Um novo estudo identificou uma variante genética que aumenta o risco de desenvolvimento de uma doença inflamatória intestinal grave. A chamada doença de Crohn é uma condição inflamatória que pode afetar qualquer parte do tubo digestivo, desde a boca até o ânus, e tem origem ainda não conhecida. De acordo com a pesquisa realizada por especialistas do hospital Cedars-Sinai, dos Estados Unidos, pacientes com estágio moderado a grave apresentam um ou mais dos seguintes sintomas: febre, perda de peso, dor abdominal acentuada, anemia e diarreia frequente.
A variante gera alterações no DNA que levam à perda da função proteica, o que, por sua vez, altera a forma como o corpo reconhece e lida com bactérias, tornando-o menos eficaz no combate às infecções. Os resultados, referentes à doença de Crohn perianal, a manifestação mais debilitante do problema, foram publicados no periódico científico Gut. “A doença de Crohn perianal fistulizante pode ser uma condição realmente miserável”, disse o coautor sênior do estudo Dermot McGovern, diretor de pesquisa translacional no Cedars-Sinai em comunicado.
“Nossas terapias atuais realmente não são muito boas para tratá-la, consequentemente este estudo aborda uma área muito significativa de necessidades médicas não atendidas. Ao entender as causas subjacentes, podemos começar a desenvolver novas estratégias de tratamento para pacientes diagnosticados com essa condição inflamatória crônica, a maioria dos quais atualmente requer cirurgia e muitas vezes requer múltiplas cirurgias”, prossegue
O que seria essa doença?
A doença de Crohn perianal é uma complicação da doença de Crohn, um distúrbio inflamatório crônico que afeta o trato digestivo. A complicação causa inflamação e ulceração da pele ao redor do ânus, bem como de outras estruturas na região perianal. A forma perianal ocorre em até 40% das pessoas diagnosticadas e tem respostas limitadas ao tratamento, resultando em baixa qualidade de vida.
“Temos muito mais sucesso na identificação de variantes genéticas associadas ao risco de desenvolver doenças, mas o que fizemos aqui foi focar especificamente em uma manifestação muito complicada e grave da doença de Crohn. E essa é uma abordagem incomum na pesquisa genética”, disse Talin Haritunians, professora-assistente de pesquisa que faz parte do Laboratório McGovern e coautora do estudo.
Os pesquisadores analisaram dados genéticos de três grupos independentes de pacientes com a doença de Crohn para descobrir variantes genéticas com ligação direta com a manifestação grave. A avaliação incluiu um conjunto de indivíduos atendidos no hospital Cedars-Sinai, um grupo genético internacional recrutado em mais de 20 países e voluntários recrutados em sete centros médicos de pesquisa acadêmica nos Estados Unidos.
A somatória dos três grupos totalizaram 4.000 pacientes com doença de Crohn perianal e mais de 11.000 pacientes com doença de Crohn sem essa complicação. A equipe de cientistas comparou as populações para ver se conseguia detectar áreas do genoma associadas ao desenvolvimento da manifestação. A equipe identificou 10 novos pontos genéticos e 14 outros já conhecidos da doença inflamatória intestinal associados ao desenvolvimento de complicações perianas.
Na análise, a equipe se concentrou em uma única alteração em um gene específico, chamado SNP, associado à doença de Crohn perianal. Essa variante genética afeta uma proteína chamada Fator de Complemento B (CFB), o que leva a uma perda de função dessa proteína importante para combater infecções, o que pode ser o motivo pelo qual os pacientes com essa alteração genética têm maior probabilidade de ter a doença.
Os especialistas realizaram várias análises para confirmar que realmente há uma perda de função na CFB, que pode ter um impacto significativo no organismo. “No caso em que você tem essa mutação que leva a uma proteína não funcional, você não obtém a cascata de sinalização normal e o corpo não reconhece a bactéria como prejudicial e, portanto, essas bactérias não são eliminadas”, disse a coautora do estudo Kathrin Michelsen, professora-assistente de pesquisa de Medicina e Ciências Biomédicas no Cedars-Sinai.
“Assim, para os pacientes com doença de Crohn perianal, existem conexões que se formam do reto para a área da pele. E esses túneis estão cheios de bactérias que não estão sendo eliminadas”, pontua. De acordo com os pesquisadores, essa variante genética também pode estar associada a outras doenças. As descobertas podem abrir caminhos para o desenvolvimento de novas estratégias de tratamento da condição a longo prazo. “Essas variantes genéticas muitas vezes predispõem a mais de uma condição, e acreditamos que essa descoberta pode ter ramificações para outras doenças também, não apenas para a doença de Crohn”, disse McGovern. Os cientistas buscam identificar a função de variantes genéticas adicionais associadas à doença de Crohn perianal e outras áreas de necessidades médicas não atendidas nas doenças inflamatórias intestinais.