Uma apresentação de mágica em uma festa de aniversário, na Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio, se tornou um show de horror para os convidados, e para uma família em especial. Contratado pela aniversariante, que completava 50 anos, o mágico Rodrigo Valadares aparece na filmagem da festa agredindo verbalmente um menino de 6 anos, na frente de toda a plateia ? composta também por pelo menos outras cinco crianças, entre elas, a irmã dele, de 2 anos. O caso foi registrado na 37ª DP (Ilha) e está sendo investigado pela polícia.
Rodrigo Valadares não retornou as ligações até a última atualização desta reportagem. Em uma das chamadas, uma mulher ? que se identificou como Aline ? disse que o mágico estava reunido com advogados e que daria o recado a ele.
Além de registrar a ocorrência na delegacia, a madrasta da criança, Tathiane Cristine Pereira Passos, de 31 anos, publicou o vídeo de 2?34? na web (assista no YouTube) no dia 11 de abril e o compartilhou em redes sociais. Menos de uma semana de exposição na internet foi o suficiente para que os 12 segundos de descontrole do mágico resultassem em mais de 250 comentários de pessoas chocadas com a atitude de Rodrigo Valadares. Até terça-feira (15), o vídeo teve mais de 13,5 mil visualizações.
?Você nunca vai imaginar que num show de mágica alguém vá fazer isso com o seu filho. Porque nós convivemos há quatro anos e ele é como um filho para mim. Eu fiquei revoltada. Toda nossa família está abalada?, disse a organizadora de eventos.
Gritos e palavrões
No vídeo, o mágico Valadares pede a uma mulher da plateia que o ajude em um truque com cartas, que ele chama de ?premonição?. A jovem levanta e vai até o mágico, que prossegue com o show.
Em 2?13?, o menino de 6 anos, que está na plateia, tenta pegar a irmã de dois anos. Incomodado com o ?barulho? causado pelas crianças, o mágico dispara dois palavrões. Depois, ele se aproxima do menino, demonstrando irritação, e grita no ouvido da criança outro palavrão, seguido de: ?Moleque! Senta aí!?. Assustado, o menino reage, respondendo: ?Ela é minha irmã, seu bobo!?. Enquanto o menino sai, o mágico sorri e diz para o público: ?Psicologia infantil! Sempre funciona?.
Enquanto algumas pessoas riem, é possível ouvir a voz de um homem reclamando da atitude do mágico, que responde ironicamente: ?Me processa, parceiro. Fica à vontade. Não tô nem aí? (sic).
Caso veio à tona dois meses depois
O evento aconteceu no dia 2 de fevereiro em uma casa de festas na Ilha, mas Tathiane e o marido, pai das crianças, souberam das agressões apenas dois meses depois, quando tiveram acesso a um trecho da filmagem da festa.
?Tinha dois ambientes na festa. Nossa família estava num ambiente e o show de mágica acontecia no outro, mas as crianças pediram para ver a apresentação. Deixei as crianças lá, sentadinhas, e não vimos o que aconteceu. Só soubemos que algo de errado havia acontecido, quando a irmã do mágico veio me pedir desculpas pelo comportamento dele?, contou Tathiane, acrescentando que a mãe do mágico ? que era a anfitriã da festa ? também se desculpou com a família através de uma rede social.
Com as imagens em mãos, a família, que mora em Olaria, no Súburbio, procurou a 22ª DP (Penha). No entanto, o caso foi remetido à delegacia da área onde ocorreu: a 37ª DP (Ilha). O registro foi feito com base no artigo 232 do Estatuto da Criança e do Adolescente: ?Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento?. A pena prevista é de seis meses a dois anos de detenção.
?Ele grita palavrões, não pode tratar uma criança assim. Tem que respeitar. É um constrangimento à criança e ele vai responder pela infração a esse artigo do ECA porque eu vou remeter o caso à Justiça?, afirmou o titular da 37ª DP (Ilha), José Otílio Bezerra.
Família vai entrar na Justiça
A mãe do menino, Camila Marques, contou que, desde o dia da festa, ele se recusa a falar sobre o que aconteceu. Ela é advogada e afirmou que pretende processar Rodrigo Valadares também na área cível.
?A atitude desse mágico foi descabida. Ele vive disso [mágica] e não merece. É uma humilhação para a criança, um trauma, e ele, certamente, já deve ter feito isso outras vezes. Não queremos dinheiro, mas que ele nunca mais faça isso com ninguém?, disse Camila, acrescentando que, ainda nesta semana, deve entrar com uma ação indenizatória.
Não foi a primeira vez
O Sated-RJ (Sindicato de Artistas e Técnicos de Espetáculos do Rio de Janeiro) informou que já havia recebido uma reclamação, em outubro de 2012, em relação ao comportamento de Rodrigo Valadares. Segundo a entidade, o mágico foi contratado para animar uma festa e a madrinha da aniversariante relatou ter sido alvo de piadas de mau gosto feitas por ele.
Ainda segundo o sindicato, Rodrigo Valadares teve o registro profissional concedido em 2007, depois de uma ex-diretora da entidade atestar sua capacidade ? processo considerado normal, já que, nestes casos, os artistas precisam passar por testes de habilidade.
No entanto, de acordo com o sindicato, ele não poderia estar exercendo a função desde 2009, quando foi desligado dos quadros do Sated-RJ por estar inadimplente com a contribuição sindical. Depois de assistir ao vídeo, a pedido do G1, o presidente da entidade, Jorge Coutinho, lamentou o fato e disse que o mágico terá o registro cassado.
?É lamentável esse caso. Nós fazemos um apelo para que, numa situação como essa, as pessoas não só denunciem à polícia, mas também ao sindicato para que tenhamos conhecimento. Vamos consultar o jurídico e cassar o registro desse mágico porque ele não pode fazer uma coisa dessas e não representa a categoria?, disse o ator.
Shows para crianças
Em sua página a internet, Rodrigo Valadares diz que faz shows para adultos, crianças e empresas, levando a arte da mágica para que as pessoas ?acreditem em seus sonhos?. No último parágrafo de sua apresentação pessoal, diz o texto: ?Com isso, o mágico Valadares tem se destacado no mercado onde atua, pois acredita que trabalhando com seriedade, dignidade e responsabilidade os caminhos que levam aos objetivos finais se encurtarão?.
O presidente do Círculo Brasileiro de Ilusionismo, Mauro Cataldi, confirmou que Valadares recebeu certificado da entidade, mas não comentou o caso porque disse que ainda não tinha visto o vídeo.
O ator e mágico profissional, Nizo Neto, filho do humorista Chico Anysio, foi diretor do Círculo Brasileiro de Ilusionismo por dois anos e considerou o caso ?absurdo?. ?O público é sagrado e deve ser tratado com o maior respeito. Nada justifica essa atitude com uma criança. O comportamento foi totalmente inapropriado, absurdo.?