A presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, decidiu nesta sexta-feira (9) anular o convênio com a Serasa e que previa repasse de dados cadastrais de 141 milhões de eleitores brasileiros para a empresa. Em troca, a Serasa forneceria mil certificados digitais ao tribunal.
A Serasa é uma empresa privada que gerencia um banco de dados com informações, relativas a consumidores e empresas, sobre dividas vencidas e não pagas, cheques sem fundo e registro de protesto de títulos. Os certificados digitais seriam usados pelos servidores do tribunal. São instrumentos que permitem a consulta do teor de processos judiciais por pessoas cadastradas.
Na quinta, a Corregedoria Eleitoral já havia determinado a suspensão do acordo, pelo qual o TSE repassaria à Serasa nome do eleitor, número do título e situação da inscrição eleitoral, que permitiria à empresa verificar eventuais óbitos. Além disso, o convênio previa a validação do nome da mãe e data de nascimento, ou seja, a Serasa enviaria os dados e o tribunal apenas confirmaria as informações.
"A nulidade do ato em questão ? Acordo de Cooperação Técnica ? deve-se à ausência de fundamento jurídico válido, porque a Empresa Partícipe não dispunha das condições legais para ser autorizada por este Tribunal Superior Eleitoral, a despeito das opiniões contrárias e bem fundamentadas, que foram exaradas nos autos e que conduziram à sua assinatura", afirma Cármen Lúcia, que entendeu que apenas entidades públicas poderiam acessar os dados.
"Assim, os vícios que maculam aquele Acordo levam-me a declarar a sua nulidade, porque eivado de antijuridicidade, que, no caso, conduz à intranquilidade dos eleitores quanto aos dados por eles entregues à guarda e utilização legal da Justiça Eleitoral, que não é senhor das informações nem de seu acesso", completou.
Na quarta-feira, o tribunal explicou que, apesar de o convênio ter sido publicado no "Diário Oficial da União", nenhuma informação foi repassada à Serasa porque o acordo ainda não tinha sido efetivado.
Para a ministra, "não poderiam os órgãos deste Tribunal Superior ter autorizado, menos ainda assinado o Acordo de Cooperação Técnico, por ausência de fundamento legal válido".
O acordo com a Serasa foi assinado pelo diretor-geral do tribunal, Anderson Vidal, e baseado em resolução de 2003 que prevê convênios para compartilhamento de informações. Na decisão desta sexta-feira, a presidente do TSE afirmou que não é possível firmar acordos desse tipo com empresas privadas.
"Não seria imaginável como possível que entidades particulares, com finalidades privadas, pudessem ou pretendessem ser autorizadas, legitimamente, pela Justiça Eleitoral a acessar os dados cadastrais, que os cidadãos brasileiros entregam aos órgãos do Judiciário com a certeza da confiança de manutenção do seu sigilo e de sua utilização restrita aos fins daqueles órgãos. Assim, entidades autorizadas somente podem ser públicas ou de interesse público, o que não é o caso da Partícipe particular do Acordo firmado."
Cármen Lúcia determinou ainda que seja constituído um grupo de trabalho para análise de acordos vigentes sobre o cadastro de eleitores.
Ela alterou ainda o artigo do regulamento interno que prevê assinatura de acordos por parte da diretoria-geral. Cármen Lúcia estipulou que os contratos só podem ser assinados "quando houver delegação da Presidência".
A ministra explica, no despacho, que "avocou" o caso, ou seja, chamou o processo para si, "em razão da gravidade da matéria neles cuidada".
"O cadastro eleitoral é patrimônio dos cidadãos brasileiros. Em especial, patrimônio dos eleitores nacionais. E o seu fundamento é a confiança na Justiça Eleitoral e na inexpugnabilidade dos dados a ela confiados."