Um grupo de evangélicos resolveu se dedicar à obra de reconstrução do terreiro de Conceição d’Lissá, em Duque de Caxias (RJ), destruído em 2014 por um incêndio atribuído pelos praticantes de candomblé a fiéis de igrejas evangélicas da região.
O mesmo grupo que tem oferecido mão de obra é o que arrecadou e doou aproximadamente R$ 12 mil para os materiais. Na cerimônia de entrega, a maior das polêmicas no caso até agora: o cantor e pastor Kleber Lucas interpretou – cantando, tocando e dançando – a música Maria, Maria, de Milton Nascimento, famosa na voz de Elis Regina.
Na ocasião, a pastora luterana Lusmarina Campos Garcia, vestida com os trajes litúrgicos da denominação evangélica, também acompanhava o embalo musical. Meses depois ela voltaria aos holofotes por discursar no comício que antecedeu a prisão do ex-presidente Lula (PT), convocando uma espécie de romaria.
“Em nome do Lula nós vamos para todo lugar. Nós vamos lutar, nós vamos continuar. E, se essas pernas não puderem percorrer o país, as nossas vão percorrer por elas”, declarou a pastora luterana. “Se essa voz for impedida, a nossa vai gritar e vai continuar clamando por justiça e por liberdade para o nosso povo mais sofrido. Nós estamos juntos. Lula livre!”, acrescentou.
Agora, Lusmarina surge como a principal entusiasta da obra de reconstrução do barracão. De acordo com informações da BBC Brasil, a pastora e três voluntários se dedicaram pessoalmente a ajduar na remoção de entulhos do segundo andar do terreiro.
“Logo que a gente ouviu sobre a destruição do terreiro, eu pensei: ‘Se em nome de Cristo eles destroem, em nome de Cristo nós vamos reconstruir’. É extremamente importante dar um testemunho positivo da nossa fé, porque o Cristo que está sendo utilizado para destruir um terreiro está sendo completamente mal interpretado”, argumenta Lusmarina.
O discurso que acusa evangélicos de destruir o terreiro, no entanto, não é embasado por evidências, já que quase quatro anos depois, a Polícia ainda não identificou os responsáveis pela destruição do terreiro.
“O arcabouço do que está acontecendo no Rio de Janeiro, em termos de violência religiosa tem como fundo uma lógica de guerra”, afirma a pastora. “Faz parte de um projeto de poder a descaracterização de outros grupos religiosos, ou seja, uma linguagem de desrespeito e condenação. Porque, nesse tipo de concepção, a diversidade não é permitida. É um enfrentamento que precisamos fazer porque é muito mais amplo do que a questão estritamente religiosa. A questão é política. Por isso, a gente precisa se unir”, acrescenta, novamente usando a religião como pano de fundo para a promoção de uma ideologia política.
A mãe de santo responsável pelo terreiro, repercutiu a iniciativa do grupo que se organiza em torno do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) do Rio de Janeiro, dizendo que a doação e a oferta de mão de obra voluntária funcionam como um mea-culpa. “Quando eles vêm dar essa ajuda pra gente, é justamente [uma forma de] reconhecer que, primeiro, a gente sofre o ataque. Depois, é reconhecer que a gente tem o direito de existir e professar o nosso sagrado. Eles não vieram aqui pra me mudar, evangelizar ou dizer que o que eu faço está feio ou é do diabo. Vieram para dizer: ‘Faça aquilo que você crê. Eu vou te ajudar'”, disse Conceição.