No Piauí, 25 mil crianças não receberam nenhuma dose da vacina DTP nos últimos três anos, segundo relatório Situação Mundial da Infância 2023: Para cada criança, vacinação (The State of the World’s Children 2023: For Every Child, Vaccination), divulgado nesta quinta-feira (20) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF). Essa situação foi agravada pela interrupção de serviços de saúde durante a pandemia, sistemas de saúde sobrecarregados, falta de recursos e mudanças na percepção sobre a importância das vacinas. No Brasil, o número de crianças sem imunização da vacina conhecida como tríplice bacteriana foi de 1,6 milhão no mesmo período.
A vacina DTP é essencial para prevenir doenças como difteria, tétano e coqueluche. Além disso, o relatório mostra que 24 mil crianças do Piauí também não receberam nenhuma dose da vacina contra a poliomielite, doença que já foi erradicada no Brasil, mas que pode ressurgir caso a vacinação não seja retomada em todo o país.
Em coletiva de imprensa realizada nesta quinta-feira (20), no Auditório da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em Brasília (DF), a ministra da Saúde Nísia Trindade falou que o Brasil viveu um retrocesso na vacinação nos últimos anos e que a sociedade e entidades da saúde têm um grande desafio pela frente.
"Atualmente, o Brasil conta com uma cobertura vacinal das mais baixas de sua história desde a criação do Programa Nacional de Imunizações. Já tivemos 95% de cobertura em relação a vacinas como da poliomielite, e agora não chegamos a 60% de crianças vacinadas. Esse quadro tem que mudar. Para isso, de uma maneira muito clara, temos de combater o negacionismo em relação a essa proteção dada pelas vacinas e às fake news que, infelizmente, têm sido veiculadas de uma forma irresponsável e criminosa”, afirmou.
Para uma criança ser considerada imunizada, ela precisa tomar todas as doses recomendadas de cada imunizante e as doses de reforço, quando indicadas. O relatório global usa como base a tríplice bacteriana (DTP), que conta com três doses. No Brasil, de 2019 a 2021, 1,6 milhão de crianças não tomaram nem a primeira dose (DPT1), e outras 700 mil tomaram a primeira e/ou a segunda dose, mas não tomaram a terceira (DPT3). Isso leva a um total de 2,4 milhões de crianças não imunizadas. Os dados são semelhantes para a vacina contra a pólio, que também conta com três doses. No Brasil, 1,6 milhão de crianças não receberam nem a primeira dose (VIP1) contra a pólio, entre 2019 e 2021.
“Essas crianças foram deixadas para trás, ficando desprotegidas de doenças sérias e evitáveis. As crianças nascidas pouco antes ou durante a pandemia agora estão ultrapassando a idade em que normalmente seriam vacinadas, ressaltando a necessidade de uma ação urgente para alcançar aquelas que perderam as vacinas e prevenir surtos e a volta de doenças já erradicadas no Brasil, como a pólio”, explica Youssouf Abdel-Jelil, representante do UNICEF no Brasil", disse Youssouf Abdel-Jelil, representante do UNICEF no Brasil.
Os números brasileiros fazem parte de um desafio global urgente. Segundo o relatório, o mundo vive o maior retrocesso contínuo na imunização infantil em 30 anos, agravado pela pandemia de covid-19. Entre 2019 e 2021, as coberturas vacinais diminuíram em 112 países.
A pandemia também exacerbou as desigualdades existentes. As crianças que não estão recebendo vacinas vivem nas comunidades mais pobres, remotas e vulneráveis. Nos domicílios mais pobres, uma em cada cinco crianças não receberam nenhuma vacina, enquanto nos mais ricos apenas uma em 20. O relatório identificou, ainda, que crianças não vacinadas vivem frequentemente em comunidades de difícil acesso, tais como zonas rurais ou favelas urbanas.
Percepção sobre importância das vacinas
O relatório Situação Mundial da Infância revela, também, que a percepção sobre a importância e a confiança nas vacinas para crianças diminuiu em 52 dos 55 países pesquisados. No Brasil, embora os índices continuem altos, houve uma queda de 10 pontos percentuais — antes da pandemia, 99,1% dos brasileiros confiavam nas vacinas infantis, e pós-covid-19 são 88,8%.
Diferentemente dos resultados globais, no Brasil, a queda de confiança foi mais acentuada entre homens mais velhos (maiores de 65 anos). Na maioria dos países pesquisados, a queda foi maior entre mulheres e pessoas com menos de 35 anos.