?Eu comecei com bebida. Eu mentia dizendo que ia para a escola e me encontrava com os amigos em um barzinho próximo. Lá a gente bebia e fumava. Mas aí depois não era suficiente, eu precisava de uma coisa mais forte. Dentro da própria escola eu passei para a maconha e quando eu vi eu já estava viciado em crack. Para manter o vício eu roubei, assaltei e me tornei traficante?.
A declaração acima é de um ex-traficante da zona Norte. Dependente químico, ele hoje luta contra o vício para recuperar aquilo que ele deixou perdido lá na escola, onde ele encontrou a porta de entrada para a experimentação.
A drogas no ambiente escolar já é um fator preocupante na assustadora relação entre drogas e juventude. É nesse mesmo espaço onde os jovens aprendem ler e escrever, a beijar na boca e têm sua iniciação sexual, que conhecem também esse perigoso caminho.
Na grande maioria das vezes, a experiência começa com drogas legais, como álcool, cigarro e cola de sapateiro. Mas dificilmente essa relação termina assim. Em seguida, entram os entorpecentes ilícitos e, entre esses, a maconha e o crack estão em primeiro lugar.
Não há números precisos sobre a penetração das drogas nas escolas piauienses, mas o relato de professores e da polícia indicam que ela avança, transformando o espaço reservado para formar cidadãos em um ambiente formador de viciados.
A situação é pior porque esse é um problema velado. Não há iniciativa em denunciar. Os professores e diretores temem retaliação dos traficantes e dos próprios alunos, que os intimidam com ameaças e agressões.
O problema já bateu na porta da Câmara dos Vereadores de Teresina. Recentemente um grupo de diretores de escolas da zona Norte de Teresina pediu ajuda ao vereador, que também é Major da Polícia Militar, Paulo Roberto. De acordo com os relatos do vereador, algumas escolas não conseguem mais conviver com a violência causada pelas drogas e o problema parece não existir entre os gestores públicos.
Segundo ele, alguns ?aviõezinhos?- nome dado aos aliciadores contratados por traficantes, atuam na porta de escolas próximas aos distritos policiais. ?Eles entregam drogas, recebem dinheiro, fazem todo o contato e nada acontece?, diz o vereador ao destacar que os professores não denunciam por medo de retaliações.
Escolas da zona Norte lideram em violência
A disseminação das drogas nas escolas tem várias consequências e a principal delas é a violência. Dados do pelotão escolar, que faz atendimento nas escolas, mostram que a maior parte das ocorrências registradas é motivada pelas drogas. De acordo com o sargento J. Cruz, do policiamento escolar, várias escolas da capital solicitam policiamento ostensivo integral por conta da violência. Entre as principais ocorrências estão agressões (14,28%), vandalismo (6,49%), lesão Corporal (5,19%) . ?A maioria tem alguma relação com o uso de drogas. Onde tem drogas tem violência?, afirma.
Segundo o Pelotão, as escolas na zona Norte lideram os índices de violência, com 29,8% do total de ocorrências em 2009. A mesma zona é apontada pelo Rone como a de maior número de bocas-de-fumo. O horário de maior ocorrência é o período da tarde, com 37,66% dos casos. ?É à tarde a maioria dos jovens fica ociosa?, diz o sargento.
Quando o professor Vilmar Soares da Costa recebeu a direção da Escola Municipal Angelim, na zona sul de Teresina, no ano de 2005, mais parecia um presídio. O clima era de tensão e violência e a estrutura física estava depredada.
Salas rabiscadas, banheiros quebrados, teto destelhado. O motivo: drogas.
Alunos entre 13 e 15 anos, que logo que saíram da infância já caíram na ?rede?, termo utilizado no tráfico para definir aqueles que usam e comercializam drogas. Para conter a violência, era preciso policiamento ostensivo. Todo aluno que entrava era fiscalizado e foi preciso proibir o uso do boné, local utilizado como esconderijo. Mas isso não era suficiente, a droga sempre conseguia entrar na escola.
A primeira consequência das drogas na escola é a violência. Vilmar sofreu ameaças e teve o carro depredado.
Motivo de preocupação da família que temia pela sua segurança. O dia de maior terror foi quando um aluno atingiu um vigia com um tiro na cabeça. ?Foi aí que percebemos que não tínhamos condições de continuar convivendo com as drogas e resolvemos implantar uma política de paz na escola?.
Com ajuda de programas sócioeducativos como o ?Escola Aberta? - programa de enfrentamento das situações da vulnerabilidade através da promoção da cultura da Paz e projetos esportivos, Vilma foi mudando a realidade da escola. ?Chamamos os pais para dentro da escola e contamos também com o apoio da Igreja. Foi assim que começamos a a enfrentar as drogas?.
Quase cinco anos depois Vilmar já colhe os frutos dessa política. Hoje, o índice de drogas na escola é insignificante.
Não é mais preciso policiamento na escola e os próprios alunos, antes usuários de drogas, ajudam no enfrentamento do vício.