Aquele que prometia ser o dia mais morno do julgamento da presidente afastada Dilma Rousseff acabou incendiado por Renan Calheiros (PMDB-AL), considerado um apaziguador. A avaliação política é de que, ao confrontar e constranger aliados de Dilma no plenário, o presidente do Senado pavimentou o caminho para votar a favor do impeachment. Até agora, Renan vinha usando o fato de presidir a Casa como argumento para se abster.
No segundo dia de julgamento, na sexta-feira, a sessão estava destinada à inquirição de seis testemunhas indicadas pela defesa de Dilma. Pela manhã, Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Lindbergh Farias (PT-RJ) tiveram novo bate-boca e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, suspendeu a sessão por cinco minutos. No retorno, Renan deixou a Mesa do Senado, onde senta ao lado de Lewandowski, para se manifestar em nome de uma trégua. Só que, em vez de jogar água no fogo, tocou gasolina.
Disse que o Senado parecia um "hospício" e que a sessão era uma "demonstração de que a burrice é infinita". Finalizou com um ataque inesperado a Gleisi Hoffmann (PT-PR), uma das mais atuantes da defesa de Dilma. Na quinta-feira, a petista disse mais de uma vez que o Senado não tem "moral" para julgar a presidente afastada.
— Como a senadora pode fazer uma declaração dessa, exatamente uma senadora que, há 30 dias, o presidente do Senado conseguiu desfazer seu indiciamento e de seu esposo? — disparou Renan, citando investigação contra Gleisi e o marido e ex-ministro Paulo Bernardo, que esteve preso recentemente.
Foi a senha para o rebuliço. Petistas classificaram a atitude como "baixaria" e partiram para cima do presidente do Senado.
– Renan chamou o Senado de hospício, mas veio aqui e deu uma de doido – disse Lindbergh.
Ex-ministro Barbosa fala neste sábado
Passavam poucos minutos das 11h. Lewandowski antecipou o intervalo de almoço para os ânimos serenarem. No retorno, líderes fizeram aceno de armistício. Horas depois, Renan se declarou "profundamente chateado" pela "reação desproporcional".
À tarde, passaram a ser ouvidas as testemunhas indicadas por Dilma. O advogado José Eduardo Cardozo optou por retirar do rol a economista Esther Dweck. Como está lotada no gabinete de Gleisi, Cardozo avaliou que ela não seria legitimada.
Nesta sexta, foram ouvidos o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, na condição de informante, o professor de Direito Geraldo Prado e o ex-secretário executivo do Ministério da Educação Luiz Cláudio Costa. As duas últimas testemunhas arroladas pela defesa se manifestam no sábado: o ex-ministro da Fazenda Nelson Barbosa e o advogado Ricardo Lodi. A sessão do sábado inicia às 10h.
O final de semana será de preparação para um dos atos mais relevantes do julgamento: na segunda-feira, Dilma fará sua defesa presencialmente. Ela será acompanhada por cerca de 20 convidados no plenário — o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará entre eles.
Aliados da petista irão ao Palácio da Alvorada para discutir estratégias. Eles querem aproveitar as perguntas para permitir que Dilma valorize as políticas públicas do governo. Nesta sexta-feira, dia em que foi indiciado pela Polícia Federal no caso do triplex do Guarujá, Lula esteve brevemente em Brasília. Chegou, fez algumas conversas e retornou a São Paulo. Ele pretende acompanhar o depoimento de Dilma das galerias do Senado.
O ambiente do julgamento permaneceu inalterado após a inquirição das testemunhas. A expectativa do governo interino é de que a votação do impeachment tenha mais de 60 votos favoráveis, acima dos 54 necessários para cassar Dilma e efetivar Michel Temer no poder até dezembro de 2018.