Em uma manobra que gerou novo, e talvez o último, embate com seu sucessor na presidência do Supremo Tribunal Federal, o ministro Joaquim Barbosa tenta manter 46 funcionários de seu gabinete em cargos de confiança e funções gratificadas mesmo após sua aposentadoria.
A tentativa de mantê-los é o motivo pelo qual Barbosa adiou pela segunda vez seu pedido de aposentadoria, segundo a Folha apurou. Ele anunciou sua saída da corte no fim de maio, 11 anos antes do limite legal e a 5 meses do término de sua presidência.
Será sucedido por Ricardo Lewandowski que, como revisor do processo do mensalão, relatado por Barbosa, tornou-se seu maior adversário no curso do julgamento.
O novo atrito com Lewandowski começou na segunda, quando o presidente ligou para o vice e pediu a manutenção dos assessores no gabinete da presidência do STF. Lewandowski argumentou que não poderia se comprometer, já que precisará de uma equipe de sua confiança.
O presidente do STF Joaquim Barbosa preside a última sessão do Tribunal antes de se aposentar
Diante da resistência, e usando sua prerrogativa como presidente do STF, Barbosa mandou às 20h do mesmo dia ofício a Lewandowski comunicando que os 46 servidores "deverão retornar" ao seu gabinete de ministro assim que ele deixar a corte. Na prática, Barbosa determinou que Lewandowski transfira os assessores da presidência para seu gabinete em posições similares às que exercem hoje.
Com isso, a intenção de Barbosa é que a questão seja discutida com os demais ministros do tribunal numa sessão administrativa em agosto, quando todos voltarem das férias de julho. Barbosa adiou a aposentadoria para poder comandar a discussão.
Isso causou desconforto no gabinete de Lewandowski. Pelas regras do tribunal, os assessores dos ministros ocupam cargos de "livre exoneração, a qualquer tempo". As regras permitem que, se não forem dispensados, eles continuem no cargo até a véspera da posse do substituto do antigo chefe ou por mais 120 dias, no máximo, se a escolha do novo ministro demorar. Ou seja, eles poderão ficar até quatro meses empregados no antigo gabinete de Barbosa.
Quatro ministros do STF ouvidos pela Folha dizem que o ofício de Barbosa, apesar de legal, não é comum. A praxe é o presidente que deixa o cargo entregar um pedido de exoneração de todos os funcionários. Os concursados são realocados, e os que não são, deixam o Supremo.
O gabinete sem o novo ministro tem de ficar aberto para consultas a processos existentes. Para esse serviço, bastam quatro ou cinco funcionários, 10% dos 46 que Barbosa deseja manter empregados. Cada gabinete tem, em média, 30 funcionários.
Em nota, Barbosa disse que não irá comentar o teor da conversa confidencial que manteve com Lewandowski e que está fazendo tudo de acordo com as normas de transição do STF e com base nas ;tradições da casa;.
Disse ainda que as normas visam "conferir funcionalidade mínima desejável ao gabinete do ministro que ingressará". Ele saiu de férias segunda e retorna fim do mês.
Entre os funcionários em questão está o chefe de gabinete de Barbosa e sete assessores diretos, dos quais seis não têm vínculo com o tribunal ;quatro não são concursados e os demais são cedidos ao STF por outros órgãos.
Se a manobra do ministro vingar, esses seis servidores sem concurso continuarão empregados recebendo salário de R$ 10.352,52, mais auxílios moradia e alimentação que ultrapassam R$ 3 mil. Outros 9 em funções comissionadas recebem gratificações.