O cacique Rafael Mupimoku Suruí, da etnia Paiter Suruí, conquistou a nota máxima de 100 pontos em um concurso nacional da 3 Corações, tornando-se o grande vencedor entre os cafés avaliados por nove especialistas. O feito inédito foi revelado durante o lançamento do microlote “Café Tribos 100 Pontos”, em outubro.
Rafael é agricultor da aldeia Linha 9, localizada na Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia, e cultiva o robusta amazônico, espécie que historicamente tem menos valorização que o arábica.
Em entrevista, o cacique contou que o cultivo do café na região começou quase por acaso. “Conhecemos o café em 1982. Achávamos que era fruta e até comíamos porque era doce”, relembrou.
Segundo ele, as primeiras mudas foram deixadas por não indígenas antes da demarcação da terra, no mesmo ano.
Café premiado e 100% orgânico
O café produzido por Rafael foi descrito pelos jurados como rico e complexo, com notas de rapadura, mel, hibisco e flor de laranjeira, acidez média e final levemente achocolatado. O especialista Silvio Leite, referência no setor, destacou que foi apenas a quarta vez em sua carreira que atribuiu nota máxima a um café.
“É uma raridade. O café do cacique Rafael é prova de que o melhor do Brasil não é apenas o de exportação”, disse Leite.
O microlote de 333 unidades do Café Tribos 100 Pontos foi lançado em edição limitada, vendido exclusivamente pelo Mercafé, e-commerce da 3 Corações, por R$ 599, com moedor incluso.
Rafael celebra o reconhecimento com humildade: “É uma surpresa pra mim. Não entendo muito de café, mas fico feliz de ver nosso trabalho sendo reconhecido. Hoje torramos e tomamos o que produzimos”, contou.
A produção, totalmente orgânica, é feita sem adubos ou venenos industriais. “O segredo é cuidar bem. O café tem que ser bem seco, limpo e selecionado. A gente mesmo faz o adubo”, explicou o cacique.
Orgulho e transformação na aldeia
Para Rafael, a conquista representa mais do que um prêmio: é um símbolo de orgulho e esperança para os jovens indígenas.
“Alcançar os 100 pontos mostra que há futuro no campo. Os jovens estão voltando para a aldeia, querendo produzir e viver do nosso trabalho”, disse. Ele reconhece, no entanto, que o desafio é manter a produção diante das mudanças climáticas e da falta de irrigação.
“Sem irrigação é difícil. A produção caiu com a seca. No ano passado, não deu nada”, lamentou.
Da aldeia ao mercado
O reconhecimento é resultado de uma parceria iniciada em 2019 entre os Paiter Suruí e a 3 Corações, dentro do Projeto Tribos, que hoje envolve 169 famílias em 28 aldeias nas terras indígenas Sete de Setembro e Rio Branco.
De acordo com Patrícia Carvalho, gerente de cafés especiais da 3 Corações, o projeto surgiu após a empresa identificar o potencial dos cafés indígenas durante a Semana Internacional do Café, em 2018.
A iniciativa oferece capacitação, estrutura e assistência técnica, com o apoio da Embrapa, Emater e Funai. Atualmente, os produtores dividem os custos com a empresa, que garante a compra de toda a produção — pagando até 50% acima do preço de mercado.
Todo o lucro da linha Café Tribos é revertido aos produtores. Desde 2019, os microlotes já renderam R$ 300 mil em ganhos diretos às aldeias. “Mais do que o lucro, o projeto trouxe autoestima. Os jovens, que antes deixavam as aldeias, agora querem aprender e trabalhar com café”, afirmou Patrícia.
Para a 3 Corações, o projeto também aproxima a marca de consumidores atentos à origem e à sustentabilidade dos produtos. “Mostramos que é possível gerar impacto positivo com protagonismo indígena e respeito à floresta”, completou.