Criticado pelo ministro Marco Aurélio Mello depois que discutiu com Ricardo Lewandowski no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Joaquim Barbosa, afirmou em nota que "jamais" tirou "proveito de relações de natureza familiar" para ascender profissionalmente. Mello foi indicado para ocupar o posto de ministro no STF em 1990 pelo então presidente Fernando Collor de Mello, de quem é primo. Mello disse que a crítica não o alcançou. ?Infelizmente, ou felizmente, ele [Barbosa] não guarda parentesco com Collor?, disse.
Na sessão de julgamento do mensalão na última quarta (26), uma divergência entre Barbosa, que é relator do processo, e Lewandowski, revisor, provocou uma discussão áspera entre os dois durante cerca de 15 minutos. Marco Aurélio Mello chegou a repreender Barbosa: "Policie a sua linguagem". Depois, fora do plenário, Mello questionou as condições do colega de presidir o Supremo ? Barbosa substituirá o atual presidente, Ayres Britto, que vai se aposentar em novembro.
Na nota, o ministro Joaquim Barbosa disse que Mello é um "obstáculo" a qualquer presidente do Supremo. "Um dos principais obstáculos a ser enfrentado por qualquer pessoa que ocupe a Presidência do Supremo Tribunal Federal tem por nome Marco Aurélio Mello. Para comprová-lo, basta que se consultem alguns dos ocupantes do cargo nos últimos 10 ou 12 anos", diz no texto da nota.
Barbosa afirmou que ascendeu na carreira com base no mérito e não no parentesco. ?Ao contrário de quem me ofende momentaneamente, devo toda a minha ascensão profissional a estudos aprofundados, à submissão múltipla a inúmeros e diversificados métodos de avaliação acadêmica e profissional. Jamais me vali ou tirei proveito de relações de natureza familiar", disse Barbosa em nota divulgada por seu gabinete.
Marco Aurélio Mello afirmou que a nota de Barbosa não o ?alcançou?. Ele afirmou que, ?por enquanto?, a eleição de Barbosa para o comando do STF não está ?em risco?.
?Só exteriorizei uma preocupação, que deve ser a preocupação geral. Quanto ao que poderíamos ter no futuro, admitindo a eleição dele [Barbosa]. Se eu não admitisse a eleição dele, não estaria preocupado?, disse.
Mas Marco Aurélio levanta uma dúvida sobre a eventual aclamação de Barbosa para a presidência do Judiciário. ?Não sei, evidentemente. Teremos uma eleição. E voto é voto?, observou.
Questionamento
Nesta quinta-feira (27), um dia após Barbosa e Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão, protagonizarem mais um debate acalorado no plenário do STF, o ministro Marco Aurélio Mello criticou o tom usado pelo relator para se contrapor ao voto do revisor e questionou uma futura gestão do colega na presidência do tribunal.
?Como é que ele (Barbosa) vai coordenar o tribunal? Como vai se relacionar com os demais órgãos e demais poderes? Mas vamos esperar. Nada como um dia após o outro?, disse o ministro.
No intervalo da sessão desta quinta, Marco Aurélio voltou a falar sobre o assunto. Ele se disse "muito preocupado". "O presidente é um coordenador. Ele é um algodão entre cristais. Não pode ser metal entre cristais", declarou.
Marco Aurélio ainda destacou que a eleição de Barbosa para a presidência do STF não é automática. Ele, no entanto, disse que parte da premissa de que o relator será eleito.
Irritado com as declarações do colega de tribunal, Barbosa chegou a procurar Ayres Britto, ao final da sessão, para reclamar de Marco Aurélio Mello. "Quem esse cara [Marco Aurélio] pensa que é?", afirmou o relator, no meio do plenário, ao chefe do Judiciário.
Por tradição, o escolhido para presidir o Supremo é o ministro mais antigo da corte que ainda não tenha ocupado o cargo. Porém, mesmo que de forma protocolar, os magistrados terão de realizar uma votação secreta para eleger Joaquim Barbosa o novo chefe do Judiciário.
Na nota, o relator do mensalão assegura que, ?caso venha a ter a honra de ser eleito presidente da mais alta corte de Justiça do nosso país nos próximos meses?, como está previsto nas normas regimentais, não protagonizará ?decisões rocambolescas?.
?Estou certo de que de mim não se terá a expectativa de decisões rocambolescas e chocantes para a coletividade, de devassas indevidas em setores administrativos, de tomadas de posição de claro e deliberado confronto para com os poderes constituídos, de intervenções manifestamente "gauche", de puro exibicionismo, que parecem ser o forte do meu agressor do momento.
Leia a íntegra da nota do ministro Joaquim Barbosa:
"Um dos principais obstáculos a ser enfrentado por qualquer pessoa que ocupe a Presidência do Supremo Tribunal Federal tem por nome Marco Aurélio Mello. Para comprová-lo, basta que se consultem alguns dos ocupantes do cargo nos últimos 10 ou 12 anos. O apego ferrenho que tenho às regras de convivência democrática e de justiça me vem não apenas da cultura livresca, mas da experiência concreta da vida cotidiana, da observância empírica da enorme riqueza que o progresso e a modernidade trouxeram à sociedade em que vivemos, especialmente nos espaços verdadeiramente democráticos.
Caso venha a ter a honra de ser eleito Presidente da mais alta Corte de Justiça do nosso País nos próximos meses, como está previsto nas normas regimentais, estou certo de que de mim não se terá a expectativa de decisões rocambolescas e chocantes para a coletividade, de devassas indevidas em setores administrativos, de tomadas de posição de claro e deliberado confronto para com os poderes constituídos, de intervenções manifestamente "gauche", de puro exibicionismo, que parecem ser o forte do meu agressor do momento.
Ao contrário de quem me ofende momentaneamente, devo toda a minha ascensão profissional a estudos aprofundados, à submissão múltipla a inúmeros e diversificados métodos de avaliação acadêmica e profissional. Jamais me vali ou tirei proveito de relações de natureza familiar".