Após ser presa sob suspeita de tentar sacar quase R$ 2 milhões de um banco, em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, vestida de freira, Lourdes Antunes Marques, de 77 anos, disse que ela começou a ser aliciada para aplicar o golpe há seis meses. Lourdes usou documentos falsos para retirar o dinheiro.
Ela disse que se sentiu mal vestida de freira: ?Me senti mal, bem porque era católica, mas me senti mal. Por que eu estou me vestindo essa roupa, meu Deus? Para quê isso? Mas se é para o bem de alguém, eu vou tentar. Não deu certo?, contou Lourdes.
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Lourdes Antunes Marques tentou usar documentos falsos para sacar um título de dívida pública de R$ 1, 859 milhão de uma freira de verdade que vive na Paraíba. ?Sou devota de São Judas Tadeu, de Nossa Senhora de Aparecida, oro todo dia de manhã e de noite. Eles deixaram acontecer isso comigo?, comentou Lourdes.
?Eles? são dois comparsas que foram presos na hora do crime. Uma advogada que teria convencido Lourdes a entrar no esquema está foragida. A falsa freira contou como caiu na conversa da advogada. Lourdes contou que a mulher se aproximou dela através de conversas.
?A gente conversava na rua, aí ela me oferecia as coisas. Eu aceitava, porque precisava de comida, coisa assim. No Natal ela botou a minha mesa de Natal. Me deu R$ 500 para fazer compra, eu enchi meu armário?, disse.
A quadrilha sabia que a freira de verdade tinha para receber uma dívida do governo. A freira de verdade é Maria Lindalva de Azevedo, que vive em Campina Grande, na Paraíba, e dá aulas numa escola. Ela não quis comentar o caso.
?Eu acredito que ela tomou um susto muito grande, porque ela nem sabia que tinha sido vencedora de uma ação?, disse Marina Gadelha, ex-aluna da irmã Maria Lindalva.
Promessa de R$ 2 mil e casa nova
Com a promessa de ganhar R$ 2 mil e uma casinha nova, Lourdes, fantasiada de freira, foi levada até uma agência da Caixa Econômica Federal, em Niterói. Lá, ela apresentou documentos falsos para fingir que era a freira verdadeira.
?O rapaz que estava comigo, eu falei: ?melhor parar com isso, está demorando muito?. Ele disse: ?não, é assim mesmo, não tem nada, não?. Foi quando chegou a polícia e disse: ?a senhora vai me acompanhar??. Eu disse: ?pois não?, contou a suspeita, que afirmou que tremeu porque tem mal de Parkinson.
Como o valor era muito alto, o banco desconfiou. ?Os servidores da Caixa Econômica perceberam que havia algo de errado e nos chamaram. Lá nós percebemos, detectamos que havia falsidade na identidade?, contou o delegado da Polícia Federal de Niterói Marcos Aurélio Costa de Lima.
Aos 77 anos, Lourdes, que nunca tinha cometido um crime, vai responder por estelionato, uso de documento falso e formação de quadrilha. Fica a pergunta: por que ela resolveu participar de um golpe?
?Tenho necessidade. Eu ganho R$ 634 do INSS. Eu digo: vou ganhar algum dinheiro, já vai ajudar, que eu tenho filho que é especial?, justificou a idosa.
Golpe
Dinheiro fácil e rápido. É assim que os golpistas enrolam a vítima, seja pobre ou seja rica. Se ganhar na loteria já é difícil, imagine ser premiado e ficar rico sem jogar? Impossível. Mas essa é armadilha de um grupo de estelionatários que age em quatro estados brasileiros com o chamado ?golpe do bilhete premiado?.
?Não adianta. As pessoas são preparadas. Não adianta falar: ?eu nunca cairia num golpe desses?. Mas cai?, disse Alessandro Thiers, delegado da Polícia Civil.
Em julho de 2009, o Fantástico revelou a técnica predileta dos estelionatários: a vítima está sozinha, um senhor de aparência simples pede ajuda, diz que ganhou na loteria, mas que é analfabeto e está sem os documentos. Em troca de ajuda para sacar o dinheiro, ele oferece parte do prêmio. Um segundo golpista então aparece como alguém bem sucedido, um advogado, por exemplo, oferece ajuda e liga para uma suposta lotérica. Do outro lado da linha, um terceiro golpista confirma os números do falso bilhete premiado.
Uma das vítimas do golpe foi uma analista financeira aposentada, que não quis se identificar. Ela foi de agência a agência para entregar mais de R$ 50 mil nas mãos de estranhos. ?Eles liberaram inicialmente R$ 5 mil, aí falou: ?você tem que ir à sua agência de origem?. Era R$ 5 mil em uma, R$ 5 mil em outra, R$ 15 mil em outra, e R$ 10 mil em outra?, disse.
Em meia hora, uma outra vítima, uma secretária, sacou a poupança de toda uma vida. ?Foi R$ 22 mil, e R$ 1,5 mil estava na minha bolsa, que eu ainda dei para ele?, contou.
Imagens mostram o momento em que uma terceira vitima retira dinheiro para entregar a um comparsa. ?Parece que eles fazem uma lavagem cerebral na tua cabeça ali na hora que você não pensa em nada, a cabeça fica oca?, disse a secretária.
Novos golpistas
Na semana passada foram presos no Rio de Janeiro dois golpistas que agiam desde 2006, em Minas Gerais. São tantos outros soltos que a Polícia Federal tem até um catalogo das quadrilhas. A cada dia surge no Brasil mais golpista reciclando velhos truques e se aproveitando do desespero das vítimas.
Na terça-feira (25), em Mogi das Cruzes, São Paulo, um homem foi preso depois de dar mais de quatro mil telefonemas para aplicar o mesmo o golpe. A polícia acredita que de telefonema em telefonema, o golpista tenha conseguido cerca de R$ 100 mil.
?Esse indivíduo chega para as pessoas de idade, e eles falam que o filho dessa pessoa sofreu um acidente. Só que ele bateu o peito e ele está impossibilitado de falar. E ele está pedindo dinheiro porque ele está com problema no carro, e é aquela coisa: ele tem que ir para o hospital e não está podendo falar. No caso da minha mãe, ela caiu em R$ 9 mil.?, explicou o filho de uma das vítimas.
Falsos pacotes para a Copa do Mundo
E agora tem uma novidade: a Copa do Mundo. Os criminosos oferecem falsos pacotes para acompanhar a seleção brasileira. Uma gravação mostra uma das conversas entre um estelionatário e um homem.
Homem: ?É para acompanhar os jogos da Copa do Mundo??
Golpista: ?Exatamente. Na cidade do Cairo, certo? Na África Central...?
Cairo é a capital do Egito, e a Copa do Mundo será realizada na África do Sul, cuja capital é Joanesburgo. O golpista dá o preço:
Golpista: ?Está no valor de R$ 385?
O especialista em combate a fraudes, Lorenzo Parodi, dá as dicas: ?Sempre desconfiar de propostas boas demais. Não agir com pressa, nunca. Se alguém te faz uma proposta e diz ?não, você tem que decidir agora. Você tem dez minutos para me dizer sim ou não?. É não?, disse.