se sentir melhor no dia a dia.
Movimento consciente x exercício automático
Empurrar o corpo até o limite em treinos desconectados da atenção plena não produz os mesmos resultados que mover-se com consciência. O verdadeiro trabalho mente-corpo exige presença, respiração intencional e escolhas que respeitem o funcionamento do sistema nervoso.
A ligação entre corpo e mente ocorre, principalmente, pela atuação do sistema nervoso. O nervo vago, que conecta o cérebro ao trato digestivo, é peça-chave nesse processo: ele influencia desde batimentos cardíacos até humor e regulação emocional.
Quando respiramos de forma profunda e ritmada durante o exercício, estimulamos esse nervo, ativando o sistema parassimpático — responsável pelos estados de descanso e recuperação. Isso reduz o estresse, melhora a concentração e tira o corpo do ciclo de alerta excessivo.
Ao contrário, treinos muito intensos, pouca recuperação e respiração desordenada aumentam o cortisol e podem gerar sensação de exaustão. Por isso, escolher o tipo certo de exercício — e a abordagem adequada — é essencial para o bem-estar físico e mental.
A boa notícia é que não é necessário transformar completamente sua rotina para torná-la mais equilibrada. Basta começar incorporando algumas estratégias simples. E, claro, antes de iniciar qualquer programa de exercícios, consulte seu médico. Se sentir dor, interrompa imediatamente.
1. Use a respiração como base do treino
A respiração é o recurso mais rápido para influenciar o sistema nervoso. Inclua práticas respiratórias no início, no meio e no fim das sessões.
No aquecimento: use respiração diafragmática para acalmar a mente e conectar-se ao corpo.
Durante a mobilidade: sincronize respiração e movimento para favorecer amplitude, postura e rotação.
Nos exercícios de força: expire no momento do esforço para gerar estabilidade e controle do core.
No resfriamento: prolongue a expiração para potencializar o relaxamento — por exemplo, inspirando por quatro tempos e expirando por oito.
2. Faça exercícios de mobilidade com foco e intenção
Além de aumentar a flexibilidade, a mobilidade consciente fortalece a percepção corporal e contribui para regular o sistema nervoso. Movimentos como rotações guiadas pela respiração e liberações profundas dos quadris são ideais para aquecimentos ou dias leves, promovendo clareza mental e fluidez no corpo.
3. Ajuste a intensidade para fortalecer a resiliência
Treinos muito intensos têm seu valor, mas não devem dominar a semana. Alternar dias de maior esforço com atividades leves — como caminhada, ioga, alongamentos e exercícios de mobilidade — ajuda o corpo a se recuperar e reduz a carga emocional, prevenindo desgaste físico e mental.
4. Mantenha presença total nos movimentos
Seja qual for o treino — força, cardio, mobilidade ou recuperação — a qualidade do movimento depende da atenção. Executar repetições distraído ou com pressa aumenta o risco de lesões e reduz os ganhos.
Observe o alinhamento do corpo, o ritmo da respiração e a sensação de cada movimento. Quando a mente se dispersar, use a respiração para voltar ao momento presente. Estar consciente transforma o treino em uma prática de autocuidado integral.
5. Faça check-ins mentais ao longo do treino
Reserve alguns segundos antes, durante e após a atividade para avaliar como você está. Pergunte-se: “Onde há tensão?”, “Como está minha respiração?”, “O que meu corpo precisa agora?”
Essas pequenas pausas ajudam a transformar o exercício em uma ferramenta de regulação emocional — e não apenas em um esforço físico.