Dentre os vários questionamentos levantados pelo movimento gay, um está relacionado ao termo homossexualismo, que é combatido veementemente pelos ativistas, devido o sufixo ?ismo?, geralmente usado para designar doenças.
O projeto de lei aprovado pela Comissão dos Direitos Humanos da Câmara Federal, na terça (18), torna homossexualidade (termo adequado) uma patologia, permitindo que seja tratada por psicólogos. Este projeto de lei quer suspender os artigos 3º e 4º da Resolução nº 1/99 do Conselho Federal de Psicologia.
Estes artigos abordam a atuação do psicólogo a respeito da questão da orientação sexual. Eles determinam que psicólogos não podem exercer nenhuma ação de patologização diante de comportamentos e práticas homossexuais, não devendo propor terapias de cura, nem se pronunciando de modo a reforçar os preconceitos existentes.
O motivo para sustar estes artigos é de que o Conselho Federal de Psicologia estaria restringindo o trabalho dos profissionais, limitando também o direito da pessoa homossexual receber outra orientação sexual.
No entanto, os argumentos contrários apontam a forte ligação com a bancada evangélica, cujo proselitismo teria fundamentado esta aprovação com razões morais e religiosas, desprezando garantias constitucionais e critérios científicos.
A autoria do projeto é do deputado João Campos (PSDB-GO), e foi aprovado sob a presidência do deputado e pastor Marco Feliciano na Comissão de Direitos Humanos. Ambos da frente parlamentar evangélica.
Segundo o pastor Domingos Machado, a interpretação da mídia e das pessoas está equivocada. ?O projeto não diz que homossexualismo é doença.
O projeto simplesmente oferece uma alternativa às pessoas que não aceitam sua homossexualidade.? De acordo com ele, não se trata de uma doença, mas de uma opção, um comportamento adquirido e influenciado pela sociedade e pela mídia pluralista.
Domingos reforça que o preconceito não é algo inerente da igreja e das religiões, mas sim da sociedade. ?A palavra de Deus não dá o direito de excluir ninguém. Isso não é uma postura cristã?, diz.
Considerada uma incoerência, este projeto arregimentou uma série de posicionamentos contrários. O professor doutor em Ciências Sociais da UFPI, Fabiano Gontijo, analisa que os religiosos têm direito de se expressar, mas não o de dissuadir e reprimir. ?Infelizmente as religiões, às vezes, naturalizam arbitrariedades. E quando as arbitrariedades oprimem dentro de um determinado contexto histórico, nós temos a missão de denunciá-las?, observa.
Para o professor a argumentação dos religiosos se baseia numa pseudociência que tenta usurpar várias áreas do conhecimento como a biologia, psicologia, direito, mas que no fundo é baseada apenas no conhecimento bíblico.
"Eles querem fortalecer os seus líderes"
O psicólogo Dênis Carvalho identifica que projeto envolve questões bastante complexas, no que diz respeito à autonomia dos profissionais de psicologia em autorregularem sua profissão.
Um outro ponto apresentado é o fato de os grupos religiosos usarem a mídia para promover suas crenças através da inferiorização do outro. "Eles querem fortalecer seus líderes inventando inimigos", declara.
Ele declara que não é possível classificar a homossexualidade como problema mental porque não expressa nenhum quadro clínico que apresente a degradação das funções cognitivas, afetivas, intelectuais e morais.
O psicólogo ressalta que não existe uma característica específica dos gays que se configure como sintoma patológico. Dênis crê no bom senso da categoria e dos legisladores, advertindo que esta proposta não se fortalecerá.
Coadunando com essa postura, a presidente da Comissão da Diversidade Sexual da OAB/PI, Anna Vitória de Alcântara, também acredita que este projeto não vai se transformar em lei. Ela declara que ele ainda passará por outras instâncias legislativas, como a Comissão de Constituição e Justiça.
Segundo a advogada, nestas comissões a influência da bancada evangélica não é forte e portanto é muito provável que não vire lei. Além disso, ela afirma que a OAB está se mobilizando para combater este dispositivo.
Anna Vitória acrescenta que a atual Resolução do Conselho não tolhe os direitos dos psicólogos de exercerem a profissão, pois não os proíbem de clinicar, apenas esclarece que não existe nenhuma razão para se tratar a homossexualidade, tendo em vista que não é uma doença.
Ela enfatiza ainda que não cabe ao legislativo interferir numa questão que diz respeito ao Conselho Profissional. "O Conselho de Psicologia é plenamente competente para estabelecer uma patologia psicológica. O legislador não possui conhecimento técnico necessário para definir isso", destaca.