Quase 5 anos depois, acusados de matar Bernardo são julgados no RS

Há quase cinco anos, o corpo de Bernardo Boldrini, que na época tinha 11 anos, foi encontrado enterrado em uma cova rasa, envolto em um saco plástico. O pai e a madrasta do menino estão entre os acusados de terem cometido o crime.

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Com cerca de 24 mil habitantes, o município de Três Passos, a 471 quilômetros de Porto Alegre, está agitado e cheio de visitantes, diferente do que costumam ser as localidades pacatas do interior do Rio Grande do Sul. Em uma das entradas da cidade, um outdoor dá pistas do motivo: "Bernardo, eles te calaram. Agora nós somos a sua voz. Justiça".

A partir desta segunda-feira (11), os quatro acusados de terem matado o menino Bernardo Boldrini, que na época tinha 11 anos, vão ser julgados. Entres os réus, estão o pai e a madrasta da criança, Leandro Boldrini e Graciele Ugulini. Respondem também pelo crime os irmãos Edelvânia e Evandro Wirganovicz. A previsão é de que o julgamento dure uma semana, e o G1 Rio Grande do Sul fará a transmissão ao vivo do julgamento.

Na manhã de domingo (10), o movimento ainda estava calmo pelas ruas da cidade, com muitos estabelecimentos fechados. Mas alguns moradores e comerciantes afirmam que, de forma geral, o fluxo de pessoas aumentou no município desde sexta-feira (8).

Em uma farmácia na Avenida Júlio de Castilhos, que atravessa o Centro de Três Passos, funcionárias perceberam a chegada de pessoas de fora da cidade.

"Desde sexta já estava cheio de repórteres na frente dos hotéis. Nós percebemos que estão chegando pessoas diferentes, que não são daqui da cidade. Muitas delas vêm na farmácia pedir informação. Agora há pouco veio um homem perguntar onde fica o fórum. Eu já achei que era um repórter, mas ele me respondeu que é um oficial de Justiça, que veio lá de Rio Grande", conta a farmacêutica Cristiane Rozin.

Na mesma avenida, a três quadras da farmácia, fica o fórum onde será realizado o julgamento. Do outro lado da rua, mais um cartaz pedindo justiça pela morte de Bernardo está pendurado em uma cerca.

Outra via que se tornou conhecida na cidade é a Gaspar Silveira Martins. Nesta rua, fica a casa onde Bernardo morava com o pai, a madrasta e a irmã. Após quase cinco anos, cartazes ainda são colados em frente a residência por pessoas vindas de diferentes lugares do Brasil.

Em um deles, uma mulher que se denomina Vovó Zizi, envia uma mensagem de carinho do Rio Grande do Norte: "Pequeno príncipe, sempre em nossos corações".

Hotéis da região também confirmam o aumento no número de visitantes na cidade. Os que ficam localizados em Três Passos estão lotados há semanas. Segundo o proprietário de um deles, em dezembro já estavam sendo feitas reservas devido ao julgamento. A situação se repete em cidade próximas, como Tenente Portela, que fica a cerca de 30 km de Três Passos.

Jurados e testemunhas também ficarão hospedados em hotéis, sem acesso a aparelho telefônico, internet, televisão, rádio ou jornal, durante todo o período do julgamento. Eles só poderão se comunicar com os 15 oficiais de Justiça, que têm a função de garantir e atestar a incomunicabilidade.

O 7° Batalhão da Polícia Militar informou que receberá apoio do efetivo do Batalhão de Polícia de Choque de Santa Maria, que realizará o controle de trânsito e saturação do policiamento ostensivo em torno do fórum da cidade. A BM acrescentou que, durante os dias do julgamento, a calçada em frente e na lateral do prédio será isolada.

A Brigada acrescentou que será proibida a aglomeração de pessoas no local. Além disso, não será permitida a colocação de caixas e veículos de som, para evitar a perturbação dos trabalhos, conforme pedido do Poder Judiciário.

Relembre o caso

Morador de Três Passos, Bernardo Uglione Boldrini desapareceu no dia 4 de abril de 2014. Ele foi encontrado morto 10 dias depois, em uma cova vertical nas margens de um riacho, em Frederico Westphalen. Laudos periciais atestaram a presença de Midazolam no estômago, rim e fígado do menino. A superdosagem do medicamento teria sido a causa da morte da criança.

No dia do desaparecimento de Bernardo, Graciele foi multada por excesso de velocidade na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente Portela e Palmitinho. A mulher trafegava a 117 km/h e seguia em direção a Frederico Westphalen, que fica a cerca de 80 km de distância de Três Passos. O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que ela estava acompanhada de Bernardo.

Segundo a denúncia do Ministério Público, Graciele conduziu o enteado até Frederico Westphalen. Ao iniciar a viagem, ainda em Três Passos, ministrou-lhe, via oral, a substância midazolam, sob o argumento de que era preciso evitar enjoos. Em seguida, já na cidade vizinha, Graciele encontrou a amiga Edelvânia Wirganovicz.

Conforme ainda o MP, Graciele, com apoio moral e material de Edelvânia, aplicou em Bernardo mais uma injeção intravenosa da substância midazolam, em quantidade suficiente para lhe causar a morte.

A denúncia do Ministério Público ainda apontou que o pai atuou como mentor do crime, juntamente com Graciele. Segundo o MP, interceptações telefônicas (ouça os áudios) e laudos periciais comprovam.

De acordo com a denúncia, Evandro Wirganovicz foi o responsável por fazer a cova vertical, além de limpar o entorno do local, dois dias antes da morte de Bernardo, para facilitar o crime.

Os réus Leandro Boldrini, Graciele Ugulini, Edelvânia e Evandro Wirganovicz respondem por homicídio qualificado e ocultação de cadáver. Leandro ainda responde por falsidade ideológica.

Conforme o MP, em um vídeo, gravado no celular de Leandro, Graciele ameaça Bernardo, dizendo: “Eu não tenho nada a perder, Bernardo. Tu não sabe do que eu sou capaz. Eu prefiro apodrecer na cadeia a viver nesta casa contigo incomodando”.

O processo que apura o crime tem cerca de 9 mil páginas, distribuídas em 44 volumes. Na fase de instrução processual, foram ouvidas 25 testemunhas arroladas pela acusação, 29 indicadas pelas defesas e os quatro réus.

Bernardo morava com o pai, a madrasta e a filha do casal, à época com cerca de um ano, em uma casa em Três Passos. A mãe do menino, Odilaine, foi encontrada morta dentro da clínica do então marido em fevereiro de 2010. À época, a polícia concluiu que ela cometeu suicídio com um revólver. A defesa da mãe dela, Jussara Uglione, contestou a versão. O inquérito foi reaberto. Concluído em março de 2016, a nova investigação não apontou indícios de homicídio. Para a polícia, Odilaine se matou.

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