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'Não aguentava mais a escola', diz mãe de aluna internada após racismo

O Colégio Mackenzie publicou uma nota no site informando que prestou suporte para a aluna e segue dando acolhimento

'Não aguentava mais a escola', diz mãe de aluna internada após racismo | Foto: Divulgação/Colégio Presbiteriano Mackenzie
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A mãe da aluna de 15 anos que foi encontrada desacordada no Colégio Mackenzie (SP), contou ao UOL que a filha segue internada em um hospital psiquiátrico após o ocorrido. A profissional de educação física diz que a adolescente, bolsista na escola, relatava episódios frequentes de racismo, mas que eram ignorados pelos profissionais da instituição. 

O Colégio Mackenzie publicou uma nota no site informando que prestou suporte para a aluna e segue dando acolhimento. A Polícia Civil registrou ocorrência e investiga o caso. Abaixo, leia seu relato.

'Ela dizia que não aguentava mais'

"Na terça-feira [29 de abril], a escola me ligou de manhã para avisar que minha filha tinha sido encontrada desmaiada no banheiro, e que teria tentado tirar a própria vida. Quando a encontrei, ela só dizia que não aguentava mais aquela escola.


Mas ela já vinha relatando casos de racismo dentro da escola desde maio de 2024. Ela chegava em casa chorando, dizia que não tinha amigos e era excluída. Quando a avó ia buscá-la, os outros alunos tiravam sarro dela, com xingamentos racistas.

As notas começaram a cair. Na antiga escola, ela sempre tirava 8 ou 9. No Mackenzie, ela não conseguia progredir nas aulas, as notas estavam mais baixas, com 1, 2 e 5. Pensei que isso era resultado de ser uma aluna nova.

No fim de 2024, ela reprovou de ano e, como era bolsista, teria de sair de escola. Mas fui atrás, escrevi uma carta e recorri da decisão. Entrei em contato com a escola, contei tudo o que ela estava sofrendo, o racismo — além de ser um ambiente novo para ela — e pedi uma nova oportunidade.

A coordenadora me chamou até a escola e disse que a situação não estava acontecendo, que era coisa da cabeça da minha filha, e eu cheguei a desacreditar dela. Isso é muito triste. Mas ela continuou no colégio.

Ela reclamava de outras meninas que a perseguiram dentro da escola, mas ninguém acreditava nela, incluindo os próprios funcionários da escola. Eles diziam que ela deveria agradecer por poder estudar ali. Uma das coordenadoras chegou a expor uma situação no meio da sala de aula dizendo para ela parar com 'mimimi' e 'síndrome de perseguição'.

Tenho outros dois filhos na escola, um de 7 anos e outro de 13. O mais velho já foi chamado de 'macaco', mas ele conseguiu responder e não mexeram mais com ele. Agora, com a minha filha, a situação foi pior.

'Só quero minha filha de volta'

Ainda tentei colocá-la em um psicólogo no Mackenzie, já que as faculdades geralmente oferecem, mas não consegui a vaga, e ninguém do colégio fez algo para ajudar de alguma forma.

Depois do ocorrido, minha filha foi levada para a Santa Casa e a escola não deu suporte nenhum. Só na segunda-feira [5], nos ligaram para saber como ela estava, e nada mais.

Só com a história indo para a mídia é que me procuraram, mas não consegui responder. Estou cansada, fisicamente e mentalmente.

Desde o dia 29, fico 24 horas com minha filha, não saio do lado dela. Moro no Butantã e o hospital para onde ela foi transferida fica muito distante de casa.

Sou uma mãe solo, tenho três filhos e moro sozinha. Tenho três empregos para dar conta. Só quero minha filha de volta, ela tinha muitos sonhos. Quero ela de volta.

Vamos entrar com uma ação contra a escola e, além disso, pedir que eles continuem pagando a bolsa, mas em outro colégio, até ela se formar na faculdade. Estamos pesquisando escolas que tenham letramento racial, com professores e alunos negros."

Entenda o caso

A estudante bolsista foi encontrada por uma colega e socorrida. Inicialmente, foi levada à Santa Casa de Misericórdia na manhã de 29 de abril e, depois, transferida para outra unidade hospitalar. Seu estado de saúde é estável, mas ela continua internada sob cuidados psiquiátricos. 

A Polícia Civil investiga o caso como possível tentativa de suicídio e já registrou a ocorrência. O celular da adolescente será periciado nos próximos dias.

Segundo depoimento da mãe à polícia, a jovem era alvo de ataques racistas, sendo chamada de "cigarro queimado" e "lésbica preta" por cinco colegas do Colégio Mackenzie. A família afirma ter denunciado o racismo à escola em 2024 e buscado apoio psicológico na instituição, mas não foi atendida por falta de vagas. “Nenhuma medida foi tomada”, declarou a advogada Réa Sylvia, que representa a família.

A adolescente teria sido chantageada após ser forçada a beijar um colega no banheiro da escola, em um episódio supostamente filmado por outros estudantes, que ameaçavam divulgar o vídeo nas redes sociais. No entanto, a Polícia Civil ainda não obteve acesso às imagens e tomou conhecimento do caso por meio de mensagens da vítima no WhatsApp. 

Colégio diz que prestou ajuda e segue dando acolhimento. Em nota, o Colégio Mackenzie informa que a estudante recebeu atendimento médico no dia 29 de abril e que a direção e a coordenação acolheram a mãe presencialmente minutos após o ocorrido e, nos dias seguintes, seguiram acompanhando a situação de perto. "A equipe de orientação educacional e a psicóloga escolar —que já acompanhavam a aluna e sua família— seguem prestando suporte com cuidado, escuta e responsabilidade. Assim, o contato e o apoio à família têm sido contínuos". 

"O Mackenzie está apurando cuidadosamente as circunstâncias do ocorrido, com seriedade e zelo, ouvindo todos os envolvidos no tempo e nas condições adequadas, inclusive a aluna, assim que estiver pronta para se manifestar no ambiente pedagógico."

Procure ajuda

Caso você tenha pensamentos suicidas, procure ajuda especializada como o CVV (www.cvv.org.br) e os Caps (Centros de Atenção Psicossocial) da sua cidade. O CVV funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados) pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil.

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