Plenário da Câmara dos Deputados, quinta-feira. A primeira vice-presidente, Rose de Freitas (PMDB-ES), comanda uma sessão esvaziada. Apesar disso, coloca em votação alguns projetos, entre eles tratado de cooperação entre o Brasil e a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral.
"Não há oradores inscritos. Pergunto aos srs. líderes se gostariam de encaminhar (pausa). Não querem encaminhar [a votação]..."
Miro Teixeira (PDT-RJ), um dos poucos presentes, atalha: "Tenho a impressão de que pode botar "sim" todo mundo (...), só para ficar consignado que os partidos se manifestaram", afirma ele, se referindo ao registro no painel eletrônico da posição de todos os 22 partidos. O projeto é aprovado em menos de um minuto.
A cena ilustra prática que ganhou força nos últimos tempos, a de a de usar as manhãs de quinta-feira para aprovar projetos com baixíssima presença de parlamentares e sem que haja debate.
Só no plenário -espaço nobre da Casa, responsável por dar palavra final dos deputados sobre os temas discutidos-, foram aprovados 49 projetos e requerimentos neste ano por meio desse mecanismo. Como "O Globo" mostrou no dia 23, comissões também usam a manobra.
A maioria dos 49 textos tratava de acordos entre o Brasil e outros países, mas houve também projetos de criação de varas da Justiça do Trabalho e de proibição da venda de tintas aerossol a menores de 18 anos.
A "votação vapt-vupt" funciona assim: os deputados vão ao plenário na manhã de quinta e registram presença no sistema eletrônico. A maioria vai embora, mas a presença fica no painel.
Com base no quórum irreal, segue-se o roteiro: anuncia-se abertura de espaço para debate do projeto (ninguém se apresenta), passa-se imediatamente à votação (ninguém se pronuncia) e profere-se a tradicional frase: "Aqueles que forem pela aprovação permaneçam como se acham... Aprovado".
Miro Teixeira, um dos raros deputados a ficar nas sessões de quinta, defende a valorização do plenário. "Tudo depende da pauta, se tiver pauta, o plenário enche."
Rose de Freitas afirma que apresentará proposta de reformulação dos métodos da Casa. "Vou ser sincera. Está tudo equivocado. Não é só o modelo de quinta que está errado, mas o de quarta, o de terça, o de segunda."
A presidente da sessão, Rose de Freitas (PMDB-ES), anuncia o comparecimento de 301 deputados (mas há pouquíssimos, de fato, no plenário), abre os trabalhos e, na parte da votação, abre e fecha a discussão sobre três projetos sem que haja nenhum debate, terminando por declará-los aprovados em 3min36s.
Os projetos tratam de acordos entre o Brasil e a República do Burundi, a Comunidade de Dominica e a República Gabonesa.
Comentário, ao final, do deputado Efraim Filho (DEM-PB)
"A capacidade de persuasão de Vossa Excelência, aliada à flexibilidade pelo bom andamento da Casa que sempre norteia, em regra, as ações da oposição nessa Casa, permitiram que hoje nós votássemos esses projetos de extrema importância para o nosso país."