Com Brasília repleta de prefeitos endividados que participam da Marcha dos Prefeitos, senadores aprovaram em dois turnos nesta terça-feira (9) uma proposta de emenda à Constituição que permite o repasse de emendas parlamentares diretamente a Estados e municípios sem intermediação do governo federal.
Sob o argumento de desburocratizar a liberação de ajuda para suas bases, o dinheiro de emendas individuais impositivas poderá chegar aos caixas de prefeituras e governos estaduais sem uma destinação específica e sem a fiscalização e o cumprimento de exigências feitas atualmente pela Caixa Econômica Federal e órgãos federais de controle.
A nova legislação permite que a verba seja utilizada para pagamento de pessoal. Além disso, o projeto tira da União a possibilidade de remanejar recursos que eventualmente ficam retidos por falhas nos convênios ou restrições feitas pela Caixa.
— Hoje, nós fazemos as emendas ao Orçamento, elas precisam ser aprovadas, o governo federal pode contingenciar. O governo federal, através da Caixa, faz uma série de exigências de haver convênio para poder destinar aquele recurso. Qualquer filigrana jurídica trava a destinação e a utilização do recurso. O que estamos fazendo é uma ligação direta, sem a Caixa Econômica Federal — explica o relator da proposta, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
A PEC foi aprovada no Senado, em primeiro turno, com 62 votos a favor, 4 contra e 1 abstenção. No segundo turno, foram 62 votos a favor, 3 contra e 1 uma abstenção. A proposta ainda precisa passar pela Câmara.
Apesar de o senador Major Olímpio (PSL-SP), líder do partido do governo, ter votado a favor da emenda, as senadoras do PSL Juíza Selma (MT) e Soraya Thronicke (MS) votaram contra, assim como Eduardo Girão (PODE-CE). O senador Plínio Valério (PSDB-AM), votou contra no primeiro turno e não votou no segundo. O senador José Serra (PSDB-SP) se absteve.
Pelo texto, as emendas de cada parlamentar, que são de pagamento obrigatório, podem chegar a Estados e municípios por doação ou com finalidade de despesa definida.
Na primeira modalidade, os recursos são repassados independentemente da celebração de um convênio e passam a pertencer ao Estado ou município. Ou seja, o prefeito ou o governador pode usar este dinheiro como bem entender, sem que o parlamentar defina uma obra.
Como o texto não faz nenhuma ressalva, o relator entende que este dinheiro pode ser usado no pagamento de despesas com pessoal.
Nos casos de doação, a fiscalização ficará a cargo dos órgãos de controle interno dos Estados e municípios e pelos Tribunais de Contas dos Municípios (TCMs) e Tribunais de Contas dos Estados ( TCEs).
Já quando a transferência se der com finalidade definida, o deputado ou senador estabelece para onde vão os recursos e os gestores municipais e estaduais não podem utilizá-los com folha de pagamento.
Neste caso, a fiscalização será feita pelos órgãos de controle interno federais e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
— O problema é que o recurso de uma emenda é destinado ao município que, às vezes, deixa de cumprir as formalidades, às vezes está com negativações, às vezes a Caixa impõe uma série de restrições. A Caixa, inclusive, cobra valores muito elevados para fazer o monitoramento e o repasse desses recursos. O que esta emenda faz é simplificar esta relação — argumenta o relator.
Governo federal deixará de administrar recursos
Além de perder um instrumento de negociação, o governo federal deixará de administrar recursos que, pela legislação atual, são liberados de acordo com o andamento de cada obra ou programa.
— (A União) Perde um pouco da possibilidade de fazer remanejamento diante de alguma falha de convênio ou alguma obstrução da Caixa Econômica Federal — diz Pacheco.
Em busca de apoio para aprovar a reforma da Previdência, o presidente Jair Bolsonaro havia dito de maneira genérica, no evento com prefeitos pela manhã, que garantiria o repasse de mais recursos da União às cidades.
— Conversei com o Paulo Guedes ontem (segunda-feira, 8). Dei o sinal verdade. Vamos apoiá-los na majoração do fundo de participação dos municípios com uma emenda constitucional — disse Bolsonaro.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse que conversaria com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que a votação na Casa vizinha se desse ainda nesta quarta-feira (10). Maia, no entanto, viajará para Nova York neste mesmo dia.
Opiniões
Senadores que passaram o dia atendendo a prefeitos de seus Estados comemoraram a aprovação da emenda constitucional.
— Esta PEC, sem nenhuma dúvida, é a mão estendida ao pacto federativo. Vossa excelência dá o primeiro grande passo e atende a 5.570 prefeitos que hoje estavam numa marcha com o pires na mão — disse o senador Telmário Mota (PROS-RR).
Houve quem apontasse que a PEC afrouxa a fiscalização.
— Indo diretamente para o município, apenas com o controle do Tribunal de Contas do Estado e do Município, eu acredito - e tirando a Caixa Econômica, que faz um controle, que tem também um trabalho de obras sociais - que não é, no meu modo de entender, em princípio, salutar para a transparência, para a fiscalização correta do dinheiro público que nós nos propomos fazer — disse Eduardo Girão.
— Podemos fazer questionamentos, colocar em dúvida a eficiência da fiscalização sem a presença do Tribunal de Contas da União e da CGU [Controladoria-Geral da União], mas, indiscutivelmente, nós estaremos eliminando burocracia que causa ineficiência administrativa e desperdício do dinheiro público — ponderou Alvaro Dias (PODE-PR).
Outros senadores procuraram rebater as críticas sobre a fiscalização.
— Vamos encaminhar (os recursos) diretamente a quem vai executar as obras. E não assiste verdade que vai facilitar ou vai relaxar a fiscalização. Há fiscalização demais! O dinheiro precisa ir direto para o município — disse Jorginho Mello (PR-SC).