O ex-presidente do PT José Genoino anunciou nesta quarta-feira (10) a saída do cargo de assessor especial do Ministério da Defesa, no governo federal, após ter sido condenado nesta terça-feira (9) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão.
"Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes", afirmou Genoino, que leu uma carta durante pronunciamento no diretório nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), em São Paulo (Veja a carta ao final).
Genoino foi condenado no Supremo pela maioria dos ministros (6 votos a 1) por corrupção ativa (oferecer vantagem indevida). A pena ainda deverá ser definida pela Corte ao fim do julgamento do mensalão.
A entrega do cargo foi publicada na edição desta quarta pelo jornal "Folha de S.Paulo".
A assessoria do Ministério da Defesa informou que ainda está tomando ciência da demissão e que não vai comentar a decisão.
"A Corte errou"
"Não me envergonho de nada. Continuarei a lutar com todas as minhas forças por um Brasil melhor, mais justo e soberano, como sempre fiz", afirmou Genoino. Ele fez a leitura da carta durante reunião de representantes do partido e foi aplaudido.
?Estou indignado. Uma injustiça monumental foi cometida! A Corte errou. A Corte foi, sobretudo, injusta, condenou um inocente."
Em sua defesa, Genoino afirmou que sua condenação foi baseada na "teoria do domínio funcional do fato". "(Ela) se transformou na tirania da hipótese pré-estabelecida, construi-se uma acusação escabrosa que pôde prescindir de evidências, testemunhas e provas", afirmou.
Genoino não concedeu entrevista aos jornalistas.
Encontro do PT
A assessoria do PT informou que a reunião já estava convocada antes da condenação no STF.
Por volta das 10h40, haviam chegado à sede do partido, no Centro da capital paulista, o senador Humberto Costa (PT-PE), e o presidente da legenda, Rui Falcão.
Era aguardada a chegada do ex-ministro José Dirceu, que é membro do diretório nacional do PT e também foi condenado por corrupção ativa nesta terça.
Ex-ministro da Casa Civil, Dirceu é apontado pela Procuradoria-Geral da República como o "chefe da quadrilha" do mensalão, esquema de compra de votos no governo Lula. Ainda faltam votar os ministros Ayres Britto e Celso de Mello.
Logo após a condenação, o advogado José Luís de Oliveira Lima afirmou que o julgamento não foi "correto".
Segundo a assessoria de imprensa do PT, não estava prevista nenhuma moção de desagravo aos petistas condenados.
Também foi condenado o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, que seria o operador do mensalão. O crime de corrupção ativa prevê pena de dois a 12 anos de prisão.
Ao todo, 25 dos 37 réus do processo do mensalão já sofreram condenações na análise de cinco itens: desvio de recursos públicos, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, corrupção entre partidos da base e corrupção ativa. O julgamento continua nesta quarta.
Íntegra da carta
Confira a íntegra da carta:
"Carta aberta ao Brasil
Eles passarão, eu passarinho
Mário Quintana
Dizem, no Brasil, que as decisões do Supremo Tribunal Federal não se discutem, apenas são cumpridas. Devem ser assumidas, portanto, como verdades irrefutáveis. Discordo. Reservo-me o direito de discutir, aberta e democraticamente com todos os cidadãos do meu país, a sentença que me foi imposta e que serei obrigado a cumprir.
Estou indignado. Uma injustiça monumental foi cometida!
A Corte errou. A Corte foi, sobretudo, injusta. Condenou um inocente. Condenou-me sem provas. Com efeito, baseada na teoria do domínio funcional do fato, que, nessas paragens de teorias mal-digeridas, se transformou na tirania da hipótese pré-estabelecida, construiu-se uma acusação escabrosa que pôde prescindir de evidências, testemunhas e provas.
Sem provas para me condenar, basearam-se na circunstância de eu ter sido presidente do PT. Isso é o suficiente? É o suficiente para fazerem tabula rasa de todo uma dedicada, com grande sacrifício pessoal, à causa da democracia e a um projeto político que vem libertando o Brasil da desigualdade e da injustiça.
Pouco importa se não houve compra de votos. A tirania da hipótese pré-estabelecida se encarrega de "provar" o que não houve. Pouco importa se eu não cuidava das questões financeiras do partido. A tirania da hipótese pré-estabelecida se encarrega de afirmar o contrário. Pouco importa se, após mais de 40 anos de política, o meu patrimônio pessoal continua o de um modesto cidadão de classe média. Esta tirania afirma, contra todas as evidências, que não posso ser probo.
Nesse julgamento, transformaram ficção em realidade. Quanto maior a posição do sujeito na estrutura do poder, maior sua culpa. Se o indivíduo tinha uma posição de destaque, ele tinha que ter conhecimento do suposto crime e condições de encobrir evidências e provas. Portanto, quanto menos provas e evidências contra ele, maior é a determinação de condená-lo. Trata-se de uma brutal inversão dos valores básicos da Justiça e de uma criminalização da política.
Esse julgamento ocorre em meio a uma diuturna e sistemática campanha de ódio contra o meu partido e contra um projeto político exitoso, que incomoda setores reacionários incrustados em parcelas dos meios de comunicação, do sistema de justiça e das forças políticas que nunca aceitaram a nossa vitória. Nessas condições, como ter um julgamento justo e isento? Como esperar um julgamento sereno, no momento em que juízes são pautados por comentaristas políticos?
Além de fazer coincidir matematicamente o julgamento com as eleições.
Mas não se enganem. Na realidade, a minha condenação é a tentativa de condenar todo um partido, todo um projeto político que vem mudando, para melhor, o Brasil. Sobretudo para os que mais precisam.
Mas eles fracassarão. O julgamento da população sempre nos favorecerá, pois ela sabe reconhecer quem trabalha por seus justos interesses. Ela também sabe reconhecer a hipocrisia dos moralistas de ocasião.
Retiro-me do governo com a consciência dos inocentes. Não me envergonho de nada. Continuarei a lutar com todas as minhas forças por um Brasil melhor, mais justo e soberano, como sempre fiz.
Essa é a história dos apaixonados pelo Brasil que decidiram, em plena ditadura, fundar um partido que se propôs a mudar o país, vencendo o medo. E conseguiram. E, para desgosto de alguns, conseguirão. Sempre.
São Paulo, 10 de outubro de 2012
José Genoíno Neto"