Em 2022, uma jovem identificada como Karina Martins Bezerra, de 26 anos, foi sequestrada para ser julgada no chamado "tribunal do crime" do PCC, em São Paulo, por ter negado beijo ao chefe da facção criminosa, tendo sido morta dias depois. O crime, porém, ficou impune, quase três anos depois.
As investigações do Deic, tido como um dos departamentos mais importantes da Polícia Civil de São Paulo, não avançaram nem identificaram o traficante do PCC conhecido como Xenon, acusado de sequestrar e ordenar a morte de Karina. Mesmo diante dos fatos, o MP-SP pediu o arquivamento do inquérito no dia 18 de fevereiro deste ano por entender que "restou prejudicada a propositura da ação penal, diante da falta de materialidade do tipo penal e dos indícios frágeis e insuficientes para a persecução criminal". A Justiça ainda não julgou o pedido.
ENTENDA O CASO
A jovem foi raptada duas vezes. O primeiro sequestro ocorreu no dia 15 de agosto, na região do Itaim Paulista, zona leste de São Paulo. Segundo informações do 4º Batalhão de Ações Especiais, à época, a mulher estava em uma balada quando um homem se aproximou e pediu para beijá-la. Após negar o beijo e ter sido forçada a beijá-lo, a jovem teria entrado em discussão e ofendido o homem, que chegou a sair do local, mas teria retornado à casa noturna com alguns de seus comparsas e levado a jovem para um cativeiro.
A jovem foi resgatada por policiais militares, antes de ser submetida ao chamado “tribunal do crime” do PCC, processo interno de julgamento de integrantes da facção, ou de terceiros, que cometeram “infrações”. Em depoimento à polícia, a jovem identificou o acusado como Xenon, que teria contado com a ajuda de três bandidos. Ela foi levada no próprio automóvel para um barraco, onde teve a boca, braços e pernas amarrados.
“Durante a discussão, ele dizia que ela iria ser a mulher dele por bem ou por mal, que ela não sabia com quem ela estava falando e que ele era do PCC e que ficaria com quem ele quisesse”, diz trecho do depoimento.
SEGUNDO SEQUESTRO E MORTE
Depois disso, segundo familiares, a cuidadora de idosos ficou em casa até o dia 25 de agosto. Investigações policiais mostram que, nessa data, ela saiu de casa após receber mensagens de celular dos suspeitos. Depois disso, Karina nunca mais foi vista. Ela foi sequestrada e levada para outro cativeiro, na Favela de Paraisópolis, onde teria sido submetida a novo julgamento pelo "tribunal do crime".
PRISÃO DOS ACUSADOS
Exatamente um mês depois que Karina recusou beijar o gerente do PCC, dois homens e uma mulher, envolvidos com a facção, foram presos por suspeita de envolvimento com o crime. Policiais do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) apuraram que Karina foi mesmo sentenciada e morta porque se negou a beijar um “sintonia”, como é conhecido na facção o responsável por gerenciar o tráfico.
Agentes do Deic chegaram a prender, na Vila Curuçá, zona leste, Brendon Macedo Soares, 27. Em depoimento, ele contou que era disciplina (chefe) do PCC no bairro onde Karina foi sequestrada e admitiu ter participado do segundo "tribunal do crime" ao qual a jovem foi submetida.
Brendon afirmou que Karina estava escondida em Taboão da Serra, na Grande São Paulo, onde foi localizada e quis contar a própria versão sobre o primeiro julgamento. Segundo Brendon, ela voltou ao Itaim Paulista, acabou sequestrada de novo e levada para a Favela de Paraisópolis, na zona sul.
No depoimento, Brendon acrescentou que além de "disciplina", era auditor de drogas do PCC na "quebrada" do Itaim Paulista e, por esses motivos, foi chamado para ir até Paraisópolis, para participar do "tribunal do crime" da facção.
Ele contou ainda que "lá chegando encontrou três integrantes do PCC no barraco. Revelou também que por regra da facção não podiam ficar no imóvel mais de três "irmãos" (batizados na organização). Disse que cumprimentou todos e saiu.
Porém, ressaltou que viu Karina sentada em uma cadeira e que com certeza ela não foi maltratada nem torturada. Brendon declarou que depois disso entrou no veículo que havia emprestado de sua cunhada e que escoltou o Chevrolet Onix de Karina, dirigido por outro homem, até o Rodoanel.
OUTROS PRESOS
O suspeito indicou o endereço onde estavam Marco Antônio Ferreira Koti, de 30 anos, o Sheik, gerente do tráfico do PCC, e de uma mulher. Ambos foram presos e indiciados pela polícia.
Com informações do UOL e Metrópoles