Escovar os dentes diariamente após cada refeição, usar fio dental e visitar o dentista regularmente, ao menos uma vez a cada seis meses, estão entre as principais recomendações para manter a boa higiene bucal. Para a criançada há o acréscimo do “não abusar nos doces”.
O alerta é válido, mas, a manutenção de uma boca saudável também envolve orientação nutricional, hábitos alimentares e o uso de produtos, como os enxaguantes bucais.
A ausência desses cuidados pode causar alguns problemas, e o mais comum deles, especialmente entre crianças na faixa etária entre dois e cinco anos, é a cárie.
A má escovação deixa restos de alimentos que, devido à ação de bactérias, fermentam e liberam ácidos que corroem a parte branca do dente, chamada de esmalte. A deterioração do dente é um processo doloroso que inflama a gengiva e causa mau hálito, além da perda do dente.
Quanto mais tempo demora a ser tratada, mais a cárie cresce, até a extração ser inevitável. Para a saúde pública, a cárie é fonte de problemas maiores.
As condições socioeconômicas e os problemas comportamentais favorecem o aparecimento da doença; junta-se a isso a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, problemas na estrutura dos consultórios e a desvalorização dos dentes decíduos, os dentes de leite, devido à crença que são substituídos rapidamente.
O resultado é uma grande onda de remoção de dentes cariados de crianças e uma contribuição negativa à formação dos dentes permanentes assim como ao desenvolvimento da fala.
Portanto, criar métodos alternativos de combate à cárie é essencial para a promoção de saúde em populações carentes. Com esse foco, uma equipe formada por docentes e alunos do curso de odontologia da Universidade Federal do Piauí (UFPI) coordenada pela professora doutora Marcoeli Silva de Moura, está finalizando uma pesquisa que propõe um tratamento sem a necessidade de ir a um consultório.
O Tratamento Restaurador Atraumático (ART, em inglês) é uma técnica que, com uso de instrumentos manuais, remove o tecido cariado e restaura o dente com cimento de ionômero de vidro (CIV).
O produto é comercializado nacionalmente e adquirido em pregões eletrônicos em virtude do menor preço. Testar o melhor CIV para o tratamento foi apenas uma das etapas do trabalho. Em 2014, o estudo avaliou o conhecimento e atitudes de 183 cirurgiões-dentistas da Estratégia Saúde da Família, de Teresina, sobre o ART.
Observou-se que, apesar do bom conhecimento sobre a técnica, a maioria necessitava de aprimoramento para a correta indicação. Em um segundo momento, ocorreu a capacitação desses profissionais.
Para a dentista Patrícia Viana, que participou do treinamento, a experiência foi excelente, já que possibilitou trabalhar de forma mais profunda com a técnica, que havia estudado ainda na graduação.
“Nós [da Estratégia Saúde da Família] temos muita demanda. Atendemos muitas crianças, escolas e creches. Sem dúvida, quando o profissional tem a oportunidade de relembrar ou então de ter o primeiro contato com a técnica, aumenta o leque de possibilidades do tratamento odontológico dos pacientes”, afirma Patrícia Viana.
Mais de 1 mil crianças são examinadas em Teresina
Em junho, foi encerrada a terceira etapa do projeto, a fase da execução das restaurações ART em creches da Prefeitura Municipal de Teresina. Pais e responsáveis foram contatados para prestar informações sobre os comportamentos relacionados à saúde bucal e assinaram autorização para o atendimento.
Ao todo, foram examinadas 1.112 crianças em cinco creches: Vila Bandeirantes, Satélite, Três Andares, Vila da Paz e Planalto Uruguai. Dessas, 38% apresentaram cárie dentária com gravidade de acordo com a progressão de idade.
Cerca de 600 procedimentos foram realizados e em 31% dos casos foi possível concluir o tratamento odontológico sem a necessidade de encaminhamento a um consultório.
O Ministério da Saúde considera o ART um protocolo para atendimentos individualizados extraclínicos, acamados, institucionalizados e de forma universalizada para dentes decíduos com monitoramento.
Uma utilização necessária em locais de alta prevalência de cáries, como Teresina. Segundo a professora Marcoeli Silva, a prefeitura mantém na capital em média 200 consultórios odontológicos que constantemente suspendem o atendimento devido a problemas técnicos.
Para a coordenadora da pesquisa, adotar o ART como alternativa restauradora seria uma solução para os profissionais da atenção básica que seriam multiplicadores em suas zonas de atuação.
"O grande diferencial da técnica é não precisar de um consultório odontológico. Normalmente a criança fica no colo da mãe, do pai. Então ela se sente mais segura, mais confortável do que em uma cadeira, o que favorece o atendimento.
Nós utilizamos um instrumento de corte manual, como se fosse uma colherzinha, que vai limpando o dente. Então não tem aquele barulho, aquela vibração do motor", explica Marcoeli Silva.