Após morte de Mãe Stella de Oxóssi, BA cresce casos de intolerância

Último episódio de 2018 foi o ataque à Pedra de Xangô, em Salvador

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Sai ano, entra ano e os casos de ataques a patrimônios religiosos só aumentaram na Bahia. De acordo com a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Bahia (Sepromi), entre 2017 e 2018 houve um aumento de 124% nos crimes de intolerância religiosa cometidos no estado. Já na série histórica dos últimos seis anos, esse crescimento chegou a 2.250%.

Desde que foi criado, em 2013, o Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela já registrou 153 casos de intolerância, 272 de racismo e 57 ocorrências relacionadas ao tema. Do total dos registros de intolerância religiosa, 16 correspondem a ataques a terreiros.

Segundo a coordenadora do órgão, Nairobi Aguiar, o crescimento dos casos se deve ao aumento da intolerância na sociedade e à maior procura pelo órgão. No entanto, para ela, há indícios claros de que muitos casos não são registrados:

“Muita gente não registra as ocorrências porque não acredita nos órgãos da Justiça ou porque tem medo, e aqueles que procuram a delegacia, muitas vezes, registram o caso como invasão de patrimônio. Não entendem que foram vítimas de intolerância religiosa”, explica.

As violações a patrimônios e monumentos religiosos são consideradas casos de discriminação ou preconceito religioso, tipificados na lei 9.459, de 1997, que trata justamente dos crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. 

O defensor público César Ulisses da Costa, da Defensoria Especializada de Direitos Humanos, explicou que o crime viola, inclusive, a Constituição Federal, que prevê a liberdade de culto e a existência de múltiplas religiões. 

Ainda de acordo com o defensor, praticar o crime de intolerância religiosa gera punições penais e cíveis. A responsabilização penal fica a cargo do Ministério Público, sendo necessária a intervenção do ofendido, por meio de representação criminal. Já no caso cível, cabem ações indenizatórias.

Pedra de Xangô foi alvo de intolerância religiosa (Foto: Mauro Akin Nassor)

Pedra de Xangô

Foi exatamente isso o que fez o Grupo de Trabalho Externo de Implantação do Parque em Rede da Pedra de Xangô e da Apa Municipal Vale dos Assis Valente, além de representantes das comunidades de terreiros de Salvador, após o ataque ao monumento religioso na última sexta-feira (28).

A Pedra de Xangô, localizada no bairro de Cajazeiras, foi alvo de ato de vandalismo, quando foram despejados mais de 100 quilos de sal sobre o patrimônio, no dia 29. O ataque foi notqado no sábado e, após uma limpeza com auxílio da Limpurb, outro ataque, com uma quantidade bem menor de sal, voltou a acontecer nesta terça-feira (1º).

Nesta quarta-feira (2) foi protocolada uma petição junto ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), com pedido de providências acerca do crime.

Crimes

Na petição protocolada nesta quarta-feira (2) no Ministério Público foi pedido que, além de crime de intolerância religiosa, o ataque com sal à Pedra de Xangô seja considerado, também, um crime ambiental.

“Além do ato de vandalismo, considerado um crime de agressão a um patrimônio público, houve também um crime ambiental, já que o sal agride o solo e o lençol freático, impedindo que as espécies nasçam (...) A extensão da APA Municipal Vale do Assis Valente e o entorno do patrimônio cultural Pedra de Xangô continuam a sofrer intervenções antrópicas que ameaçam a integridade física”, diz trecho do documento.

A promotora Lívia Vaz afirmou que ainda vai ser levada em consideração na análise da representação o fato de “a Pedra de Xangô ficar situada na área do antigo Quilombo Buraco do Tatu”, tendo, por isso, se tornado “uma grande referência para as religiões de matrizes africanas ao longo do tempo”. 

De acordo com a Sepromi, não são apenas os crimes de intolerância religiosa que preocupam a população baiana. Os registros da secretaria mostram que, entre 2013 e 2018, foram registrados 480 crimes contra liberdades - o que inclui racismo, intolerância religiosa e outros correlatos. 

A agressão à Pedra de Xangô foi recebida com tristeza e indignação por parte do povo de santo.

Maria Alice Pereira da Silva, advogada responsável pela petição entregue ao Ministério Público da Bahia e uma das idealizadoras do portal oficial do monumento religioso, afirmou que, além do risco da repetição de atos de vandalismo como esse, há também o risco de invasões, como já acontece no entorno do monumento.

Segurança

Um dos pedidos feitos ao MP-BA e que vai ser alvo do procedimento é a instalação de câmeras de segurança no entorno da Pedra de Xangô, bem como a intensificação de policiamento no local.

A Polícia Militar da Bahia afirmou em nota que as rondas serão intensificadas na região. “O policiamento ostensivo é realizado diuturnamente pela 3ª CIPM, através de rondas com viaturas. As equipes realizam blitz e abordagens preventivas. As ações policiais contam com o reforço de guarnições da Companhia Independente Tático (CIPT) Rondesp Central e do Pelotão de Emprego Tático Operacional (Peto) da unidade”, declarou.

Mãe Stella de Oxóssi é alvo de intolerância religiosa em redes sociais

Mãe Stella de Oxóssi, que faleceu aos 93 anos no dia 27 de dezembro, vem sendo alvo de intolerância religiosa em posts nas redes socais. Nesta quarta-feira, 2, uma internauta inconformada com a notícia da avenida que recebeu o nome da lalorixá , se manifestou:"Em vez de procurar a Deus, vai procurar fazer macumba para o mal dos outros" disse em um comentário no facebook.

Essa não foi a primeira ofensa proferida, comentários como “menos um macumbeiro”,”tá no inferno uma hora dessas” e “Deus ainda foi bonzinho com essa macumbeira”  também já foram publicados na rede. 

Outras pessoas que viram o ataque criticaram a postura dos intolerantes e fizeram denúncias na rede social. Algumas mensagens já foram apagadas.

O ogã Rimbar Daniel disse que leu com tristeza o comentário  e que o desejo da comunidade do Ilê Axé Opô Afonjá é de que a mulher se retrate. "Procurei o Ministério Público logo que tive acesso aos prints na página do prefeito. Porque é algo muito sério, especialmente em se tratanto de uma personalidade como nossa Stella", comentou.

O modo como a agressora se refere à mãe de santo, segundo Daniel, age como um "acelerador de raiva e serve apenas para criar e disseminar o ódio entre as pessoas. Nós vivemos um momento tão triste e de dificuldade para fazer o enterro, precisamos acionar a Justiça, o que foi péssimo. E agora isso". Ribamar Daniel comentou que falou diretamente com Lívia Vaz, que, segundo ele, está responsável pela apuração do caso. 

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