Augusto Aras aciona o STF para suspender indulto natalino a condenados

O PGR ressalta que, de 1988 a 2017, o indulto coletivo foi progressivamente ampliado, beneficiando cada vez mais condenados.

Augusto Aras é o procurador-geral da República | Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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O Ministério Público Federal (MPF) solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a declaração de inconstitucionalidade de uma regra presente no Decreto 11.302/2022, que concede indulto natalino a condenados por crimes com pena privativa de liberdade de até 5 anos. O procurador-geral da República, Augusto Aras, argumenta que o artigo 5º do decreto ampliou de maneira excessiva e desproporcional o perdão, abrangendo um vasto leque de tipos penais, sem estabelecer critérios mínimos para concessão. Essa ampliação contraria a Constituição Federal e tratados internacionais de direitos humanos, além de prejudicar a separação de Poderes, a eficácia da persecução penal e contribuir para a impunidade.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.390, o PGR também pede uma liminar para suspender imediatamente a eficácia do dispositivo questionado, a fim de evitar um esvaziamento em massa de condenações e um grande número de liberações de condenados. Aras destaca no documento que a norma permite o perdão presidencial de forma indiscriminada para diversos crimes presentes nos códigos Penal e Eleitoral, na Lei das Eleições, no Estatuto do Desarmamento e na Lei de Crimes Ambientais, entre outras legislações criminais, sem exigir o cumprimento de um tempo mínimo de prisão estabelecido pelo Judiciário.

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Isso inclui crimes como homicídio culposo, lesão corporal grave, posse irregular de arma de fogo de uso permitido, caça ilegal, desmatamento, boca de urna, divulgação de informações sabidamente falsas na propaganda eleitoral, entre muitos outros. Aras também aponta como problema o fato de que, nos casos de condenação por múltiplos crimes, o limite de cinco anos adotado para a concessão do benefício é baseado na pena máxima prevista para cada um dos delitos cometidos, não considerando o total aplicado na sentença. Para o PGR, essa possibilidade premia excessivamente aqueles que cometeram um maior número de crimes, uma vez que o perdão abrange a totalidade da condenação, independentemente da pena imposta na sentença.

O PGR ressalta que, de 1988 a 2017, o indulto coletivo foi progressivamente ampliado, beneficiando cada vez mais condenados. No entanto, os decretos anteriores sempre restringiram o benefício a uma pena máxima estabelecida na sentença condenatória e exigiram o cumprimento de uma fração mínima da pena imposta. O Decreto 11.302/2022 vai contra essa sistemática adotada nos anos anteriores, como pontuado pelo procurador-geral da República.

No caso do ex-deputado federal Daniel Silveira, Aras destaca que a análise da constitucionalidade do artigo 5º do Decreto 11.302/2022 não se confunde com o indulto concedido a Silveira, que foi invalidado pelo Supremo Tribunal Federal na semana passada, em uma decisão que divergiu do posicionamento do MPF. O PGR considera que o perdão dado a Silveira foi um ato político específico e dentro dos limites estabelecidos pela Constituição, e, por essa razão, não poderia ser submetido ao controle judicial.

Por outro lado, o dispositivo do Decreto 11.302/2022 é uma norma primária, com regras abstratas e de caráter genérico, que ultrapassa o sistema de freios e contrapesos previsto na Constituição. Esse sistema prevê o controle mútuo entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, com o objetivo de evitar abusos na autonomia conferida a cada um dos Poderes. Na opinião do procurador-geral, ao promover ampla impunidade, sem critérios objetivos, a norma questionada viola o sistema de Justiça e os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em relação à promoção dos direitos humanos. Por esse motivo, o dispositivo pode ser submetido ao controle judicial quanto à sua constitucionalidade.

Em outro trecho do documento, Aras afirma que, embora o indulto seja um ato político do presidente da República, sua concessão não é um poder ilimitado ou isento de controle judicial. A própria Constituição veda a concessão do benefício em casos que envolvam crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e crimes hediondos.

Apesar de o decreto questionado na ADI não abranger esses crimes, o PGR considera que a medida também viola outros princípios constitucionais, como a separação de Poderes, os fundamentos do Estado de direito e do sistema de Justiça, bem como o dever de proteção dos direitos fundamentais. Aras afirma que indultar genericamente condenados, independentemente da quantidade de crimes cometidos e da pena total imposta na condenação, significa negligenciar os deveres estatais de proteção aos direitos humanos, como o direito à vida, à segurança e à integridade física, previstos não apenas na Constituição, mas também em normas internacionais ratificadas pelo Brasil.

O procurador-geral conclui que o decreto vai contra a evolução dos direitos fundamentais estabelecidos na ordem jurídica nacional e internacional, violando o dever constitucional de cumprir os tratados internacionais de direitos humanos e a cláusula de vinculação do Brasil aos tribunais internacionais.

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