Por José Osmando de Araújo
No decorrer dos 365 dias do ano de 2022, nada menos do que 495 mulheres foram assassinadas no Brasil na forma de feminicídio, ou seja, perderam a vida pelas mãos de seus maridos ou companheiros, namorados ou ex-namorados. Exatamente 75% dessas mortes (ou 371,25 crimes) foram praticadas por companheiros e ex-companheiros, tendo como motivação brigas e términos de relacionamentos.
Esses informes absurdos constam do relatório “Elas Vivem: dados que não calam”, um estudo criterioso elaborado pela Rede de Observatórios da Segurança, tornado público nesse último fim de semana. Esse estudo foi realizado apenas em 7 Estados brasileiros, do que se depreende que esse número de 495 mortes deve ser significativamente muito maior se apurado todo o território nacional.
Um dado que chama bastante atenção para essas estatísticas de 2022, está contido na explicação fornecida pela pesquisadora Larissa Neves, integrante da Rede de Observatórios: uma das razões principais para esse crescente e desolador quadro, “é o acesso facilitado às armas de fogo”. E mais, “a violência política durante as eleições” que se desenvolveram no país durante o ano passado. A isso se somam a crise econômica “e a falta de medidas efetivas de prevenção.”
DESMONTE NAS POLÍTICAS PÚBLICAS
A pesquisadora, com base no resultado dos estudos realizados, aponta, na forma de denúncia, que o desmonte nas políticas públicas de prevenção durante o governo passado, foi importante para o agravamento do número de casos.
PROTEÇÃO JUDICIAL
Daí, Larissa Neves recomendar que uma das medidas urgentes a serem tomadas para combater o feminicídio e a violência contra a mulher é aumentar a proteção judicial das mulheres que conseguem chegar até as delegacias e casas de acolhimentos.
SÃO PAULO LIDERA
O levantamento identificou casos de feminicídio em sete estados brasileiros, com a liderança do Estado de São Paulo, aparecendo com 109 crimes registrados, seguindo-se do Rio de Janeiro, que teve 103 registros, Bahia, com 91, Pernambuco 59, Maranhão 57, Piauí 48 e Ceará 28. Observe-se que os crimes de feminicídio registrados no Piauí são 70% mais elevados do que os registrados no Estado do Ceará.
NORDESTE
A Bahia, além de ser o Estado nordestino com o maior número de mortes, 91, é também o que registrou a maior taxa de crescimento em relação ao último boletim, com uma variação de 58%.
A violência contra a mulher, inclui tentativa de feminicídio/agressão física; feminicídio; homicídio; violência sexual/estupro; tortura/cárcere privado/sequestro; agressão verbal/ameaça; tentativa de homicídio; transfeminicídio, bala perdida e outros. O levantamento identificou 2.423 casos desse crime distribuídos na Bahia, Ceará, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro, Maranhão e Piauí.
CRISE CIVILIZATÓRIA
Vê-se claramente que estamos diante de uma crise civilizatória crescente, que precisa ser enfrentada com igual clareza de atitude e que deve envolver toda a sociedade. Não dá para ignorar a situação, com a irresponsável e desumana expressão “deixa prá lá, que não é comigo”. Há a necessidade de que todo o corpo social tome conhecimento dessa triste realidade, pois estamos diante de uma questão social grave, que pode ser transformada pelo conhecimento e conscientização. O respeito ao outro, às suas diferenças, poderá, certamente, restabelecer a harmonia no convício.
PAPEL DO ESTADO
Mas além da responsabilidade pessoal, individual, do conhecimento e convencimento, é urgente refletir sobre o papel do Estado, dos entes públicos, no sentido de serem intolerantes diante de cada feminicídio que aconteça, seja onde for, atinja quem quer que seja. O descaso dos organismos públicos, a ineficiência dos sistemas de segurança e a insensibilidade e indiferença de agentes do sistema judiciário, têm muito de comprometimento com essa desgraça e vergonha para a qual se baixa a cabeça.
É urgente acabar com essa estúpida covardia. Sim. Porque isso é uma imensa covardia.