Atualmente, o Brasil presencia importantes movimentos sobre a compreensão da sexualidade de gêneros. Nos meios de comunicação ou em rodas de conversa, o tema é pertinente e gera discussões de ambos os lados. No entanto, as dúvidas ainda permanecem. Por isso, as pesquisas acadêmicas, através do Grupo de Pesquisa em Sexualidades, Corpo e Gênero (Sexgen) da Universidade Federal do Piauí (Ufpi), levam à sociedade formas de percepção de caráter humano.
As pesquisas relacionadas à sexualidade são postas em questão, pois nas últimas semanas, dentre vários acontecimentos mundiais, as redes sociais noticiaram sobre Viviany Beleboni, a transexual que “Encenou o sofrimento de Jesus Cristo” ou, para alguns comentários mais calorosos, “Difamou a imagem de Jesus”.
Nesse contexto, o Sexgen, grupo interdisciplinar que agrega pesquisadores de várias áreas acadêmicas, procura abordar reflexões acerca da sexualidade, corpo e gênero, através do caráter antropológico. Dessa forma, estudam como os temas são discutidos na escola e família. Além disso, trabalham a humanização do parto como direito da mulher, pois a mesma é um membro importante para sociedade.
De acordo com Daiany Caroline Santos, membro do Sexgen e mestre em Antropologia, o grupo procura dialogar questões sobre como a cultura se realiza através do gênero e vice e verça. “O grupo debate sobre os enfrentamentos que algumas sofrem, além de abordar questões políticas que não estão dissociadas a cultura, como também abordamos assuntos relacionados a situação da mulher e transexuais, visto como fatores sociais”, diz.
Mulheres devem ter direitos sexuais respeitados
A mulher também é representada através da pesquisa de doutorado baseado no Movimento de Humanização do Parto e do Nascimento (MHPN). Clarissa Carvalho, doutoranda em Comunicação e membro do Sexgen utiliza em sua pesquisa as discussões sobre os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, tendo o Brasil campeão mundial de cesárea.
Assim, busca entender a construção cultural da gravidez e parto, além de fundamentos das reivindicações das mesmas. Também, procura verificar a forma como o imaginário social sobre gravidez e parto foi construído e como se organizou no sistema obstétrico do país.
“Minhas pesquisas centram-se principalmente em ‘maternidades’ (gravidez, parto, maternagem, direitos reprodutivos, etc.). No entanto, existem questionamentos sobre o que é uma mulher? Um ser humano que nasceu com vagina, útero, ovários e depois desenvolveu seios ou um ser humano que reconhece a si mesmo como mulher? A categoria gênero nos ajuda a entender essas questões que são, obviamente, políticas e remetem aos direitos das mulheres trans, que sim, são mulheres”, avalia.
Manifestações a favor da diversidade ganham força
Era manhã de domingo (7) e centenas de pessoas chegavam à 19ª Parada do Orgulho LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) em São Paulo. Diante de uma multidão de cerca de 20 mil pessoas, segundo a Polícia Militar, surge uma figura emblemática. Viviany Beleboni, atriz, 26 anos, transexual. Ela choca os mais conservadores, pois aparece presa a cruz, encenando o sofrimento de Jesus com os dizeres, “Basta, Homofobia GLBT”.
Pouco tempo depois da entrada de Viviany, não se falava em outra coisa. A atriz simulou o sacrifício de Jesus, porém acabou sendo “crucificada” pela mídia. O exemplo é apenas mais um dentre tantos presenciados.
A reprodução de Cristo crucificado por uma transexual é um reflexo da atual liberdade de manifestações. No entanto, mesmo a sociedade contanto com a presença de cidadãos homossexuais desde os primórdios, somente agora possuem mais espaços nos meios de comunicação.
E a que se deu esse espaço? Pois mesmo com maior liberdade, algumas empresas são presididas por líderes religiosos, que seguem regras e padrões. Além disso, a sociedade ainda vive um mundo imagético, ou seja, as instituições se apropriam de imagens simbólicas que os representam.
“Vivemos em um mundo onde remetemos determinadas lembranças e elas habitam na mente das pessoas. A encenação tocou em um ponto que acredito ser sucesso para o movimento, pois fez com que as pessoas se ressentissem de algo que elas tinham dominado durante muito tempo.
Agora, o fator midiático abriu as portas mostrando o homossexual como homens e mulheres que se casam, tem filhos e que contribuem com a sociedade”, avalia a pesquisadora Daiany Caroline O mesmo acredita a pesquisadora Clarissa Carvalho. “Acredito que essas manifestações vêm ganhando força porque os diversos grupos minoritários estão buscando a equivalência de direitos e participação nos espaços públicos. Há uma visibilidade maior de fenômenos que sempre existiram, o que é fantástico”, finaliza.
Um limite sobre o que os homens podem fazer
As Ciências Sociais se fazem presentes a fim de levar formas de educação. Dessa maneira, os estudos levam para a universidade como para prática (escola, família), a reflexão e enfrentamento dos preconceitos.
Através da dissertação de mestrado intitulada “Significações a Respeito da Masculinidade entre Jovens Gays da Cidade de Teresina: Fatores Reguladores da Sexualidade”, Daiany Caroline estudou linhas de pesquisa sobre sexualidade e corpo. Com isso, observou como os sujeitos se entendem como homens. “Fui procurar entender como eles vivem numa sociedade que os entende como pessoas divergentes, e eles como se inserem nesse contexto tradicionalista. Na nossa sociedade existe a questão da duplicidade, uma espécie de complexidade que desenha um limite sobre o que os homens podem fazer”, explica.
Além disso, a pesquisadora teve como objeto de pesquisa uma transexual. Com isso, descobriu que a violência está inserida além dos sintomas físicos (espancamento ou morte). “Ela também está no simples olhar estranho, que confunde os termos masculino ou feminino. Acontece que muitas pessoas se sentem competentes para falar sobre adversidade sexual, porém isso não é ensinado na escola. Por conta disso, existe uma gama de violência”, afirma.