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Brasil pode receber onda de marcas de relógios de luxo, diz executivo

Negociação com bloco da Suíça na esteira de acordo da União Europeia com o Mercosul poderá trazer dezenas de marcas para o país, diz Freddy Rabbat

Marcas de relógios de luxo prestes a entrar no Brasil | Bloomberg Línea

O mercado de luxo no Brasil vive um verdadeiro paradoxo. Mesmo com um público consumidor cada vez mais familiarizado com produtos sofisticados e uma demanda crescente por itens como relógios, roupas e acessórios de alto padrão, o país ainda representa um dos cenários mais desafiadores do mundo para marcas internacionais. Não são raros os casos de grifes que preferem desistir de atuar localmente diante das dificuldades.

Enquanto muitos especialistas concentram suas atenções na ratificação do acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, outro processo de negociação internacional começa a ganhar destaque entre os que acompanham de perto os movimentos do mercado de luxo.

Segundo Freddy Rabbat, distribuidor da TAG Heuer e vice-presidente da Associação Brasileira das Marcas de Luxo (Abrael), um acordo entre o Mercosul e a EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio - Noruega, Islândia, Suíça, Liechtenstein) teria o potencial de transformar o mercado de luxo no país.

Freddy Rabbat, distribuidor da TAG Heuer e vice-presidente da Associação Brasileira das Marcas de Luxo (Abrael)

“Se o acordo for ratificado, do dia para a noite haverá um enxame de marcas suíças se estabelecendo no Brasil”, afirmou em entrevista à Bloomberg Línea.

Rabbat ressaltou que a negociação com o bloco costuma seguir o modelo acertado pela UE e ser ratificado seis meses depois. Mas no caso do Mercosul há expectativa de que isso aconteça até antes, o que pode mudar o cenário para as marcas de alto padrão.

“Se os impostos de importação forem reduzidos no Brasil, teremos mais de uma dezena de novas lojas trabalhando com relógios de luxo aqui. O Brasil é um mercado fantástico e muito importante para todo o mercado de luxo”, disse.

Segundo ele, o alto imposto de importação cria uma equação inviável para muitas marcas. “As empresas de luxo precisam sacrificar a margem de lucro para atuar no Brasil. Elas já aprenderam que, se não trabalharem com uma política de preço internacional, vão ‘queimar o filme’ no Brasil”, seguiu.

“Não adianta abrir uma loja e colocar um preço que seja reflexo do valor original mais os impostos. Vai chegar a um valor que é o dobro do que se encontra no exterior’’, pontuou.

Loja da TAG Heuer em Londres 

Esse descompasso levou à saída de várias marcas do Brasil na década passada. “No começo dos anos 2000 houve uma onda de abertura de lojas de marcas internacionais. Uma década depois, quase metade foi embora porque entenderam que não dava para trabalhar com preço diferenciado”, lembrou.

“As empresas que ficaram foram espertas. Aprenderam que ao fazer uma política de preço internacional, abrindo mão de parte do lucro, elas ganham o consumidor brasileiro, que passa a comprar em viagem’’, afirmou.

Hoje, o consumidor de luxo brasileiro costuma viajar de uma a quatro vezes por ano,  continuou.. “Para ele tanto faz onde vai comprar. Mas ele não é bobo, então não vai aceitar pagar no Brasil o dobro do preço no exterior”, explicou.

Apesar de ser o maior mercado consumidor da América Latina por ampla vantagem, o Brasil compra significativamente menos relógios suíços do que o México.

“No último trimestre de 2024, o México comprou 91,6 milhões de francos suíços [US$ 110 milhões] em relógios. O Brasil comprou 14,4 milhões de francos suíços [US$ 17,3 milhões]”, pontuou Rabbat. “O brasileiro consome tanto quanto o mexicano, mas ele compra no exterior, gera emprego lá fora e paga impostos lá fora”, continuou.

A liberalização tarifária com países como a Suíça, segundo ele, pode ajudar a mudar esse quadro. “Mudar essa lei não deixaria mais barato, mas atrairia mais marcas ao retirar delas a responsabilidade de assumir o custo dos impostos e sacrificar as margens”, afirmou.

“Se o Brasil reduzisse só o imposto de importação para relógios, isso aumentaria a venda no Brasil de cinco a dez vezes.”

Outro fator que pode alterar o equilíbrio do mercado global é o impacto das tarifas americanas sobre produtos suíços. “O mundo está discutindo o ‘tarifaço’ americano, mas nós fazemos escola nisso há muito tempo”, disse. Segundo ele, a guerra comercial pode acabar ajudando o mercado brasileiro.

“O ‘tarifaço’ do Trump pode ser fantástico para o Brasil. Na hora em que os EUA colocam impostos de mais de 30% sobre produtos da Suíça, os relógios do mundo todo vão subir de preço. Aí o Brasil pode começar a dar lucro para essas empresas. Não é que o Brasil melhora, mas o mundo se equipara ao que já acontece aqui”, avaliou.

Além da conjuntura internacional, há também mudanças de comportamento entre os consumidores em todo o mundo, com o avanço de tecnologias e as oscilações do mercado de luxo.

“O smartwatch veio para trazer o jovem para o consumo de relógios”, disse Rabbat. “Dez anos atrás, o nosso público estava na faixa dos 35 anos. Hoje há adolescentes interessados e olhando para relógios automáticos.”

Ele acrescenta que o relógio perdeu a função prática, mas ganhou ainda mais importância simbólica.

“Você não precisa do relógio de pulso para saber as horas. Trata-se de um símbolo da tribo a qual a pessoa faz parte. Ele simboliza a forma de pensar de quem o usa. O relógio posiciona as pessoas em termos dos valores delas. É algo que revela a personalidade.”

Rabbat defendeu que o Brasil reconheça o peso econômico do consumo de luxo e os benefícios de internalizar essas compras. “Ninguém olha para isso porque soa como querer passar leis para ajudar apenas aos ricos. Mas mudar essa lei geraria riqueza para o Brasil.”

Por: Bloomberg Línea

*** As opiniões aqui contidas não expressam a opinião no Grupo Meio.
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