Presos no regime semiaberto na Penitenciária da Papuda, os ex-dirigentes do PT José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares serão bem-vindos se aceitarem trabalhar na cooperativa Sonho de Liberdade. É o que dizem o fundador e um dos supervisores da entidade, onde cerca de 80 trabalhadores (sendo cerca 30 detentos e 15 ex-detentos) trabalham com marcenaria, madeira e bolas de borracha.
Localizada a Cidade Estrutural, região de periferia próxima a um lixão a cerca de 17 quilômetros da Praça dos Três Poderes, em Brasília, a cooperativa é ligada à confederação que ofereceu a Dirceu um salário de R$ 508,50 para trabalhar como administrador de setor de fabricação. A oferta ocorreu no mesmo dia em que o ex-ministro desistiu de trabalhar como gerente de um hotel por R$ 20 mil mensais.
No local, porém, segundo a própria cooperativa, o salário normal sempre vai além de R$ 1.100, com funções flexíveis.
O site esteve na cooperativa na manhã desta segunda-feira (9). No local, trabalhadores se espalham pelos galpões e salas de madeira, além de áreas externas, exercendo diferentes funções. Enquanto um grupo trabalha na área do desembarque de mercadorias por caminhões e reúne madeira reciclável para armazenar e vender para a indústria como matéria-prima na geração de energia, outro grupo fabrica móveis numa marcenaria.
Uma das salas é reservada para os cooperados que costuram bolas, que são vendidas a R$ 35 e geram lucro de R$ 10 para cada trabalhador. Quando a Sonho de Liberdade foi aberta, em 2005, a costura de bolas de futebol era a principal atividade dos cooperados. Hoje, a receita se concentra, principalmente, na venda de madeira com fins energéticos. Cada cooperado que atua no setor fatura, em média, R$ 100 por dia.
O fundador da cooperativa é o ex-presidiário Fernando de Figueiredo, condenado a 19 anos e 4 meses por assalto e roubo de carro. Ele teve a pena reduzida depois de fazer trabalhos e estudar no Complexo Penitenciários da Papuda e cumpriu 7 anos da pena na prisão. Para Figueiredo, condenados no julgamento do mensalão como José Dirceu têm na Sonho de Liberdade a possibilidade de mudar a própria história.
"Se esses camaradas vierem aqui, vão estar dando a oportunidade de mudar a história deles. Vai ser um dos maiores exemplos, com uma contribuição que vai ser lição para o Brasil. Eles vão poder somar ao grupo", disse o presidente da cooperativa.
"Oportunidade de estar livre"
Já o supervisor de compra e venda de madeira na cooperativa, Cristiano da Silva, acredita que o trabalho representa a "oportunidade de estar livre". "Posso me comunicar com as pessoas e ter a minha renda. Isso melhora a vida. Se você fica num sistema com pessoas de cabeça fechada, a sua cabeça também fica fechada", declarou.
O supervisor, condenado a 28 anos de prisão por assalto e tentativa de homicídio, cresceu profissionalmente dentro da cooperativa com três meses de trabalho. Ele deixou de carregar madeira para armazenagem e venda, e se tornou responsável por controlar toda a mercadoria que chega à cooperativa e a que é vendida. Com o serviço, ganha cerca de R$ 1.500 por mês, sendo R$ 70 por dia.
Silva também afirmou, que caso os condenados no mensalão passem a trabalhar no local, serão bem recebidos pelos colegas. "Se eles quiserem vir, não vai ter discriminação. Aqui é um lugar onde todo mundo se trata igual e trabalha igual", declarou.
Casca de lancha
Na marcenaria da cooperativa, dois cooperados trabalham há uma semana na recuperação do casco de uma lancha. A ideia é que o material sirva para fabricar uma embarcação que seja da própria cooperativa e possa ser usada no turismo em Brasília. Esta é uma das propostas mais ousadas da marcenaria, que costuma produzir somente mesas, cadeiras e produtos artesanais.
Para o marceneiro Manoel Vaz, que chega afirma que chega a faturar R$ 5 mil por mês com a fabricação de móveis, o projeto de recuperação do casco é parte de uma tentativa de diversificar a produção no local. "Estamos procurando desenvolver aplicações para desenvolver mais a mão-de-obra na cooperativa. Queremos que o pessoal daqui possa fazer mais produtos e agregar valor às mercadorias", disse Vaz.
A oferta de trabalho na cooperativa aos condenados no julgamento do mensalão foi protocolada no STF pela entidade Confederação do Elo Social Brasil. Inicialmente, a Sonho e Liberdade afirmou não haver acordo com a entidade responsável pelo protocolo e informou não ter vagas para as ofertas propostas.