Quando policiais de outras unidades faziam operações de repressão ao tráfico nas 13 favelas onde traficantes mantinham acordo com PMs do Batalhão de Duque de Caxias (Baixada Fluminense), conforme revelado na operação Purificação nesta terça-feira (4), os agentes corruptos recomendavam que os criminosos fortemente armados atirassem contra os colegas que não faziam parte do esquema de recebimento de propina. A informação foi confirmada pelo delegado Fábio Galvão, subsecretário de Inteligência.
? Em uma das conversas, um traficante diz a um policial que a comunidade está sendo alvo de operação. O policial então diz que a operação não é deles e que, caso seja necessário, os criminosos podem atirar contra os policiais.
Até a noite de terça, 63 PMs haviam sido presos - 61 por ordem da Justiça e outros dois em flagrante. As investigações da Subsecretaria de Inteligência, Polícia Militar, Polícia Federal e Ministério Público revelaram que um sargento da PM era o homem mais temido no esquema, tanto por traficantes quanto por policiais. Quando não havia dinheiro para pagar a propina diária aos policiais, os PMs diziam aos traficantes que o "dinheiro do Lopes" não poderia faltar. Nas conversas entre os próprios policiais, era comum mencionarem que o dinheiro do Lopes já havia sido recebido.
André Antônio Lopes chegou a ser candidato a vereador pelo município de Magé, vizinho a Duque de Caxias, mas teve a candidatura vetada. Segundo promotores, Lopes participou de mais de 40 autos de resistência, quando suspeitos são mortos em confronto com policiais.
Sequestros por propinas
Para receber diárias de traficantes em troca da não repressão do comércio ilegal em 13 favelas de Duque de Caxias, um grupo formado por 65 policiais militares do Batalhão de Duque de Caxias (15º BPM) sequestrava traficantes e seus parentes como forma de pressionar os criminosos a fazer os pagamentos em dia.
De acordo com as investigaçõess, um grupo de policiais chegou a pedir R$ 200 mil de resgate pela libertação de um traficante. A negociação foi caindo e chegou ao valor de R$ 3.000. Os policiais rejeitaram a oferta e apresentaram o criminoso a uma delegacia da região.
Além de traficantes e familiares, os policiais também sequestravam veículos. Eles apreendiam os carros dos criminosos e cobravam valores para devolver os veículos. Um traficante considerado foragido da Justiça também sofreu extorsão para não ser preso.
A ganância dos policiais era tão grande que oito deles chegaram a ser transferidos para outros batalhões e, mesmo assim, tentavam extorquir dinheiro de traficantes de Duque de Caxias, como explica o promotor Décio Alonso, do Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado).
? Eles tentavam tomar dinheiro dos traficantes mesmo não trabalhando mais na região. Quando os traficantes descobriam, paravam de pagar.
Kit apreensão
Durante as investigações, a polícia descobriu que um dos PMs investigados vendeu um fuzil por R$ 45 mil a um traficante. Como precisavam cumprir as metas estabelecidas pela Secretaria de Segurança Pública de prisões e apreensões, era comum os PMs não cumprirem o acordo com os traficantes.
Também era comum os policiais forjarem uma espécie de ?kit apreensão?, com armas e drogas fornecidas pelos traficantes como se tivessem sido realmente apreendidas durante as operações.
Em uma das escutas telefônicas autorizadas pela Justiça, um traficante liga para um PM e diz que vai deixar a escopeta calibre 12 dentro da geladeira de um bar em uma favela. Pouco depois, o PM retorna a ligação e diz que deixou R$ 300 para o traficante, como pagamento pelo favor. Na gravação, o traficante fala: ?vou deixar uma arma aí para você apresentar?.
Em outra gravação, um PM fala para um traficante: ?se ficar bom para vocês, vai ficar bom para a gente também?, em uma insinuação de que o acordo para não reprimir o tráfico seria lucrativo para policiais e traficantes.