O garimpo ilegal em terras indígenas na região Norte do Brasil aumentou mais de oito vezes entre 2016 e 2022, apontam dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). As atividades foram detectadas nas Terras Indígenas Yanomami, em Roraima, e em seis reservas do Pará: Sai-Cinza, Munduruku, Baú, Kayapó, Apyterewa e Trincheira/Bacajá.
A atividade de garimpo em terras indígenas ganhou projeção nacional em razão da crise sanitária na Terra Indígena Yanomami, a maior do país. Devido ao avanço do garimpo ilegal na região, crianças e adultos enfrentam casos severos de desnutrição e malária.
Segundo os dados do Inpe, em 2016, durante o governo de Michel Temer (MDB), a área de mineração ilegal em terras indígenas estava em 12,87 km², o equivalente a quase metade do arquipélago de Fernando de Noronha. Em 2021, na gestão de Jair Bolsonaro (PL), o número registrado aumentou 787%, cerca de 114,26 km² --787%. Houve queda em 2022, também sob Bolsonaro, quando 62,1 km² foram detectados como área de mineração ilegal.
EVOLUÇÃO DO GARIMPO ANO A ANO
- 2016 - 12,87 km²
- 2017 - 48,72 km²
- 2018 - 79,17 km²
- 2019 - 97,24 km²
- 2020 - 92,38 km²
- 2021 - 114,26 km²
- 2022 - 62,1 km²
Para Luciana Gatti, pesquisadora e coordenadora do Laboratório de Gases de Efeito Estufa do Inpe, houve um projeto de exploração econômica na Amazônia durante o governo Bolsonaro. As iniciativas envolviam desmatamento para plantação de soja, milho e explorar minérios, diz.
"Ele foi alterando as políticas públicas, desmantelando órgãos de fiscalização e tomando um monte de medidas para tornar inefetivas as leis de proteção ambiental —tentando, deliberadamente, alterar leis no Congresso", afirma Luciana.
O impacto é direto no solo e nos rios, com a fauna e flora afetadas, além da higiene e sobrevivência da população local, segundo a pesquisadora. "É um desastre do ponto de vista humano e ambiental.", diz.
No início de 2022, Bolsonaro assinou um decreto criando o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala.
O principal objetivo, segundo o texto, era "estimular o desenvolvimento da mineração artesanal e em pequena escala", com o objetivo de alcançar o "desenvolvimento sustentável regional e nacional", mas que incentivou a mineração em terras protegidas, como apontam especialistas.
Para além dos resultados locais imediatos, o desmatamento causado pelo garimpo influencia no aquecimento global. A devastação ambiental à queda no volume de chuva e ao aumento na temperatura.
"Esse estrago causa mudanças climáticas e vai tornando mais difícil recuperar a floresta. O crime que ocorre ali é hediondo e afeta a coletividade de uma maneira que todos nós vamos pagar a conta", afirma Luciana Gatti.
EMERGÊNCIA NA TI YANOMAMI
No dia 20 de janeiro, o Ministério da Saúde do governo Lula (PT) decretou emergência na Terra Indígena Yanomami para atender indígenas com fome e sem atendimento médico. Entre as causas de malária desenfreada na região está a exploração ilegal de mineiros por parte de garimpeiros.
A estimativa é que ao menos 20 mil garimpeiros estejam ilegalmente na Terra Indígena Yanomami. São pouco mais de 30 mil Yanomami na área que deveria, por lei, ser preservada. No entanto, a comunidade sofre com o avanço do garimpo ilegal, que apenas em 2022 cresceu 54%.
Na quarta-feira (8), uma força-tarefa do governo federal destruiu um avião, um trator de esteira e estruturas usadas na logística do garimpo. Dois dias depois, na sexta (10), a Polícia Federal deflagrou a operação Libertação para combater o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami.
Entre os alvos da operação está Vanda Garcia de Almeida, irmã do governador de Roraíma, Antonio Denarium (PP), e o sobrinho dele, Fabrício de Souza Almeida.A suspeita da PF é de que havia um esquema de lavagem de dinheiro era de oriundo da extração ilegal de ouro da Terra Indígena Yanomami. Além da irmã e do sobrinho, outros parentes do governador estão entre os alvos das buscas da PF.
Dados coletados pelo MapBiomas indicam que 9,3% de toda atividade de garimpo no país, em 2020, ocorreu dentro de áreas indígenas. As Terras Indígenas Kayapó e Munduruku, ambas no Pará, e a Yanomami, em Roraima, lideram o ranking. A expulsão de garimpeiros em Roraima tem potencial para agravar a situação em outras TIs da região Norte, em especial no Pará.
Com Roraima no radar das autoridades e a Aeronáutica no controle do espaço aéreo, garimpeiros fogem de barco, arriscam voos e passam dias em caminhadas para cidades no entorno. Além disso, seguem rumo a outros pontos de garimpo já conhecidos. A 1,2 mil quilômetros da TI Yanomami fica a reserva Munduruku, a mais próxima dentro do Pará.
FONTE: G1 GLOBO