O júri dos 26 policiais militares acusados por 15 mortes durante o massacre do Carandiru não foi retomado na manhã desta quarta-feira (17). Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, um jurado passou mal e o juiz José Augusto Nardy Marzagão preferiu não reiniciar os trabalhos do Tribunal do Júri no Fórum da Barra Funda, na Zona Oeste de São Paulo.
"Um dos jurados apresentou mal-estar pela manhã, tendo sido chamado um médico para avaliado. O profissional recomendou que o paciente permanecesse em repouso. O juiz conversou com o jurado, que disse estar disposto a continuar, mas por precaução, o magistrado achou por bem seguir a orientação médica", informou o TJ em nota.
A assessoria do tribunal não relatou qual teria sido mal-estar sofrido pelo jurado. Ele deverá passar por uma nova avaliação médica nesta manhã, que determinará se o julgamento irá prosseguir. Na semana passada, o júri foi adiado porque uma jurada passou mal. Pelas regras do Tribunal do Júri, caso um jurado passe mal e não possa prosseguir participando do júri, o julgamento é cancelado.
Caso o júri seja retomado nesta quarta, os réus devem começar a ser ouvidos. Apenas quatro dos 26 devem se pronunciar, segundo o Tribunal de Justiça. Os outros devem exercer o direito constitucional de permanecer em silêncio.
Desde o início do julgamento, na segunda-feira (15), 24 dos 26 réus acompanham os trabalhos. Dois deles não puderam comparecer ao júri devido a problemas de saúde. Inicialmente, o julgamento estava previsto para durar duas semanas. No entanto, como parte das 23 testemunhas foi dispensada e a maioria dos policiais não deve se manifestar, a expectativa é que termine ainda nesta semana.
Nesta etapa do julgamento, são julgados 26 dos 79 policiais militares acusados de participar da invasão à Casa de Detenção para conter a rebelião de presos. Os 26 réus respondem em liberdade pela morte de 15 deles no 1º andar do Pavilhão 9. Cento e onze detentos foram mortos.
Segundo dia
Nesta terça-feira (16), foram ouvidas as testemunhas de defesa - dois desembargadores, o ex-governador de São Paulo Luiz Antônio Fleury Filho , o secretário daSegurança Pública à época, Pedro de Franco Campos, e a juíza Sueli Armani, de execuções penais.
Fleury afirmou que a decisão de entrar no presídio foi tomada pelas autoridades presentes no local. Porém, ressaltou que a ordem foi "necessária" e "legítima". O ex-governador disse que estava em Sorocaba no 2 de outubro de 1992, véspera de eleição municipal e data do massacre. Ele conta que chegou às 16h à capital paulista, após a ação policial no Carandiru ter ocorrido.
Apesar de ressaltar que não estava à frente da operação, Fleury disse que ?teria dado? a ordem para invasão caso estivesse em seu gabinete. ?O que aconteceu, o que digo sempre, é que a ordem para entrada foi absolutamente necessária e legítima. Já existiam pessoas que estavam matando umas as outras", disse o ex-governador.
O secretário da Segurança Pública à época, Pedro de Franco Campos, foi ouvido logo após Fleury. Ele também defendeu a operação e afirmou ter autorizado o coronel Ubiratan Guimarães a invadir o presídio.
17:09
A juíza de execuções criminais Sueli Armani relatou as situações de violência encontradas por ela em rebeliões dentro de presídios paulistas.
Primeiro dia
Na segunda-feira, três sobreviventes do massacre, além de um agente carcerário e um perito criminal, afirmaram que tropas da Polícia Militar invadiram o segundo pavimento do Pavilhão 9 e executaram presos. Eles relataram também alteração do local para atrapalhar a perícia e impedir o socorro às vítimas.
O ex-detento Antonio Carlos Dias afirmou que a ação da polícia dentro da penitenciária durou mais de uma hora. "A gente só ouvia barulho de metralhadora", disse. "Passamos por cima dos corpos para chegar ao pátio. Tivemos que escalar os corpos para sair do segundo andar e chegar ao pátio. Se caíssemos sobre os corpos, os PMs atiravam e matavam", declarou.
A segunda testemunha da acusação ouvida foi o ex-detento Marco Antônio de Moura, que cumpria pena de 5 anos e 4 meses por roubo e tentativa de homicídio. Ele afirmou ter se fingido de morto para sobreviver.
"Fiquei no pátio muitas horas deitado. Um policial disse: quem está ferido, erga a mão. Parece que um anjo disse para eu não fazer isso. Quem levantava a mão era levado e nunca mais foi visto", afirmou Moura. "Os policiais diziam: Deus cria, a Rota mata e viva o Choque", segundo o ex-detento.
O agente penitenciário Moacir dos Santos, diretor da divisão de segurança e disciplina, relatou que houve diversos excessos por parte dos PMs. O perito criminal Osvaldo Negrini Neto, que à época trabalhava no Instituto de Criminalística, também foi ouvido. Ele diz que pediu para que o local não fosse mexido, mas o pedido não foi atendido. "Ficou claro para mim que não queriam que fosse feita a perícia", afirmou.