A reação repentina da recepcionista Andrea Nery de Santana foi pular a janela assim que a van em que viajava, envolvida em um acidente com dez mortes, parou na pista da BR-324 na manhã desta terça-feira (3). Ela estava no lado esquedo, o mesmo do motorista, na poltrona do meio, cuja janela partiu com impacto da batida, segundo o seu relato. Ela sofreu pequenos arronhões no cotovelo e na perna, consequência do contato que teve com o asfalto.
"A minha janela foi a única que estourou. Foi tudo muito rápido. Pulei a janela, peguei meu celular e comecei a ligar para o Samu. Só pensei em dar socorro, ali só tinha a gente. Eu sozinha na pista e os corpos lá, no chão", afirma a sobrevivente. O acidente ocorreu pouco antes das 5h, no km-591, perto da cidade de Candeias. Todos os mortos e feridos estavam na van, entre eles, passageiros e motorista. Eles tinha saído da cidade de Saubara, no recôncavo da Bahia.
De acordo com Andrea Nery, os passageiros viajavam todo início de dia comercial para trabalhar na capital baiana. Ela não acredita que o motorista tenha dormido ao volante e propiciado a batida. "Conhecia de vista todo mundo. Eram trabalhadores, que vinham com ele [motorista] há mais de cinco anos. Ele era muito responsável, a gente não tinha medo, todo mundo vinha dormindo, porque conhecia ele há muito tempo. É super responsável, tem mais de 15 anos de profissão, viaja para fora do país", afirma sobre o motorista. Além dela, outro passageiro, Antônio Ramos, não sofreu ferimentos graves.
Para a Polícia Rodoviária Federal (PRF), o motorista da van, que está internado em Salvador, deve ter dormido ao volante. Segundo o órgão, a conclusão foi obtida por meio de informações iniciais e embasada no fato de que a van transportava passageitos, a carreta que seguia à frente mantinha a velocidade compatível com a permitida na pista e porque foi encontrado cerca de R$ 900 em notas trocadas com o motorista. A quantia, segundo o órgão, demonstra que ele trabalhou durante toda a madrugada pós-feriado 2 de Julho, que é de âmbito estadual e celebra a independência do Brasil na Bahia. A PRF explica que a van bateu no fundo da carreta, depois na lateral, perdendo a estabilidade, tombando e parando embaixo do veículo.
De acordo com a Agerba, órgão estadual que regula e fiscaliza os transportes, a van não possuía licença para realizar transporte, configurando clandestinidade. Segundo o diretor executivo do órgão, Eduardo Pessoa, o proprietário do veículo solicitou vistoria junto à Agerba em setembro de 2011, mas a realização do procedimento foi negada porque a van não possuía requisitos para circular.
A perícia foi realizada por equipes da Polícia Civil da cidade de Candeias. A reportagem não tem conseguido contato com a unidade policial.
Desespero de mãe
A mãe de uma das vítimas foi até o local do acidente muito emocionada. Ela se indentificou para os policiais e abraçou o corpo do filho, que ainda estava ao chão, perto do acostamento. "O meu filho, moço... Quando o rapaz disse que uma van tinha batido e eu já estava sentindo uma agonia e eu gritei é meu filho, é meu filho, não pode gente, não pode uma mãe enterrar um filho, meu filho podia me enterrar, mas eu vou enterrar meu filho! Um filho só, minha gente, tava me ajudando, tinha sonhos... Ele tinha sonhos", lamentou.
Situação dos feridos
Três das quatro pessoas que foram socorridas para o Hospital Geral do Estado (HGE) continuam internadas. Um está em estado grave e passa por cirurgia ortopédica. Dois têm estado estável, em observação, mas passarão por avaliação ortopédica e neurológica. Já dois outros feridos estão no Hospital do Subúrbio, também em Salvador, ambos em estado grave.
Mortos
Dez pessoas morreram no acidente. Apenas um ainda não foi identificado pelo Departamento de Polícia Técnica, que se refere à quarta pessoa encaminhada para o HGE e que morreu ainda na unidade de saúde. De acordo com o DPT, familiares retiraram os corpos de três das vítimas, que foram levadas para as cidades de Terra Nova, Santo Amaro e Saubara. Uma criança de 12 anos que morreu no acidente estava sem documentação e teve o corpo reconhecido pelo pai, que se apresentou no local. Apenas uma das vítimas identificadas é do sexo feminino; os demais são do masculino.
Carreta
O motorista da carreta, que não sofreu ferimentos, falou sobre o acidente: "Eu vinha na velocidade certa, na minha mão, ele chegou correndo demais e eu vi só o impacto na minha traseira, ai não vi mais nada, quando vi ele foi para a contramão, voltou e bateu na lateral da carreta. Não sei o que aconteceu, não sei se ele dormiu, se passou mal. Ele bateu, veio na esquerda, e voltou de novo, ai ele agarrou, ai eu já estava lá fora da pista quando ele agarrou e foi o tempo de eu acabar de parar. Ai já não vi mais nada, minhas vistas escureceram, fiquei nervoso", diz o condutor Valdeci Luís da Cunha, que saiu do Recife (PE), com o veículo carregado de ferro, em direção ao município baiano de Simões Filho.
O carreteiro Verivaldo Diniz testemunhou o momento do acidente. "Tava em frente ao posto quando a van chocou no fundo na carreta e a gente ouviu um bocado de pedaço de lata voando no chão quando eu atravessei a pista para o lado de cá e tinha um bocado de corpos no chão, gente gemendo. Os dois estavam em movimento. A carreta quis tirar de alguma coisa e ele veio e chocou no fundo", conta Verivaldo Diniz, carreteiro. A colisão gerou congestionamento que passou dos 10km na BR-324, no sentido Salvador.