Residência multiprofissional amplia o conceito de saúde na comunidade

Residência multiprofissional amplia o conceito de saúde na comunidade

Residência multiprofissional amplia o conceito de saúde na comunidade | José Alves Filho
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O cenário foge do que está no imaginário de muitas pessoas, sem macas, sem injeções, sem jaleco. Ao pensar em saúde parte da população logo remete às atenções para os hospitais, uma ideia negativa e alimentada pela falta de informação. 

Fugindo desse estereótipo e propondo a prevenção, o Residência Multiprofissional em Saúde da Família e Comunidade (RMSFC) desenvolve uma série de ações em todas as zonas da capital, em um trabalho que foge do senso comum e impõe um viés social à prática acadêmica, uma transformação que objetiva mudanças no seio da sociedade, contribuindo para um Estado melhor.

Atualmente com 16 residentes, o RMSFC já está na quarta edição, os resultados conquistados durante os sete anos de projeto tornam-se imensuráveis ao ser constatada a mudança na forma que a comunidade vislumbra o futuro.

Constituindo modalidade de ensino de pós-graduação lato-sensu, o foco está na qualificação de profissionais de distintas categorias para atuarem com os preceitos organizativos e funcionais do Sistema Único de Saúde - SUS, tendo como princípio básico a prática multiprofissional e interdisciplinar em Saúde da Família, para que estes obtenham competências sociais, políticas, técnicas e humanas para aplicá-las na perspectiva da promoção da saúde.
O histórico da iniciativa destaca a importância para a formação de profissionais gabaritados, ao todo já foram 35.

Entre as vertentes orquestradas pela residência está a territorialização e o diagnóstico de abrangência a cada dois anos. Todo o mapeamento é realizado, de forma que a comunidade possa ser analisada com eficiência e os aspectos a serem trabalhados minuciosamente expostos. 

Essa promoção da saúde da família condiz com os fatores primordiais para o bem-estar da população, angariando iniciativas que planejem e desenvolvam atividades em parceria com a ESF (Estratégia Saúde da Família) ampliando a cobertura da assistência aos moradores dos bairros abarcados pela ação. 

“É uma parceria da Universidade Estadual do Piauí, Governo do Estado do Piauí e Prefeitura de Teresina, conta com o financiamento do Ministério da Saúde e do Ministério da Educação. 

Nós temos hoje 16 residentes, que estão separados nas quatro zonas da cidade, Norte, Leste, Sudeste e Sul. Na zona Sul, por exemplo, atuamos na Vila Costa Rica, Vila da Paz, Parque Rodoviário, ou seja, uma região de extrema vulnerabilidade social”, destaca o professor e coordenador do projeto Vinícius Oliveira.

A escolha dos bairros em cada zona é realizada através de estudos prévios, a conquista da comunidade nem sempre condiz como uma tarefa simples. A realidade dos fatos converge para o passo a passo, os avanços são gradativos, respondendo no fim para uma extrema ligação de cordialidade e confiança entre os participantes e residentes. 

Tudo isso só é possível pela dedicação na construção de um trabalho sério e comprometido. “Nós identificamos alguns grupos que precisavam receber essa atenção, aqui na região do Monte Castelo atuamos dentro da Igreja São Francisco e selecionamos os idosos e os adolescentes para serem atingidos por nossas estratégias”, aponta Oliveira.

Conexão com as lideranças locais é essencial 



Nesse processo de aproximação, a ligação com as lideranças locais se torna um viés preponderante, afinal é necessário destacar as necessidades de cada comunidade, para que as atividades funcionem corretamente e atinjam o objetivo maior. 

O estímulo na participação, principalmente no que envolve grupos mais complicados de serem atingidos, como os adolescentes, parte de atitudes escolhidas com esmero, voltadas para temáticas que norteiam essa faixa, dinamizando o diálogo e tornando as discussões proveitosas tanto no âmbito escolar como familiar.

"O que podemos valorizar antes de mais nada é a adesão da comunidade, antigamente quase não tínhamos procura, então trouxemos para ela um pouco mais de informação, e mostramos que saúde não é só tratamento, não é só depois que se está doente, é também a prevenção, com atividades físicas, atividades recreativas", explica a coordenadora geral do RMSFC Andréa Lima.

A residência também incentiva a continuidade, funciona como um espaço aberto onde todos possam se sentir em casa e encontrem o conforto que necessitam para ampliar seus conhecimentos. 

"Ajuda a mudar a realidade, a perspectiva é de mudança, trabalhamos várias questões, desenvolvendo atividades, no intuito de que essas pessoas possam encontrar bons caminhos", afirma a psicóloga Caroline Barbosa.

Para os beneficiados pelas ações desenvolvidas, é um momento de relaxamento e congregação, além do que aponta para a oportunidade de realizar amizades e desenvolver qualidades que muitas vezes estavam escondidas na falta de oportunidade. "Nunca falto, gosto bastante de praticar as atividades que oferecem", conta Ingrid Maria. A estudante de 13 anos ainda destaca sua preferência. "Adoro fazer dança", afirma.

As possibilidades oferecidas pelo RMSFC são inúmeras, estratégias como a utilização de cartazes na imposição de ideias incentivam os participantes a extravasarem suas opiniões quanto à realidade que os cercam, galgando abrir conversas esclarecedoras sobre estas problemáticas e, obviamente, encontrar caminhos. 

"Trabalhamos com diversas temáticas, drogas, sexualidade, fazendo uma construção, tijolinho por tijolinho e este é o grande valor", define Lima.

Reflexos que surpreendem 

Os números envolvendo as atividades do residência apontam para o comprometimento de todos que fazem sua realização possível. Sendo assim, estima-se que em média 150 pessoas são atendidas por mês em determinado território. Tomando como base esses índices, mais de 32.400 pessoas foram acompanhadas durante os anos de atuação. 

Nesse sentido, pode ser constatada a eficiência do RMSFC. “Em cada ação da residência nós encontramos uma descoberta, contribuindo para que a população se expresse. 

Nós revisitamos a história de Teresina, ajudamos no planejamento, orientamos as pessoas para que lutem por seus direitos, então discutimos diversos assuntos sem algazarra ou tabu,esse link que é feito entre academia e sociedade é a grande contribuição que a residência traz, uma das reclamações é que às vezes as universidades em geral são muito isoladas, preparam seus médicos, doutores e não se envolvem com a sociedade, ou seja, a residência constrói exatamente esse elo”, destaca Vinicius Oliveira.

Fora esses dados estatísticos, outros reflexos já podem ser impostos ao constante acompanhamento desses profissionais da saúde. Entre esses pontos destaca-se a diminuição dos agravos de doenças como diarreia, dengue, tuberculose, hanseníase, AVC, hipertensão e diabetes diminuindo a demanda de procura de atendimentos nos prontos socorros e urgências; além da promoção de qualidade de vida com atividades físicas, grupos de convivência e interação entre vizinhos, fortalecimento das associações de bairro e empoderamento da população; ou seja, o trabalho permeia por campos que anteriormente os moradores sequer imaginavam, são benefícios concretos na vida da região.

As atividades do residência multiprofissional abrangem também o suporte para doentes mentais e usuários de drogas encaminhados a rede e assistência as famílias, tal como a orientação a gestantes e acompanhamento dos bebes, diminuindo intercorrências durante pré-natal, pós-parto e na primeira infância. 

A psicóloga Caroline Ribeiro, que atua há seis meses no projeto, garante que os residentes ganham bastante experiência com o trato de tantas questões. “Aquisição de conhecimento, aliando a teoria a prática. Todos os dias desenvolvemos uma atividade, queremos estar inseridos na comunidade, é exatamente este o objetivo”, explica.

A profissional aponta para os ganhos acadêmicos impostos pelas ações realizadas, o balanço é positivo e vai além do que se propõe, trazendo lições sociais. “A primeira palavra que vem é gratificação, em torno de estar contribuindo, porque na residência queremos conquistar a comunidade, sendo agentes modificadores”, vislumbra.

O sentimento que fica após mais um dia de dedicação é compensador. O envolvimento dos residentes é tamanho, que fica praticamente impossível não conquistar lembranças para toda a vida. “Para mim só tenho a agradecer a Deus pelo trabalho que construímos, fico muito emocionada. 

Convivo com eles pessoalmente, no dia a dia, busco saber dos problemas e ajudar no que posso”, comenta a funcionária pública e coordenadora da ação Lúcia Abreu.

Segundo o professor Vinícius Oliveira, a sensação é de dever cumprido, contudo mantendo sempre a meta de que é necessário continuar com as estratégias para angariar ainda mais conquistas. 

“O objetivo é ter esse residente, esse profissional lidando com pessoas, o que corresponde a prática acadêmica, trabalhando sob uma perspectiva nova de ensino em serviço”, finaliza.

Atividades com os idosos 

Buscando tirar os idosos do marasmo e sedentarismo, a residência insere novas perspectivas a esse público, através da integração e interação em torno da sociedade e da construção de relações comunitárias. 

O objetivo é incluí-los e nunca excluí-los. Com eles trabalhamos em outra perspectiva, com música e com atividades físicas, é uma coisa que mexe muito com idoso, atende às necessidades, além disso os informamos sobre seus direitos, é um trabalho completo. Fora isso, temos parcerias que nos possibilitam oferecer aulas de corte e costura, por exemplo", detalha Oliveira.

O coordenador do projeto sintetiza a felicidade e satisfação dos participantes nessa faixa etária e garante que a taxa de permanência é muito alto, ou seja, aqueles que começar dificilmente desistem. 

Desse modo, é criada uma verdadeira família, que compartilha de bons momentos diariamente e se divertem juntos. Essa constatação pode ser feita observando o sorriso de cada um dos integrantes. "Aqui é muito bom, se dependesse de mim teria até mais", diz a pensionista Evangelina de Souza. 

Com 64 anos de idade, a idosa se diverte com as atividades de dança e música, além das companhias que encontra no residência multiprofissional. "Fiz muitas amizades aqui, é sempre muita alegria, só fiquei um tempo sem frequentar pois tive que realizar uma cirurgia, porém a saudade era grande", afirma.

Souza elenca o que aprendeu no projeto e já vislumbra o futuro. "Gosto bastante de aprender e aqui tive conhecimentos em relação ao artesanato, bordado e o que for oferecido quero participar", enfatiza.

Com esse carinho, o trabalho encontra sua compensação, o residência multiprofissional prova que atividades preventivas podem mudar o panorama da saúde no Estado. 

Absorvendo atitudes imprescindível para melhorias constantes, o sonho é oferecer além de uma melhor qualidade de vida e bem-estar, uma certa conscientização para a relevância dessas ações. As mudanças podem começar na simplicidade, as respostas muitas vezes estão em processos fáceis, basta dar o pontapé inicial.




 

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