?Homens superiores exigem tudo de si; e homens inferiores exigem tudo dos outros!? Esta frase, do filósofo e pensador chinês Confúcio, que nasceu há 551 anos antes de Cristo, estampada em um mural do Senac, no centro de Teresina, no distante ano de 2002, mudou a vida de Maria Auxiliadora Silva Miranda, a Dorinha, secretária do Sinpaf. ?Essa frase despertou em mim o gosto por pensamentos filosóficos?, lembra.
Encantada com o pensamento que acabara de ler, ela passou a olhar o mundo com uma visão de quem deve compartilhar o saber. A partir daquele dia Dorinha Miranda mergulhou em livros e na internet à procura de frases e pensamentos filosóficos interessantes. Ela conta: ?Como existiam poucas redes sociais na internet, eu decidi criar uma, usando um muro próximo à minha casa. Foi aí que eu tive a ideia de copiar as frases e compartilhá-las?.
A ?mulher das frases?, como é conhecida agora no Conjunto União, no bairro Memorare, na zona Norte de Teresina, onde mora com um irmão, cunhada e dois sobrinhos, não perdeu tempo. Comprou tinta e pincel, e, nos finais de semana e feriados, passou a transcrever os mais variados pensamentos em quase um quilômetro de muro entre as Ruas José Marques da Rocha e Barras. Hoje, são mais de 300 escritos entre frases bíblicas, trechos de poemas musicais e pensamentos filosóficos.
Ela conta que quando começou a copiar as frases no muro, que isola uma grande área pertencente à Congregação das Irmãs dos Pobres da Santa Catarina de Sena, recebia muitas críticas. ?Tinha gente que dizia: se fosse no meu muro eu não deixava?, lembra, sorrindo. Na verdade, as pessoas viam o trabalho de divulgação dela como uma simples pichação. Mas hoje a rede social criada no muro de concreto recebe elogios da comunidade e é uma referência para quem visita o bairro.
?Achei a ideia dela genial. É uma maneira de educar e evangelizar?, aplaude Maria das Graças Borges, moradora há 27 anos no bairro. Ela acha que Dorinha Miranda é uma ?mulher corajosa? por ter enfrentado as freiras, donas do terreno, que não queriam as frases escritas no muro. Maria das Graças vê hoje o muro - antes um paredão que lembrava o isolamento de um presídio ? como ?um espaço de autoajuda? para os moradores e as pessoas que circulam pela área.
A vitrine cultural a céu aberto, que começou a ser construída há 11 anos, tem um admirador de primeira hora. É o professor Pedro Aurélio, de 50 anos, mas com cara e corpo 30. Morador da Rua Amarante, esquina com a Rua José Marques da Rocha, onde tudo começou, ele só tem elogios: ?A Dora era criticada por algumas pessoas, mas levou à frente a missão e hoje o muro deixou de ser aquela coisa árida. Tem agora uma função cultural?.
Pedro Aurélio tem lastro para falar da ação de Dorinha Miranda. Ele é de uma linhagem que tem origem nas letras. É neto de Benedito Aurélio de Freitas, o Baurélio Mangabeira, escritor, ex-juiz de Direito e um dos fundadores da Academia Piauiense de Letras. O professor do Ensino Fundamental e Médio das redes pública e privada de ensino tem prazer em dizer onde mora. ?Minha casa fica bem perto daquele espaço cultural, no bairro Memorare?, exalta.
A saga da criadora da primeira rede social em um muro de concreto que se tem notícia no Piauí continua. O trabalho segue agora no prolongamento do mesmo muro, na Rua José Marques da Rocha, só que pertencente a uma empresa distribuidora de gás de cozinha. Dorinha Miranda é evangélica, tem 46 anos de idade e 22 de trabalho no Sinpaf - Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuária, em Teresina. Ela nasceu no município de Parnaíba, e passou a morar em Teresina com sete anos de idade.