Pedir uma viagem por aplicativo tem sido uma tarefa complicada. Nos últimos meses passageiros têm relatado dificuldades em conseguir transporte por aplicativo. A resposta para um cenário tão complexo é simples: com combustível batendo na casa dos R$ 7 e custos com a manutenção e aluguel de veículos aumentando a cada mês, a única forma que os motoristas têm encontrado para continuar trabalhando é escolhendo corridas que realmente valham a pena.
Essa foi a explicação dada por duas associações que representam milhares de motoristas de aplicativo em São Paulo e no Rio de Janeiro. Denis Moura, diretor executivo da Associação de Motoristas Particulares Autônomos do Rio de Janeiro (Ampa-RJ), é claro ao dizer que a conta não fecha.
Ele explica que desde que as plataformas começaram a operar no Brasil, não há aumento na tarifa cobrada ao consumidor, sendo que o preço do combustível mais do que dobrou nesses anos. "Não tem como pagarmos mais de R$ 7 em um litro de gasolina, que é o que acontece no Rio de Janeiro, para ganhar apenas R$ 5 em uma corrida. Basta considerar o preço do combustível para entender que a conta não fecha, se contabilizarmos as horas trabalhadas, o desgaste, a manutenção e a depreciação do veículo, fica ainda mais claro. Além de todos os custos, a plataforma ainda fica com 40% a 50% do que o consumidor paga, mesmo que, por contrato, o combinado seja até 25%", expõe.
Bola de neve
Para as associações, está claro que há menos motoristas no mercado. Há alguns meses, a Associação de Motoristas de Aplicativos de São Paulo (Amasp) realiza pesquisas com seus associados para entender quantos ainda estão trabalhando como colaboradores da Uber. Elas apontam que de 30% a 40% dos entrevistados deixaram a plataforma.
"A saída para quem permanece trabalhando como motorista de aplicativo é escolher corridas. Em muitos casos, o motorista tem que percorrer altas quilometragens para chegar até o passageiro, e isso não é pago nem pela plataforma, nem pelo cliente. Esse cenário fez crescer as taxas de cancelamento que, por sua vez, fez com que o Uber cancelasse o cadastro de, pelo menos, 1.600 colaboradores", informa o presidente da Amasp, Eduardo Lima de Souza.
Antônio Francisco Pereira é um dos profissionais que deixaram de trabalhar como motorista de aplicativo. No início da pandemia, ele começou a fazer corridas com seu veículo particular, mas depois de sete meses percebeu que não valia a pena.
"Quando coloquei na ponta do lápis o custo do combustível l e o desgaste do meu veículo, vi que a conta não fechava. Para ganhar R$ 200 em um dia é preciso trabalhar pelo menos 8 horas e contar com a sorte de pegar corridas boas. Desse dinheiro, é preciso abater todo o custo. Fiz as contas e acabei desistindo", explica.
O que dizem as plataformas
Segundo a Uber, foi relatado um aumento acentuado de viagens nos últimos meses. "Com isso, os ganhos de quem dirige com o app da Uber têm sido os maiores desde o início do ano. Nesse sentido, os usuários estão tendo de esperar mais tempo por uma viagem porque, especialmente nos horários de pico, há momentos em que há mais solicitações do que motoristas parceiros disponíveis", informa por meio de nota.
Sobre os cancelamentos, a plataforma afirma que assim como os usuários, os motoristas podem cancelar viagens quando julgarem necessário, mas que o abuso no cancelamento não tem nada a ver com a liberdade do motorista parceiro de recusar solicitações.
"Na Uber, o motorista é totalmente livre para decidir quais solicitações de viagem aceitar e quais recusar. A conexão entre parceiro e usuário - quando nome, modelo e placa do carro são compartilhados e o usuário recebe a confirmação de que o motorista está a caminho - só ocorre depois do motorista ter conferido as informações da solicitação (tempo, distância, destino etc.) e decidido aceitar a realização da viagem", relata a a empresa.
Já a 99 afirmou que, para amenizar o impacto do aumento do combustível na renda mensal dos motoristas, fez um reajuste nos ganhos dos parceiros de 10% a 25%, subsidiado pela companhia, em 20 regiões metropolitanas.
Além disso, a 99 lançou um pacote de ações que prevê, entre outras iniciativas, o repasse integral do valor da corrida aos parceiros em localidades e horários específicos. A 99 informa, ainda, que a plataforma não registrou alteração no número de motoristas cadastrados. No entanto, desde o início da pandemia, vem observando um aumento na demanda por carros de aplicativos.
Como o passageiro pode ajudar
Segundo Denis Moura, uma forma de o passageiro ajudar é entender a relação como uma parceria. "Muitas vezes a gente fica refém do passageiro, que faz reclamações injustas à plataforma. Para eles, uma reclamação pode representar um desconto na corrida, para o motorista, ela pode gerar um banimento. Com isso, o número de profissionais fica cada vez menor e será cada vez mais difícil ter um serviço de qualidade", opina.