O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, afirmou nesta segunda-feira (4) que o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff que tramita na Câmara foi aberto por "vingança" do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Para Cardozo, Cunha decidiu abrir o processo porque o PT votou pela continuidade de processo que investiga o peemedebista no Conselho de Ética.
O advogado-geral a União foi à comissão especial do impeachment nesta segunda apresentar a defesa de Dilma. Ao falar para deputados, ele afirmou que não houve crime de responsabilidade cometido pela presidente. O documento da defesa, com cerca de 200 páginas, foi entregue pessoalmente por Cardozo. Para o advogado-geral da União, houve um “desvio de poder” na decisão de Cunha. Segundo ele, isso deve gerar a anulação do processo de impeachment.
“Conforme fartamente documentado pela imprensa, a decisão do presidente Eduardo Cunha não visou o cumprimento da Constituição. Os fatos ficaram claros. A sua excelência senhor Eduardo Cunha usou da sua competência para fazer uma vingança e retaliação à chefe do Executivo porque esta se recusava a garantir no Conselho de Ética os votos que seu partido poderia lhe dar para que não fosse processado", disse.
Cardozo declarou que Cunha fazia um “movimento pendular”, condicionando a abertura ou não do processo de afastamento de Dilma à posição do PT no Conselho de Ética da Câmara. Para o advogado-geral da União, os fatos demonstram que o Brasil está “a mercê de um chantagista”.
“Ela [Dilma] se recusou a fazer gestões junto aos deputados do PT. Um governo que se curva a esse tipo de situações não tem legitimidade para governar”, disse.Segundo Cardozo, o pedido de afastamento é marcado por “profundos vícios”. "Não existem, efetivamente, crimes de responsabilidade. A peça inicial é marcada por profundos vícios", afirmou no início da sua argumentação aos deputados da comissão.
DELAÇÃO DE DELCÍDIO
Cardozo criticou, ainda, a juntada ao processo de impeachment da delação do senador Delcídio do Amaral (sem partido-MS). O advogado-geral da União disse que o presidente da Câmara, ao fazer isso, contrariou a sua própria decisão de estabelecer que a presidente Dilma só poderia responder por atos realizados durante o atual mandato.Apesar de Cunha ter autorizado incluir a delação no processo de impeachment, a comissão especial acabou retirando no último dia 22.
“Essa juntada qualifica clara ofensa ao procedimento legal do impeachment. [...] Essa delação, ao ser juntada, contraria a própria decisão do presidente Eduardo Cunha porque a maior parte diz respeito ao período anterior ao atual mandato”, alegou Cardozo.Ele acusou de Cunha de anexar a delação motivado pela mesma razão que deflagrou o processo. “Por que terá feito a juntada se contraria a sua decisão? Trata do desvio de poder em continuidade”, afirmou. Cardozo sustentou que o simples fato de ter sido anexada por Cunha depois de já aberto o processo configuraria nulidade do processo.
GOLPE DE ESTADO
Cardozo afirmou que um processo de impeachment precisa apontar crime de responsabilidade pelo presidente. Caso contrário, segundo ele, trata-se de um “golpe de Estado”.
“Se esses pressupostos não forem atendidos, se não houver ato imputado ao presidente, se não for justificado, a tentativa de impeachment é golpe de Estado, sim. O mundo atual não tem assistido mais a golpes militares. Por isso, se buscam discursos retóricos para se justificar a violência. Golpe com ruptura da Constituição ofende o estado democrático de direito [...] que será mal visto internacionalmente, trará insegurança jurídica e incertezas institucionais”, disse.
Cardozo ainda avaliou que um eventual governo que se forme após o afastamento da presidente não terá “legitimidade”. No caso de aprovação do impeachment pelo Congresso, assumirá a Presidência o vice-presidente da República, Michel Temer (PMDB).
“O impeachment que rasgue a Constituição traz duas graves consequências: a primeira é a ruptura com a institucionalidade; a segunda é fazer nascer um novo governo sem legitimidade. Pouco importa os homens que vierem a assumir, se são probos ou não, mas se a Constituição foi rasgada, não há legitimidade para o governo”, disse o advogado-geral da União.
TESTEMUNHAS A FAVOR E CONTRA IMPEACHMENT
Na semana passada, a comissão especial da Câmara destinou duas sessões a audiências com testemunhas a favor e contra o impeachment. Defensores do afastamento de Dilma, os advogados Janaína Paschoal e Miguel Reale Júnior, autores do pedido, apresentaram seuas alegações na quarta (30). Reale Júnior, por exemplo, disse que as pedaladas fiscais constituem “crime grave”.
Um dia depois, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e o professor de Direito Financeiro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Ricardo Lodi Ribeiro fizeram a defesa de Dilma. Eles apresentaram, entre outros argumentos, as teses de que não houve a operação de crédito e que a edição de decretos por Dilma no ano passado respeitaram a legislação.