Em coletiva para detalhar a 35ª fase da Operação Lava Jato, a procuradora da República, Laura Gonçalves Tessler disse que o ex-ministro Antônio Palocci teve atuação “intensa e reiterada” na defesa de interesses da empreiteira Odebrecht na administração pública federal. Segundo a procuradora, a empreiteira repassou R$ 128 milhões de reais a uma conta que seria gerida pelo ex-ministro. Palocci foi preso temporariamente na manhã de hoje (26) quando a Polícia Federal deflagrou a nova fase da Operação, chamada Operação Omertá.
De acordo com Laura Gonçalves, haveria um conta destinada ao recebimento de vantagens indevidas da Odebrecht e Palocci seria o gestor dessa conta. “Se verificou uma atuação intensa e reiterada de Palocci na defesa de interesses da empresa perante a administração pública federal envolvendo contratos com a Petrobras, questões veiculadas e medidas legislativas. Essa atuação se deu mediante a pactuação e recebimento de contrapartidas em favor do Partido dos Trabalhadores. Palocci, ao que tudo indica, atuava como gestor dessa conta tendo atuado desde 2006 até pelo menos novembro de 2013, comprovadamente, com pagamentos documentados nessa planilha”, disse a procuradora.
Os valores discriminados na planilha da construtora eram registrados em nome de "Italiano”, segundo a Polícia Federal (PF). O delegado da PF, Filipe Pace, disse que não há “sombra de dúvida” de que o “Italiano” que aparece nas planilhas de Marcelo Odebrecht é o ex-ministro Palocci.
A procuradora Laura Gonçalves destacou que repasses registrados para o Italiano não ocorreram apenas em período eleitoral. “O que revela mais claramente se tratarem de propina, já que não havia em curso qualquer campanha eleitoral que subsidiasse esses pagamentos”, disse.
Para o Ministério Público Federal, há indicativos de que Palocci tenha atuado em outros casos em defesa dos interesses da empresa. Segundo a procuradora Laura Gonçalves, foram registrados quase 30 encontros pessoais entre Palocci e executivos da empresa, muitos deles na casa do ex-ministro e no escritório de sua empresa.
Laura Gonçalves afirma ainda que, mesmo no curso da Operação Lava Jato e em 2014 e 2015 foram verificados contatos entre Palocci e executivos da Odebrecht, inclusive com o uso de e-mails criptografados. “O que indica a possibilidade de que continuassem essas tratativas ilícitas já que obviamente para realização de reuniões para assuntos triviais não se precisa ter essa preocupação de criptografia”, disse a procuradora.
Provas
Segundo os integrantes da força tarefa, o material analisado e que embasou a operação desta segunda-feira foi encontrado em outras fases da Operação, como por exemplo, uma planilha encontrada durante a fase Acarajé e outra encontrada no celular de Marcelo Odebrecht.
Segundo o MPF, os pagamentos feitos à conta eram constantes. “Existe um pagamento que é feito constantemente e que forma um caixa mesmo, uma poupança e de onde são depois, pelo gestor da conta, no caso o senhor Antônio Palocci, destinados aos pagamentos de interesse do partido”, disse Laura Gonçalves.
O caminho feito pelo dinheiro ainda está sendo investigado e as medidas de hoje darão novos elementos sobre as transações realizadas. Ao ser questionado sobre o que justificou a prisão do ex-ministro, o delegado da Polícia Federal Filipe Pace lembrou que Palocci teria atuado mesmo sem ocupar cargos no governo.
“A necessidade da aplicação da lei penal nos fez pedir a prisão justamente para tentar rastrear o dinheiro pago em espécie, provavelmente não só para ele [Palocci] mas para outros agentes. Para tentar recuperar esse produto de crime, porque aqui tratamos de crimes cometidos por Antônio Palocci em favor de si mesmo, de seu grupo político, e além da gravidade do risco à ordem pública porque ficou demonstrado que, mesmo fora de qualquer cargo, Palocci continuava a intermediar valores e vantagens tratando de programas do governo federal quando ele simplesmente não estava em nenhum cargo”
Compra do Terreno
Durante as investigações do Ministério Público também foi identificada a compra de um terreno que, inicialmente, seria destinado à construção de uma nova sede do Instituto Lula. Para os procuradores, há indicativos de que a compra do local teria sido acertada com o ex-ministro, com dinheiro que também teria sido depositado na conta.
“Os e-mails demonstram não só que ele [Palocci] era consultado, documentos eram encaminhados a ele, preocupações da empresa eram divididas com Palocci demonstrando sua efetiva participação e essa efetiva participação do senhor Palocci nesse processo de compra é comprovada pelo registro nessa planilha de uma despesa de R$ 12 milhões, despesa essa que coincide com o valor de avaliação do terreno, de R$ 10 milhões, acrescido de dívida de aproximadamente R$ 2 milhões com a prefeitura”, disse a procuradora Laura Gonçalves.
Segundo a procuradora, o terreno comprado não é o local onde atualmente está a sede do instituto. Ela lembra ainda que um projeto arquitetônico foi apreendido durante as buscas no sítio de Atibaia, que poderia ser para da sede do instituto. O delegado Pace lembrou também que o pecuarista José Carlos Bumlai já havia citado o terreno em um depoimento prestado.
Defesa
O advogado de Palocci, José Roberto Batochio, criticou a prisão de seu cliente, dizendo que tudo ocorreu de maneira secreta, ao estilo ditadura militar. “Estamos voltando aos tempos do autoritarismo, da arbitrariedade. Não há necessidade de prender uma pessoa que tem domicílio certo, que foi duas vezes ministro, que pode dar todas as informações quando for intimado. É por causa do espetáculo?”, questionou.
Ele ainda negou as acusações contra Palocci. “Isso é uma coisa absolutamente vaga, vazia. Para quem quer pretexto, isso é pretexto, mas o fato é que o ministro da Fazenda tem que ter uma interlocução com o setor empresarial, com a cadeia produtiva do Brasil, para que se estabeleçam as políticas públicas. Se um ministro conversa com alguém da iniciativa privada, já é suspeito de praticar crime?”, perguntou Batochio.
Já o Instituto Lula disse, por meio de nota à imprensa, que desde que foi criado funciona em uma casa adquirida pelo antigo Instituto de Pesquisas do Trabalhador. “O Instituto Lula não tem, nunca teve outra sede ou terreno. Mais uma vez, querem impingir ao ex-presidente Lula uma acusação sem materialidade, um suposto favorecimento que nunca existiu, inventando uma sede que o Instituto Lula nunca teve, com o claro objetivo de difamar sua imagem".
A Odebrecht informou por meio de sua assessoria que não vai se manifestar sobre o tema.