A Polícia Federal deflagrou mais uma fase da Operação Zelotes nesta quarta-feira (26/7) e prendeu o auditor da Receita Federal Eduardo Cerqueira Leite, de São Paulo. Ele foi denunciado nesta segunda (24) pelo Ministério Público Federal (MPF) por crimes praticados junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). As infrações cometidas pelos envolvidos tiveram o propósito de assegurar julgamentos e pareceres administrativos favoráveis ao BankBoston, atualmente Itaú Unibanco, causando prejuízo de mais de R$ 500 milhões aos cofres públicos.
A denúncia detalha o relacionamento firmado e mantido ao longo de nove anos (de 2006 a 2015) pelos envolvidos. O documento especifica o andamento de dois procedimentos administrativos fiscais (PAFs) que tramitaram no tribunal administrativo e outros cinco recursos que passaram apenas pela delegacia da Receita Federal, em São Paulo, local de trabalho de Eduardo Cerqueira Leite.
Considerando apenas os dois casos decididos no Carf, as autuações tributárias renderiam ao fisco um crédito de, aproximadamente, R$ 600 milhões (R$ 597.956.123,57), em valores da época. No entanto, praticamente 70% desse valor foi cancelado pelo conselho. “No total, a intervenção da associação criminosa fez com que R$ 509 milhões fossem exonerados”, pontuam os procuradores na ação.
Benefício milionário Em troca do benefício milionário, a empresa pagou — de acordo com provas reunidas pelos investigadores — vantagens indevidas em forma de propina aos integrantes do esquema. Esses pagamentos foram feitos por meio da contratação da empresa Pagnozzi & Associados Consultoria Empresarial, sob o pretexto de que o escritório faria a defesa administrativa do banco. As investigações revelaram, no entanto, que o escritório fez várias subcontratações, o que permitiu que o dinheiro chegasse aos demais integrantes do esquema.
Documentos apreendidos por ordem judicial mostram que, em sete anos, segundo a denúncia, a empresa de Pagnozzi recebeu R$ 44,9 milhões de um único cliente: o BankBoston. O valor é mais da metade de todo o faturamento registrado em todo o período pelo escritório, que foi de R$ 82 milhões. Já a movimentação financeira registrada na conta pessoal de Pagnozzi saltou de R$ 2,3 milhões em 2006 para R$ 96,9 milhões em 2013.
Na ação, os procuradores citam documentos apreendidos durante as investigações que evidenciam a relação entre o servidor Eduardo Cerqueira com o BankBoston. Em decorrência da função pública, Cerqueira Leite tinha acesso a informações relevantes referentes a processos administrativos e, ao longo do tempo, acumulou experiência sobre os trâmites da fiscalização tributária de instituições financeiras, tornando-se um “valioso ativo” para empresas que quisessem driblar o fisco.
“Ele não hesitou em mercanciar a coisa pública em detrimento dos princípios do órgão que o remunerava, vendendo por propina atos de ofício como o de informar sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária”, descreve um dos trechos da ação penal.
Uma das provas de que a atuação de Eduardo Cerqueira Leite em favor do banco não se limitou aos recursos em andamento no Carf, de acordo com os procuradores, é um despacho dado por ele, de ofício, em uma revisão administrativa solicitada pelo contribuinte. O ato do servidor garantiu o encerramento de um caso em que a instituição financeira sofria uma cobrança do fisco. Apenas neste caso, frisam os procuradores, o potencial prejuízo à União chega a R$ 20 milhões.
Em uma escolha aleatória, foram analisados cinco dos 31 procedimentos que passaram pela Divisão de Orientação e Análise Tributária, setor chefiado por Cerqueira Leite. Em todos, segundo o documento, há indícios de irregularidades e da concessão de benefícios indevidos ao contribuinte.