General Freire Gomes, ex-comandante do Exército, compartilhou a pessoas próximas informações de que o ex-presidente Jair Bolsonaro, militares da reserva e o seu entorno apelaram às Forças Armadas por um golpe contra a eleição do atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva. O relato foi feito em conversas pessoais, envolvendo os militares mais próximos a Freire Gomes, sem informar o Alto Comando da Força.
Conhecido por sua discrição, o ex-chefe militar teria sempre deixado claro a Bolsonaro e seus apoiadores que o Exército não participaria de aventuras golpistas. Freire Gomes, juntamente com os ex-comandantes Almir Garnier (Marinha) e Baptista Junior (Aeronáutica), foi convocado várias vezes por Bolsonaro para participar de reuniões no Palácio da Alvorada em novembro e dezembro, depois da vitória de Lula.
Essas reuniões foram realizadas fora da agenda oficial da Presidência, sendo organizadas através do celular do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, ou pelo próprio ex-presidente. A primeira reunião aconteceu em 1º de novembro, apenas dois dias após o segundo turno das eleições. Durante esses encontros, discutiu-se sobre o fechamento de rodovias e acampamentos de apoiadores de Bolsonaro que se formavam em frente aos quartéis.
Os temas discutidos nessas reuniões nem sempre eram revelados previamente aos generais presentes. Em alguns casos, Bolsonaro buscava apenas dialogar com os chefes militares. Em outras ocasiões, tanto Bolsonaro quanto seus aliados militares teriam defendido abertamente intenções golpistas, visando questionar ou reverter o resultado eleitoral.
A decisão do Exército de não apoiar planos golpistas não foi formalmente definida em reuniões do Alto Comando, mas emergiu de conversas informais entre generais e consultas de representantes de governos estrangeiros à cúpula militar. Diplomatas dos EUA e do Reino Unido participaram de reuniões secretas com generais do Exército Brasileiro para sondar a posição da Força nesse contexto, manifestando forte oposição de seus países a qualquer tentativa de ruptura com a democracia.
Em março de 2022, Marco Antônio Freire Gomes foi convidado por Bolsonaro para assumir o comando do Exército, mudando os planos que indicavam sua ida para o Superior Tribunal Militar. Isso ocorreu em meio a interferências de Bolsonaro nas Forças Armadas, que resultaram na demissão de todos os chefes militares e do então ministro da Defesa, Fernando Azevedo, por falta de apoio às investidas palacianas durante a pandemia de Covid-19.
Durante a transição de governo, Freire Gomes informou ao ministro José Múcio Monteiro sobre sua intenção de deixar o cargo antes da posse de Lula, por questões pessoais. Ele se comprometeu a colaborar com a passagem de comando para o general Arruda, que havia sido escolhido por Múcio. Entretanto, Arruda acabou sendo demitido por Lula no final de janeiro, em meio a uma crise de confiança após os ataques antidemocráticos ocorridos em Brasília em 8 de janeiro.
Os apelos a planos golpistas aventados no Palácio da Alvorada são alvo da delação de Mauro Cid à Polícia Federal, com alegações de que o Almirante Almir Garnier teria manifestado apoio a essas intenções golpistas. Vale destacar que o Almirantado não teria apoiado as posições de Garnier, e houve oposição do conjunto de almirantes em relação a ele às vésperas do Natal, em uma reunião no Rio de Janeiro. Garnier, em um ato inédito na democracia, faltou à passagem de comando da Marinha em protesto.