Voluntários são selecionados para escrever cartas a quem não sabe ler

Os casos mais comuns são o envio de correspondências para parentes distantes, familiares presos, políticos e programas de televisão, entre outros

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 Na era da comunicação instantânea, 231 voluntários de São Paulo estão dispostos a ajudar aqueles que não sabem - ou têm dificuldade - para ler e escrever. A missão deles é redigir cartas manualmente para essas pessoas. Os casos mais comuns são o envio de correspondências para parentes distantes, familiares presos, políticos e programas de televisão, entre outros.

Desde que o serviço foi disponilizado, em 2001, mais de 210 mil atendimentos foram realizados. Inspirado na personagem Dora, interpretada por Fernanda Montenegro no filme Central do Brasil, o "Escreve Cartas" funciona em cinco postos do Poupatempo na capital paulista e em três cidades da Grande São Paulo. Em São Paulo, podem ser encontrados em Itaquera e Santo Amaro. Guarulhos, Osasco e São Bernardo do Campo também contam com o serviço.

Com o passar do tempo, os atendimentos para o preenchimento de formulários e a elaboração de currículos também incorporada ao trabalho dos voluntários. Givan Maria Ferreira Leite, 62 anos, é uma das voluntárias do Poupatempo de Santo Amaro.

Conta que chegou ao serviço por meio da irmã e afirma que o serviço é de ajuda mútua. "As pessoas que nos procuram, invariavelmente, atravessam uma situação difícil. A gente acaba se envolvendo um pouco, às vezes até chora com eles", diz. Entre as histórias que ela presenciou está a de um homem que foi até o posto para escrever uma carta para a mulher com a qual vivia. "Ele chegou aqui e contou que a mulher dizia que ele estava muito distante. Então teve a ideia de escrever uma carta carinhosa, explicando que gostava muito dela e prometendo ficar mais próximo. Ele ficou na dúvida se levava a carta ou a postava no correio. Acabamos enviando por correio", diz.

Outra carta que ela considera emocionante foi de uma mãe, de família com dificuldades financeiras, que escreveu uma carta em homenagem ao filho, que acabava de se formar em nutrição. "A carta era para ser lida em uma reunião familiar, que aconteceria naqueles dias. Uma história muito bonita", afirmou. Maurício Alves Araújo é porteiro de um edifício em São Paulo. Aproveitou o serviço para enviar uma carta ao pai, que mora em Ouricuri (PE). Eles não se veem há 13 anos. "Eu estou pensando em ir lá no fim do ano. Nem coloquei isso na carta para não gerar expectativa. Mas se tudo der certo eu vou. O pessoal daqui atende a gente muito bem", diz.

O publicitário Paulo Eduardo Vasques, 64 anos, é outro voluntário do serviço. Afirma que muitas pessoas são frequentadoras usuárias assíduas do serviço. "Tem um senhor que vem aqui sempre e envia cartas para rádios, para governador, prefeito, programas de televisão, pedindo melhoria para o seu bairro. Tanto a televisão como o rádio são a companhia de muita gente. E essas pessoas gostam de se comunicar, de ouvir os seus pedidos de maneira pública", diz. A coordenadora técnica do programa Escreve Cartas do Poupatempo de Santo Amaro, Suely Calasans, diz que este ano serão 88 novas vagas para o serviço. Em Guarulhos, são 50 vagas e as inscrições podem ser feitas pessoalmente ou pelo telefone (11) 2147-8415 até este sábado.

Em setembro, serão disponibilizadas 12 vagas em Santo Amaro e outras 26 em Itaquera. "Para trabalhar conosco é preciso ter mais de 18 anos, boa caligrafia e muita paciência. O bom domínio do português também é indispensável", diz. Segundo ela, o serviço foi adaptado com o passar do tempo. "Começamos apenas escrevendo cartas, mas em virtude da demanda passamos a fazer outros atendimentos, como a elaboração de currículos e o preenchimento de formulários. Muitos dos usuários têm muitas dificuldades para isso." Asilos Os voluntários fazem mensalmente visitas a asilos para a leitura e a redação de cartas. Existem escolas conveniadas em que alunos escrevem para os idosos e os voluntários se dispõem a escrever as respostas. Também são escritas cartas para aqueles que os idosos indicarem.

Nessa linha, a voluntária Shizuko Yamazaki lembra de uma história triste. "Uma senhora ditou uma carta para o filho e fui escrevendo. Pedi o endereço para que a correspondência pudesse ser enviada e a senhora disse que a administração do asilo tinha. Quando fui até lá, descobri o que o filho dela já havia morrido há algum tempo". Entre as histórias curiosas, ela conta que uma mulher foi até o Poupatempo disposta a escrever uma carta à atriz Julia Roberts, de quem se dizia fã. "O problema é que ninguém conseguiu o endereço e ela acabou desistindo", diz.

A voluntária conta que também são comuns os pedido de cartas para o presidente Lula e políticos em geral. "Geralmente essas pessoas escrevem pedindo alguma coisa. Os políticos são os que mais respondem, já que têm equipes para isso". Outra voluntária, Petronilla Cludi Dal Pino, 76 anos, afirma que aderiu ao serviço depois de ir ao Poupatempo resolver um problema com uma concessionária de telefonia. "Fazia bastante tempo que estava querendo fazer um trabalho voluntário. Quando vi isso aqui, não tive dúvidas. É gratificante", diz ela, que se juntou ao grupo há um ano.

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