Neste domingo (18), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) classificou como 'genocídio' os ataques de Israel na Faixa de Gaza e comparou a situação às mortes no Holocausto. O presidente fez a comparação enquanto criticava os países ricos que suspenderam o financiamento à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente Próximo (UNRWA, na sigla em inglês).
"O que está acontecendo na Faixa Gaza não existe em nenhum outro momento histórico, aliás, existiu, quando Hitler resolveu matar os judeus", afirmou Lula durante entrevista a jornalistas no hotel em que Lula está hospedado em Adis Abeba, a capital da Etiópia.
No final de janeiro, oito países - Austrália, Reino Unido, Canadá, Itália, Suíça, Holanda, Alemanha e Finlândia - juntaram-se aos Estados Unidos na suspensão temporária do financiamento, em meio a uma escassez crescente de recursos no enclave. A UNRWA anunciou que iniciaria uma investigação e afastou "vários" acusados após a denúncia do governo israelense de que funcionários da UNRWA estiveram envolvidos no ataque terrorista do Hamas a Israel em outubro do ano passado.
"Quando eu vejo o mundo rico anunciar que está parando de dar contribuição para a questão humanitária aos palestinos, fico imaginando qual é o tamanho da consciência política dessa gente e qual o tamanho do coração solidário dessa gente que não está vendo que na Faixa de Gaza não está acontecendo uma guerra, mas um genocídio. Não é uma guerra entre soldados. É uma guerra entre um exército altamente preparado e mulheres e crianças. Se teve algum erro nessa instituição que recolhe dinheiro, apura-se quem errou, mas não suspenda a ajuda humanitária para um povo que está há décadas tentando construir o seu Estado", afirmou Lula, na coletiva de imprensa na Etiópia.
Lula anunciou também que o Brasil fará um "novo aporte de recursos" para a UNRWA, mas não detalhou valores:
"Não posso dizer quanto porque não é o presidente que decide, preciso ver quem dentro do governo cuida disso para saber quanto vai dar, mas também vamos defender na ONU a definição de um Estado palestino reconhecido definitivamente como pleno e soberano. É preciso parar de ser pequeno quando a gente tem que ser grande", afirmou.
A Confederação Israelita do Brasil (Conib) repudiou as declarações de Lula. Para o Conib, trata-se de "distorção perversa da realidade" que "ofende a memória das vítimas do Holocausto e de seus descendentes".
Aliança global
O presidente, que retorna neste domingo (18) ao Brasil, foi convidado para discursar, no último sábado (17), na sessão de abertura da cúpula da União Africana. Ele também teve reuniões bilaterais com líderes do continente e com o primeiro-ministro da Autoridade Palestina, Mohammad Shtayyeh. No encontro, ele criticou tanto Israel quanto o Hamas.
Em seu discurso, ele afirmou que o momento é "propício" para se resgatar tradições humanistas e que isso implica condenar as agressões dos dois lados no conflito entre Israel e Hamas. Lula também defendeu que o fim da guerra no Oriente Médio passa pela criação de um Estado Palestino "livre e soberano":
"Ser humanista hoje implica condenar os ataques perpetrados pelo Hamas contra civis israelenses e demandar a libertação imediata de todos os reféns. Ser humanista impõe igualmente o rechaço à resposta desproporcional de Israel, que vitimou quase 30 mil palestinos em Gaza, em sua ampla maioria, mulheres e crianças, e provocou o deslocamento forçado de mais de 80% da população. A solução para essa crise só será duradoura se avançarmos rapidamente na criação de um Estado Palestino livre e soberano, reconhecido como membro pleno das Nações Unidas".
Lula comenta morte de Navalny
O presidente também abordou a morte de Alexei Navalny, principal opositor do presidente russo Vladimir Putin, ocorrida aos 47 anos na prisão. Lula enfatizou a necessidade de aguardar os resultados da investigação para determinar a causa da morte antes de fazer qualquer declaração. De acordo com o Serviço Penitenciário Federal russo, Navalny faleceu na última sexta-feira (16), depois de passar mal durante uma caminhada, perdendo a consciência quase imediatamente. Apesar dos esforços da família de Navalny para obter os restos mortais, até o momento não tiveram sucesso. No sábado, autoridades russas afirmaram que mais exames seriam necessários.
"Eu acho que, por uma questão de bom senso (não havia me pronunciado). Se a morte está sob suspeita, você tem que primeiro fazer uma investigação para saber do que o cidadão morreu. Vamos acreditar que os médicos legistas vão dizer: o cara morreu disso ou daquilo, para você poder fazer um pré-julgamento. Porque se não você julga agora que foi alguém que mandou matar e não foi, depois você vai pedir desculpas" afirmou Lula, questionado sobre o motivo pelo qual o governo brasileiro não havia se manifestado sobre a morte de Navalny.
O presidente afirmou que não se pode ter pressa para acusar pessoas e comparou o caso com a morte da vereadora Marielle Franco, executada em 2018 no Rio de Janeiro, sem que até agora se saiba oficialmente o mandante do crime, investigado pela Polícia Federal. Em conversa com jornalistas na Etiópia, Lula afirmou ainda que se antecipar à causa da morte seria "banalizar uma acusação".
"Ou é banalizar uma acusação. Eu até compreendo os interesses de quem acusa imediatamente, ‘foi fulano’, mas não é o meu mote. Espero que o legista que vai fazer o exame indique do que o cidadão morreu", disse o presidente.
Com informações de O Globo