A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (14), por 327 votos a 147 e uma abstenção, em 1º turno, o texto-base da proposta de emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que estabelece um limite anual para o pagamento de precatórios — dívidas da União reconhecidas pela justiça em decisões das quais não cabem mais recursos.
De interesse do governo de Jair Bolsonaro, a PEC abre espaço de R$ 106,1 bilhões no Orçamento de 2022, o que bancará o Auxílio Brasil (ex-Bolsa Família) de R$ 400. A proposta ainda será votada em 2º turno, antes de seguir para promulgação. São necessários 308 votos, de um total de 513 deputados. A expectativa é de que a votação em segundo turno ocorra ainda nesta terça-feira.
O texto foi aprovado pela Câmara, em novembro, e pelo Senado, em dezembro. A PEC retornou para a análise dos deputados em razão de mudanças feitas pelos senadores na proposta original. Na semana passada, apenas os dispositivos comuns, aprovados pelas duas Casas, foram promulgados.
Por um acordo entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a proposta foi analisada diretamente no plenário, sem passar por comissões na Casa. A celeridade na votação dos trechos remanescentes era uma demanda dos senadores para promulgar apenas uma parte da PEC.
Limite anual
Entre os dispositivos alterados no Senado, está o que estabelece um limite anual para o pagamento dos precatórios.
A proposta dos senadores é que o limite corresponda ao valor das despesas com os precatórios em 2016 corrigidos pela inflação, Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Se promulgada, a mudança abrirá um espaço fiscal de R$ 43,8 bilhões para a União gastar em 2022, segundo o Ministério da Economia.
A principal alteração promulgada na última semana já abre um espaço de R$ 62,2 bilhões nos cofres do governo para o ano que vem, de acordo com a Economia. O valor pode ser ainda maior, de R$ 64,9 bilhões, segundo a Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados (Conof).
Segundo cálculos do Ministério da Economia, a alteração no cálculo do teto de gastos (já promulgada) e o limite anual do pagamento de precatórios garantirão ao governo um espaço no Orçamento de R$ 106,1 bilhões. Para a Conof, o espaço aberto pode chegar a R$ 108,5 bilhões.
Parte deste espaço será destinado ao pagamento do Auxílio Brasil, programa que substituiu o Bolsa Família. O ofício enviado ao Congresso na semana passada afirma que a ampliação do Auxílio Brasil no ano que vem exigirá mais R$ 54,6 bilhões do Orçamento.
Em 2022, o governo promete elevar o benefício para, ao menos, R$ 400 e ampliar o público do programa de 14,5 milhões de famílias para 17 milhões de famílias. A nota técnica que fundamentou o ofício considera R$ 415 como valor do benefício médio do Auxílio Brasil.
Outra mudança feita pelo Senado é a que reduz de 2036 para 2026 o prazo de vigência do limite de pagamentos dos precatórios.
Inicialmente, havia um acordo entre líderes para que o dispositivo fosse suprimido na Câmara — o que faria com que a mudança não tivesse validade. Porém, por receio de que a alteração obrigasse o retorno da PEC ao Senado, os deputados mantiveram a vigência em 2026.
Vinculação social
Ao analisar a matéria, os senadores aprovaram um dispositivo que obriga a utilização dos recursos obtidos com programas de transferência de renda, saúde, previdência social e assistência social. Por isso, essa parte do texto também voltou para análise dos deputados.
O objetivo é impedir que o espaço fiscal aberto fosse destinado para outros gastos em ano eleitoral, como emendas de relator — o chamado “orçamento secreto”.
Essa vinculação foi mantida pelos deputados. Com a amarração criada pelo Senado, mais de R$ 100 bilhões estariam "carimbados" para recursos sociais. Contudo, o entendimento de técnicos do Congresso é que isso não impedirá, por exemplo, um remanejamento de outros recursos do Orçamento para encorpar as emendas de relator.
Auxílio permanente
A proposta também altera a Constituição para especificar que “a redução da vulnerabilidade socioeconômica de famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza” deve ser objetivo da assistência social prestada a quem dela necessitar.
Além disso, passa a constar na Carta Magna que “todo brasileiro em situação de vulnerabilidade social terá direito a uma renda básica familiar, garantida pelo poder público em programa permanente de transferência de renda”.
Segundo os senadores, que incluíram esses dispositivos, a redação dará caráter permanente a um programa social de transferência de renda, hoje o Auxílio Brasil. A Câmara manteve essas mudanças.
Prioridade de pagamento
Conforme o texto aprovado, os precatórios não pagos em razão do limite estabelecido pelo texto terão prioridade de pagamento nos exercícios seguintes, respeitada a ordem cronológica e os seguintes termos:
-obrigações definidas em lei como de pequeno valor;
-precatórios de natureza alimentícia cujos titulares, originários ou por sucessão hereditária, tenham a partir de 60 anos de idade, ou sejam portadores de doença grave ou pessoas com deficiência até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
-demais precatórios de natureza alimentícia até o valor equivalente ao triplo do montante fixado em lei como obrigação de pequeno valor;
-demais precatórios de natureza alimentícia acima do triplo do montante fixado como obrigação de pequeno valor;
-demais precatórios.
Fundef
Outro ponto que foi alterado no Senado e precisou voltar para análise da Câmara foi a que retirou o pagamento dos precatórios do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) do limite estabelecido pelo teto de gastos. Este ponto foi mantido pelos deputados.
Na primeira votação na Câmara, a PEC estabeleceu um parcelamento, em três vezes, dessas dívidas: primeiro, uma parcela de 40%; em seguida, duas parcelas de 30%.
Os senadores, contudo, incluíram um cronograma para esse pagamento: o primeiro montante seria pago até 30 de abril; o segundo até 31 de agosto e o restante até 31 de dezembro. Há um acordo entre líderes para retirar esse dispositivo na votação dos destaques.
O texto também acrescenta um dispositivo na Constituição para prever que 60% dos precatórios devido ao Fundef sejam destinados aos profissionais do magistério, inclusive aposentados e pensionistas, na forma de abono. Os recursos não poderão ser incorporados na remuneração, aposentadoria ou pensão.