A Polícia Civil em Guarujá, no litoral de São Paulo, apreendeu nesta quarta-feira (7) a bermuda usada, no momento do crime, pelo suspeito de participar da morte de Fabiane Maria de Jesus, espancada após um boato em uma rede social. O homem, que foi preso nesta terça-feira (6), se negou a dar informações sobre outros envolvidos no espancamento, mesmo após a polícia lhe oferecer o benefício de ficar em uma cela isolada.
O delegado Luiz Ricardo Lara afirma que o caso continua sendo investigado, e que dois moradores do bairro Morrinhos, local onde Fabiane Maria de Jesus foi espancada no último sábado (3), iriam comparecer à delegacia nesta quarta-feira para contar o que viram.
?Hoje a Polícia Civil deu continuidade às diligências que acontecem desde a morte da Fabiane. Enquanto algumas equipes vão a campo em busca de testemunhas presenciais, outras equipes analisam as imagens com o intuito de individualizar as pessoas que aparecem. Hoje vou ouvir duas testemunhas do crime?, explica Lara.
Ainda dando continuidade à investigação, a polícia apreendeu a bermuda do suspeito de ter participado do espancamento. Ele está cumprindo prisão temporária. ?Retornamos ao imóvel onde ele morava e conseguimos apreender a bermuda que Valmir usava na ação criminosa. A apreensão dessa bermuda, somada a confissão e aos reconhecimentos são provas inequívocas da sua participação no espancamento. Ele afirmou ser usuário de drogas e disse que diante do clamor público foi empurrado pela multidão. Ele afirmou estar arrependido e alegou que agiu pensando que ela fosse uma criminosa?, afirma o delegado.
A polícia diz ainda que o homem preso temporariamente preferiu não identificar demais envolvidos no espancamento. ?Ele apontou a participação de pelo menos 100 pessoas que agrediram Fabiane, mas que se sentia temeroso em apontar essas pessoas. Demos a oportunidade dele ficar em uma cela chamada de seguro, isolado, mesmo assim ele preferiu ficar em silêncio. Nós dependemos agora da ajuda da população local. Que procurem a polícia para dar outras informações?, finaliza o delegado.
Prisão
O delegado Claudio Rossi, da Delegacia Sede de Guarujá, informou que cinco pessoas suspeitas de participação no linchamento de Fabiane estão sendo identificadas. Segundo Rossi, um suspeito detido na terça-feira (6) já teve a prisão temporária decretada e foi encaminhado à Delegacia Sede.
Valmir Dias Barbosa, de 48 anos, foi detido no bairro Morrinhos, a mesma região onde a vítima vivia e foi atacada. Segundo a polícia, o homem confessou a participação na agressão que acabou resultando na morte de Fabiane. O homem foi reconhecido após as imagens do linchamento terem sido entregues à polícia. Outras duas pessoas foram levadas à delegacia. Segundo a polícia, elas testemunharam os fatos, conheciam a dona de casa e o homem que foi preso.
Barbosa alegou que tem filhos e que participou da ação por acreditar que as acusações à vítima ? de que ela sequestrava crianças para rituais de magia negra ? fossem verdadeiras. "Aconteceu e aconteceu. Não posso fazer mais nada", disse o suspeito.
Enterro
Centenas de pessoas acompanharam, na manhã desta terça-feira, o enterro de Fabiane, que deixa marido e dois filhos, um de 12 anos e outro de 1 ano. A cerimônia reuniu familiares e amigos que não se conformam com a crueldade do crime.
O enterro foi realizado no cemitério Jardim da Paz, no bairro Morrinhos. O marido de Fabiane, Jaílson Alves das Neves, disse que não sente ódio dos suspeitos. ?Para mim a ficha não caiu. Apesar da brutalidade, não guardo ódio, não guardo esse sentimento ruim no coração. Espero que não aconteça com mais famílias. Essas pessoas que agrediram ela e as que assistiram e não tiveram a coragem de salvar uma pessoa inocente não deram nem tempo de defesa para minha esposa. Quero que eles reflitam e que isso não aconteça nunca com a família deles?, explica.
Protesto
Após o enterro de Fabiane Maria de Jesus, dezenas de amigos e familiares realizaram uma passeata no bairro Morrinhos. A população não quer que a imagem do local fique manchada por causa do crime brutal.
Maria José Dias era amiga da vitima há 25 anos e foi a última a ver Fabiane ainda com vida. ?Ela foi buscar uma bíblia que tinha esquecido na igreja. Tinha pedido para que eu não esquecesse de rezar por ela. Ela estava bonita no sábado, tinha acabado de cortar e pintar o cabelo. Ela se despediu e disse que ia ao médico. A Fabiane nunca fez mal a ninguém. Tiraram o direito de uma bebê crescer ao lado da mãe. Isso não se faz. Essas pessoas chutaram uma mãe indefesa?, afirma.
Os manifestantes levaram faixas e cartazes com pedidos de justiça. ?Minha maior revolta é que eles fizeram com que a imagem do meu bairro fosse destruída. Eles acabaram com a imagem das pessoas que moram aqui e que são honestas e de bem?, explica.
Revolta de internautas
Dezenas de usuários da rede social criticaram duramente o administrador da página e um deles chegou a dizer que a página seria tão culpada quanto os agressores.
Em uma postagem feita no fim da tarde de segunda-feira, o dono da página afirma que está colaborando com as investigações e que não irá se pronunciar a respeito do caso para não atrapalhar o trabalho da polícia. Em alguns comentários, os usuários condenaram a publicação do retrato falado, mesmo sabendo que se tratava apenas de um boato.
De acordo com o delegado Luiz Ricardo Lara, que está à frente do caso, ainda é cedo para apontar a responsabilidade do administrador da página Guarujá Alerta. ?Caso, durante a instrução do inquérito policial, seja vislumbrado que, de alguma forma, ele colaborou com o crime, na medida em que propalou esses boatos, enfim, que praticou uma infração penal, ele será responsabilizado por aquele ato?, afirma.
Confusão
De acordo com o inquérito, o retrato falado atribuído a Fabiane havia sido feito por policiais do Rio de Janeiro, da 21ª DP (Bonsucesso), em agosto de 2012. Na ocasião, uma mulher foi acusada de tentar roubar um bebê do colo da mãe em uma rua de Ramos, na Zona Norte da cidade.
Imagens de câmeras de segurança divulgadas na época mostraram uma mulher passando com a filha de 15 dias no colo e sendo seguida pela suspeita. A vítima estava levando o bebê para fazer o teste do pezinho em um posto de saúde. Ao sair da unidade, foi surpreendida pela mulher.