Com placar de 265 votos a 166, a deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF) foi absolvida nesta terça-feira no Plenário da Câmara dos Deputados e se livrou do processo de cassação a que respondia na Casa. Por maioria e em votação secreta, os parlamentares absolveram a filha do ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, flagrada recebendo suposta propina do ex-secretário de Relações Institucionais do DF, Durval Barbosa, delator do esquema conhecido como Mensalão do Democratas. Para que ela fosse cassada, era preciso que houvesse no mínimo 257 votos favoráveis entre os 513 deputados.
A própria Jaqueline não acompanhou toda a votação, deixando o Congresso Nacional pouco antes das 20h. Em seu favor, apesar de um quórum de 451 votantes, 20 deputados se abstiveram de votar. Entre eles a deputada Fátima Pelaes (PMDB-AP), citada recentemente em suspeitas de desvio de recursos de um convênio no Ministério do Turismo, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e réu no processo do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), João Paulo Cunha (PT-SP), e o próprio corregedor da Casa, Eduardo da Fonte (PP-PE).
No Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, o relator do caso, Carlos Sampaio (PSDB-SP), havia defendido que Jaqueline fosse cassada, ainda que o vídeo em que recebe dinheiro de Barbosa tenha sido feito em 2006, antes, portanto, no início de seu mandato atual e época em que concorria a uma cadeira na Câmara Legislativa do Distrito Federal. Sampaio argumentara que a suposta propina, que a deputada classificou como caixa dois de campanha, não era conhecida pelos eleitores quando ela foi alçada à condição de parlamentar, o que não daria a ela o argumento de ter sido "absolvida nas urnas".
No Plenário, no entanto, a expectativa era de absolvição até entre deputados da oposição. Embora o voto tenha sido secreto e não passível de acompanhamento, PV, PPS, Psol, PSDB e DEM orientaram suas bancadas a votar pela cassação. Se todas essas bancadas tiverem votado conforme a orientação, Jaqueline teria automaticamente 125 votos por sua cassação. Alguns deputados chegaram a defender publicamente que os votos fossem abertos para que os eleitores pudessem acompanhar a manifestação de cada parlamentar.
Ao longo de todo o dia, estudantes fizeram protestos em prol da cassação de Jaqueline Roriz. Faixas foram instaladas em toda a cidade e pistas da Esplanada dos Ministérios foram pichadas com palavras contra a parlamentar. Também em Plenário os manifestantes usaram camisetas pretas com palavras contra a permanência da deputada como detentora de um mandato na Câmara.
Desde o início das acusações, o principal argumento da defesa de Jaqueline era o de que as irregularidades denunciadas por Durval Barbosa ocorreram antes do mandato e que a Câmara dos Deputados não teria competência para analisar fatos anteriores ao início do exercício parlamentar.
No auge dos processos de quebra de decoro resultados do esquema do mensalão federal deflagrado durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, o Conselho de Ética da Câmara passou, a partir de 2007, a levar em conta apenas atos cometidos pelos deputados após a posse para a abertura de processos que poderiam levar à cassação.
Em seu pronunciamento na Câmara, Jaqueline Roriz criticou o que classificou de "implacável condenação" por "juízos apressados". Ela citou a família, criticou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que na sexta-feira apresentou ao ao Supremo Tribunal Federal (STF) denúncia criminal contra ela, e em nenhum momento se defendeu da suspeita de recebimento de propina. "Cada um de nós carrega sua história e eu carrego a minha. Nesse doloroso processo, sofri constrangimentos perante meus pais, irmãs, filhos, amigos e eleitores. Foram fatos tratados por coloração partidária, preferências ideológicas. Sei que nesse Plenário tem muitos colegas que já passaram por isso e outros que podem passar. Nessa Casa não há espaço para condenações sumárias", disse a deputada, atribuindo as acusações ao "jornalismo predatório".
O mensalão do DEM
O chamado mensalão do DEM, cujos vídeos foram divulgados no final de 2009, é resultado das investigações da operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal. O esquema de desvio de recursos públicos envolvia empresas de tecnologia para o pagamento de propina a deputados da base aliada.
O então governador José Roberto Arruda (sem partido, ex-DEM) aparece em um dos vídeos recebendo maços de dinheiro. As imagens foram gravadas pelo ex-secretário de Relações Institucionais, Durval Barbosa, que, na condição de réu em 37 processos, denunciou o esquema por conta da delação premiada. Em sua defesa, Arruda afirmou que os recursos recebidos durante a campanha foram "regularmente registrados e contabilizados". Em meio ao escândalo, ele deixou o Democratas.
As investigações da Operação Caixa de Pandora apontam indícios de que Arruda, assessores, deputados e empresários podem ter cometido os crimes de formação de quadrilha, peculato, corrupção passiva e ativa, fraude em licitação, crime eleitoral e crime tributário.
Acusado de tentar subornar o jornalista Edmilson Edson dos Santos, o Sombra, testemunha do caso, Arruda foi preso preventivamente em fevereiro de 2010, por determinação do Superior Tribunal de Justiça, que ainda o afastou do cargo de governador. Ele ficou preso por dois meses e, neste período, teve o mandato cassado por desfiliação partidária.