O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou neste domingo (7) que vai participar da decisão sobre a compra da Warner Bros. Discovery pela Netflix, em um negócio estimado em mais de US$ 70 bilhões.
Segundo a agência Reuters, ao responder perguntas de repórteres, o republicano declarou que o acordo envolve uma parcela significativa do mercado de entretenimento. "Isso pode ser um problema", disse.
A negociação foi anunciada na última sexta-feira (5) e desencadeou uma onda imediata de reações em Hollywood e entre órgãos reguladores.
Mesmo antes do anúncio oficial, a possibilidade de aquisição já era alvo de críticas de sindicatos, rivais, cineastas e políticos nos Estados Unidos e na Europa, especialmente desde que cresceram os rumores de que a plataforma de streaming avançaria sobre um dos estúdios mais tradicionais do país.
Grupos trabalhistas afirmam que a consolidação coloca empregos e salários em risco, enquanto concorrentes alertam para um possível domínio sem precedentes no streaming. Cineastas e exibidores temem impactos diretos na produção e na sobrevivência das salas de cinema.
A operação ainda enfrentará um processo regulatório longo e complexo, com alertas de autoridades dos dois maiores partidos americanos sobre potenciais efeitos anticompetitivos.
Especialistas, no entanto, divergem: parte vê riscos logísticos e possibilidade de destruição de valor; outros acreditam que a compra pode levar a Netflix a um novo patamar ao incorporar um dos maiores catálogos do setor.
As reações ao acordo
A indústria
Cineastas proeminentes manifestaram forte preocupação com o futuro das salas de cinema após o anúncio.
James Cameron: Criador de “Avatar” e “Titanic”, classificou a aquisição como um "desastre" em entrevista ao podcast The Town. Ele criticou a postura do co-CEO da Netflix, Ted Sarandos, que já considerou a exibição teatral uma “ideia obsoleta”. Para Cameron, a promessa da Netflix de manter lançamentos cinematográficos é “isca para otário”, caso se limite a exibições restritas apenas para qualificação ao Oscar.
Kleber Mendonça Filho: Diretor de “O agente secreto”, representante brasileiro ao Oscar 2026, defendeu a experiência cinematográfica no X. "O streaming é uma nova e espetacular forma de ver filmes, mas o streaming não pode ter o poder de acabar com a cultura da sala de cinema. São os cinemas que constroem o caráter e a história de um filme", escreveu.
Produtores: Segundo a revista Variety, produtores de Hollywood enviaram um e-mail ao Congresso pedindo intervenção, temendo que a Netflix "seguraria uma forca ao redor do mercado cinematográfico". O lobby foi organizado por nomes de peso da indústria.
Exibidores: O Unic, grupo que representa exibidores europeus, afirmou à Hollywood Reporter que o acordo representa um “risco duplo”, com menos filmes produzidos e ainda menos lançados nas salas.
Grupos trabalhistas
Os sindicatos de Hollywood também se posicionaram contra a aquisição, apontando impacto negativo direto sobre trabalhadores.
WGA (Sindicato dos Roteiristas): Disse que a fusão "deve ser bloqueada", alegando que eliminaria empregos, reduziria salários, pioraria condições de trabalho, elevaria preços para consumidores e diminuiria diversidade de conteúdo.
DGA (Sindicato dos Diretores): Expressou "preocupações significativas" e destacou que uma indústria competitiva é essencial para proteger carreiras e direitos criativos.
PGA (Sindicato dos Produtores): Afirmou estar "certamente preocupado" com a transferência de um estúdio tão histórico e pediu garantias de que trabalhadores e consumidores não serão prejudicados.
Governo e órgãos reguladores
A proposta deve enfrentar uma longa batalha regulatória.
Governo dos EUA: Um alto funcionário disse à CNBC que a administração Trump vê o acordo de US$ 72 bilhões com "forte ceticismo".
Senador Mike Lee (Republicano): Presidente da subcomissão antitruste, declarou que o negócio "levantaria sérias questões sobre competição", talvez mais que qualquer outro em uma década.
Senadora Elizabeth Warren (Democrata): Chamou a fusão de "pesadelo antimonopólio", afirmando que criaria uma gigante com quase metade do mercado de streaming, resultando em preços mais altos e menos opções.
Reguladores da União Europeia: Segundo o Deadline, especialistas consideram improvável o bloqueio total da operação, mas esperam uma investigação longa. Entre as possíveis exigências: manter contratos atuais de licenciamento ou até vender a HBO Max.
Concorrência
A Paramount, antes cotada como principal candidata à compra, criticou duramente o acordo.
Em carta enviada à Warner, advogados do estúdio — agora sob controle de David Ellison — disseram que a fusão "consolidará e estenderá o domínio global da Netflix", o que violaria leis de concorrência dos EUA.
A Paramount calcula que a nova empresa teria 43% dos assinantes globais de streaming, tornando o acordo “presumivelmente ilegal”.
Especialistas
Segundo o Deadline, analistas divergem sobre o impacto final.
François Godard, da Enders Analysis, destacou riscos logísticos e lembrou que a fusão entre Warner e Discovery já destruiu valor. Ele também questionou se a HBO sobreviveria sob o comando da Netflix.
Guy Bisson, da Ampere Analysis, avaliou que o movimento é "grande notícia, mas não inesperada", afirmando que a aquisição faz sentido estratégico por entregar à Netflix um conjunto de propriedades intelectuais que levariam décadas para ser construído.