Em meio as incertezas, a luz. Os sorrisos brotam com o colorido, o quarto monocromático é deixado de lado, ao mesmo tempo que renasce a esperança. Um novo gás, uma nova força se constrói, e em volta do castelo se faz viva a maior expectativa, a alegria cessa a dor e alimenta o coração de paz. Afugentando o choro, deixando-os prontos para o combate. A intensidade da batalha causa temor, mas não é maior do que a teia de amor indissolúvel. Furtada pelo câncer, a infância lhes é devolvida nas mais simples brincadeiras; vitória para a qual não cabem explicações e reúne todos em uma rede.
Fundada em 86, a Rede Feminina de Combate ao Câncer é uma entidade filantrópica sem fins lucrativos, que objetiva a luta contra a doença, inserindo atividades lúdicas, unificadas, de modo a atingir os pacientes com o otimismo e a força de vontade passada gesto após gesto. Abusando da criatividade e trazendo vida ao ambiente hospitalar, a ação trabalha o âmbito psicológico do corpo, preparando para as duras intervenções medicamentosas e cirúrgicas, galgando a transformação de uma fase tão difícil em apenas mais uma etapa a ser percorrida. Montada por um grupo de voluntárias engloba desde o suporte necessário para o tratamento até o fornecimento de fraldas e alimentos para aqueles que não possuem condições de adquiri-los. Sem qualquer pretensão financeira, a mística da RFCC se reflete nos olhares de agradecimento. Quando a emoção toma conta não há como controlar, as lágrimas escorrem de felicidade, o encontro de colaboração se concretiza, as famílias já não estão sozinhas.
Há cerca de 15 anos na entidade, a recreadora Silvane Silva já não consegue mais deixar de realizar o trabalho social, encontra na ação o arcabouço para mudar a realidade. “A ideia da RFCC é nacional, mas cada Estado desenvolve os seus próprios projetos, aqui observamos bastante a necessidade dos pacientes e procuramos envolvê-los nas atividades”, comenta. Atualmente, 70 voluntárias estão cadastradas e comparecem frequentemente, mas ainda existe as pessoas que sequer estão inseridas na lista e resolvem comparecer na instituição e doar tempo, carinho, em prol do fortalecimento da causa. “Eles surgem repentinamente e começam a contribuir, todos são sempre muito bem-vindos”, aponta.
Silva reitera ainda que há um curso preparatório específico. “Existe essa capacitação para os voluntários, é algo muito importante para difundir as informações sobre o funcionamento da rede”, impõe. O passo a passo da iniciativa nem sempre é fácil, conviver com os pacientes e acompanhar o desgaste do tratamento exige um alto grau de determinação. “No princípio eu saía arrasada daqui, hoje já é o contrário. Temos que ver que o câncer não é como antigamente, hoje em dia temos muitos casos de cura. Antigamente, eu também chegava e perguntava sobre a doença, hoje em dia vejo que isso não é bom. Quando eles vêm para cá querem esquecer de tudo, fugir do quarto, da internação, é um momento de alívio”, conta a dentista Karoline Falcão, voluntária há 4 anos.
A ajuda no fim, não é apenas para os pacientes e a família, se difunde e atinge o infinito. “Sabemos que é um tratamento muito sofrido, buscamos ajudar, mas no final acabamos ajudando a nós mesmos, passamos a ver a vida de uma forma diferente”, constata Falcão. Uma vez por semana ela comparece na sede da instituição. “Fico ansiosa para que chegue logo o momento para vir”, diz.
A dedicação rompe fronteiras. “Somos uma família, acompanhamos diariamente cada caso, essas pessoas vão fazendo parte da nossa vida, ficamos anos e anos acompanhando. São como entes queridos”, afirma Silvane Silva.
Apesar de satisfatório, existem momentos difíceis, administrá-los exige força interior. “A gente é tão íntimo que chora junto com as mães; é um trabalho recíproco”, dinamiza.
No fim dos opostos são colocados frente a frente, uma hora eles vão embora, ou a tristeza é suplantada ou a alegria transborda. “Alguns ficam três, quatro anos e não conseguem evoluir no tratamento, acabam nos deixando, isso parte nosso coração, já outros vão embora porque ficaram curados e não sabemos mais notícias”, finaliza a recreadora.
O carinho das mães
Imersas no acompanhamento dos filhos, as mães sofrem e comemoram junto, unem-se numa corrente de amor e nunca fogem da luta. No leito, não saem do lado da cama, permanecem despertas, fortes, com o sonho do dia em que a tristeza chegará ao fim. A Rede Feminina de Combate ao Câncer funciona como um alento e “estende a mão” nesse difícil processo. “Não sei o que seria da gente sem eles, o clima do hospital é muito ruim e aqui esquecemos de tudo”, sintetiza a dona de casa Nayara Soares.
Mãe de Luís Felipe Andrade, de 6 anos, ela relata que sofreu demasiadamente após descobrir que o filho tinha leucemia. O diagnóstico aconteceu quando o menino tinha 3 anos de idade, desde então nada foi igual. “Quando conheci o trabalho da rede, foi um grande alívio, estava desesperada, me sentia só, com a ajuda desse trabalho passei a ter apoio”, detalha. Essa sensação percorre todos os âmbitos. “Eles contribuem com tudo, até mesmo a conseguir a medicação”, impõe.
Luís se sente melhor com a animação trazida pelo grupo e não deixa de participar de nenhuma atividade. “O que eu mais gosto é das brincadeiras”, limita. E ainda comenta: “Tenho até minha ‘tia’ preferida”, destaca.
Doação de fraldas e leite
A entidade sobrevive com a contribuição dos cidadãos teresinenses, na lista de iniciativas está também a distribuição de leite e fraldas. “Apenas em uma unidade foram 2.604 pacotes de leite distribuídos e 1.804 unidades de fraldas (incluindo os pacientes adultos e os da ala infantil)”, conta a auxiliar administrativa Sandra Sousa. A manutenção desses serviços encontra complicações, por isso a doação se faz essencial. “É um aprendizado, você cria uma ligação com os pacientes, é totalmente relevante essa construção; é um ambiente de acolhimento e precisamos estar unidos”, relata.
A lição de vida dada com os sentimentos transmitidos no projeto reaviva a importância do apoio, não importa qual seja o tamanho dele, com o pouco se constrói uma ação louvável, indescritível. “É uma escola, aprendemos a ser solidários, a dar valor às coisas, às vezes reclamamos por tão pouco”, relembra a recreadora Silvane Silva. Os quadros desenhados ao apogeu das atividades recobrem o cenário de festa e positividade. “O lanche que é servido aqui na RFCC é o mesmo que servem nos quartos do hospital, mas lá muitos não comem, já com tudo que armamos, tal como as brincadeiras, abre o apetite deles, muda emocionalmente”, finaliza.
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