?Um morador acaba de denunciar uma boca de fumo próximo ao Morro do Chapadão?, avisa a página no Facebook do ?Brasil Facções RJ?. ?Policiais do Bope realizam operações na Cidade Alta?, comunica outro perfil na rede social, este da ?Equipe Facções War?. Apesar do tom realista, tais informes dizem respeito somente a uma versão virtual da disputa por territórios, no Rio, entre traficantes de grupos rivais e até as próprias forças militares. O campo de batalha são servidores online do modo multiplayer (modalidade em que vários internautas disputam simultaneamente) do famoso jogo ?GTA: San Andreas?, onde milhares de internautas se reúnem para comandar seus personagens em ataques, trocas de tiro e violentos confrontos.
São dezenas de servidores diferentes reproduzindo a geopolítica criminal carioca ? em alguns, há apenas uns poucos gatos pingados; noutros, centenas de pessoas combatem ao mesmo tempo. No maior deles, o ?Thug Life? (?vida de bandido?, em tradução livre), são mais de dez mil cadastrados, oriundos de vários estados do Brasil e até do exterior. A maior parte dos participantes, contudo, vêm da mesma cidade retratada na tela do computador.
E bastante bem retratada, diga-se. Se não seguem localizações exatas ou escalas precisas, os mapas criados pelos jogadores têm, todos, uma preocupação em comum: reproduzir favelas que existem de verdade no Rio.
Além do Chapadão, comunidade da Pavuna, e da Cidade Alta, no bairro de Cordovil, aparecem no jogo o Complexo do Caju, o Morro do Dendê, o Bateau Mouche, a Nova Holanda e o Complexo do Alemão, entre várias outras. E há quem, morando nessas áreas, se veja representado em suas versões virtuais.
? Moro em uma comunidade na qual o tráfico rola solto, mas respeito o trabalho deles. No jogo, é só diversão, mas retrata bem isso ? diz o responsável pelo perfil do servidor ?Fatal Life 2014? no Facebook, pedindo para não ser identificado.
Venda de drogas e até cartaz com ?recompensa?
A tentativa de reproduzir o universo real do crime no Rio vai além das postagens em tom noticioso e do batismo das facções e favelas. Na hierarquia do tráfico virtual, existe patrão, gerente, fogueteiro e vapor. E a venda de drogas está presente em todos os servidores do gênero.
Em um deles, é possível escolher entre a comercialização de cocaína ou maconha. Em outro, a reprodução do ponto de venda ? a ?boca de fumo?, no jargão dos traficantes ? é ainda mais fiel. Em meio a dez avatares (personagem usados pelos internautas) fortemente armados e pacotes de drogas bem embalados, um dos jogadores anuncia a venda de drogas.
O criador de um dos servidores, que escolheu atuar numa facção criminosa, tomou uma medida curiosa: a partir de um modelo usado pelo Disque-Denúncia, criou um cartaz falso em que consta recompensa por sua captura. O detalhe é que o internauta colocou o próprio nome ? o da vida real. Mas também há quem siga o caminho oposto.
? Meu lado é o do bem, sou o líder do Bope ? assegura um jogador do servidor ?Equipe Facções War?.