O presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Augusto Nardes, foi protagonista de uma articulação incomum nesta semana, no Congresso Nacional: a rejeição de um nome a ser indicado pelo Senado Federal para a vaga de um ministro da corte. Ainda mais em se tratando de alguém com aval do Palácio do Planalto e do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Nardes se posicionou contra a indicação do senador Gim Argello (PTB-DF) para a vaga de Valmir Campelo, ministro prestes a se aposentar. O petebista é alvo de seis inquéritos no Supremo Tribunal Federal, um deles por suspeita de corrupção ativa e peculato (desvio praticado por servidor público), e foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) por ter criado cargos comissionados artificiais quando era presidente da Câmara Distrital.
Na quinta-feira, o presidente do TCU assinou uma nota em que pedia ao Senado a "observância dos requisitos constitucionais previstos para a posse de qualquer cidadão que venha a ser membro da Corte", dentre os quais "idoneidade moral" e "reputação ilibada". Horas depois, Argello desistiu da disputa.
Em entrevista ao Estado por telefone, Nardes defendeu a indicação de parlamentares para o TCU - ele próprio chegou ao tribunal depois de longa carreira como deputado do PP. Mas considera que a nota de quinta-feira é um "marco" para que as escolhas dos futuros ministros sejam mais criteriosas que a da última semana.
Seria um constrangimento para o TCU o nome do senador Gim Argello ser aprovado no Senado?
Temos muito claro que havia esse constrangimento em receber alguém que tinha várias condenações em vários inquéritos.
Como o senhor agiu após saber dessa indicação?
Reuni todos os ministros para tomarmos uma posição. Depois de uma grande discussão entre todos os ministros, propus que não deveríamos aceitar simplesmente a indicação, pelo fato de que tinha uma condenação e estava se descumprindo a legislação brasileira.
Por quê?
Quem dá posse também tem que ser ouvido antes da indicação. Porque, se infelizmente tanto numa Assembleia ou no Congresso não for levado em consideração o que a Constituição diz, a Casa que vai receber (o novo integrante) tem que ter a coragem, a determinação de dizer não, e não simplesmente aceitar uma pessoa que possa comprometer toda a imagem da instituição.
O sr. falou com o padrinho da indicação, Renan Calheiros?
Liguei para o próprio presidente Renan dizendo que era muito difícil a situação do Gim. Liguei para vários senadores, dizendo que seria difícil a posse dele. Até que resolvemos fazer essa nota e deixar muito explícito, sem querer colocar a situação específica do senador, mas de forma geral, até para ficar claro que os indicados que possam ser feitos no futuro tenham um comprometimento de cumprir a legislação brasileira. Dei a mensagem de que tinha que se cumprir a Constituição. A nossa nota foi no sentido de dar um alerta ao Congresso de que, quando seja feita a escolha, que seja olhada a situação de cada candidato.
O que Renan disse ao sr.?
Disse que tinha todo o respeito pelo tribunal e entendia a nossa posição. Foi muito respeitoso.
Foi a mesma resposta que o sr. ouviu dos demais senadores que foram procurados?
Boa parte deles estava também constrangida com a situação que estava sendo criada, porque era evidente que tinha os inquéritos e a condenação. A nossa posição, a nossa nota, ajudou o Senado a tomar uma decisão que obrigou a renúncia do indicado.
O sr. acredita que o sistema de indicação de ministros para o TCU merece ser aprimorado?
Acho o sistema hoje melhor que o do Supremo Tribunal Federal, porque, no meu caso e no de muitos que estão no tribunal, ocorreu uma eleição. No Supremo, o presidente da República indica e o Senado referenda.
O que acha da articulação que vem sendo feita pela presidente da República e pelo Senado para a indicação da ministra Ideli Salvatti para a futura vaga?
Vamos nos manifestar a partir do momento em que houver essa indicação. Por enquanto, são especulações e não posso falar sobre especulações.
Acha correto haver no TCU muitos egressos do meio político? O sr. foi deputado pelo PP, José Jorge foi senador pelo PFL, Ana Arraes era deputada e é mãe do então governador e hoje presidenciável Eduardo Campos. Isso não compromete de alguma forma os trabalhos do tribunal?
A mistura do técnico com o político é extremamente positiva. Mesmo os de origem política, quase todos os escolhidos têm mestrado, doutorado, são pessoas especializadas. Independentemente de ser político ou técnico, muitas vezes pode ter um técnico que não tenha a mesma visão e a mesma capacidade de um parlamentar, que também tem formação técnica.