A história de Leyla Asherova, mantida como escrava em uma loja de Moscou por mais de dez anos e forçada a entregar sua filha, ilustra como imigrantes de países como Uzbequistão e Cazaquistão podem sofrer na Rússia. Ela é uma das 11 imigrantes que trabalhavam em condições de escravidão em um mercado da capital russa e que foram liberadas por ativistas de organizações que combatem o tráfico de pessoas.
Leyla chegou a Moscou há uma década, quando ainda tinha 16 anos, para trabalhar como balconista de uma loja em dos subúrbios do leste da cidade, acreditando tratar-se de uma boa oportunidade. Mas ela jamais foi paga pelos serviços.
"Quando eu cheguei, logo no primeiro dia, eles levaram meu passaporte. Aí percebi que a dona da loja estava espancando uma das meninas. Ela puxava o cabelo e chutava a garota com muita força. Foi quando eu me dei conta de que tinha vindo parar no lugar errado", conta.
Rotina de escravidão
Ela relembra que era forçada a trabalhar durante muitas horas seguidas, com pouca alimentação, e sempre temendo ser alvo de violência. "A dona da loja me batia muito. Uma vez ela me espancou por mais de duas horas sem parar. Eu ainda tenho marcas nas pernas, no corpo e no rosto. Ela me bateu até mesmo quando eu estava grávida", diz.
Leyla está grávida novamente, após dar à luz duas crianças no cativeiro. Uma delas, o menino Bakhyr, 6 anos, está com ela no abrigo em que os imigrantes resgatados estão morando provisoriamente.
A segunda, Diana, que teria cinco anos, foi tirada da mãe à força. Mais tarde Leyla ficou sabendo que a menina teria morrido ao cair de uma varanda, mas ela não tem certeza sobre a veracidade da história.
"Quando ela (a dona da loja) me contou que minha filha estava morta, fiquei completamente paralisada.
Não senti pânico ou qualquer outra emoção, só pensei que precisava fazer alguma coisa para garantir que ela não ficasse impune por isso".
Leyla diz que o pai das crianças pertence à família da dona da loja. Ela não usou a palavra estupro, mas relatou que o homem a espancava com muita frequência.
Ela foi libertada quando um grupo de ativistas invadiu o mercado e encontrou muitas pessoas dormindo nos fundos da loja. A maioria nunca tinha recebido permissão para cruzar a porta de entrada do estabelecimento.
Polícia e subornos
Leyla conta que pedir para algum cliente da loja ligar para a polícia seria inútil, já que a dona do mercado oferecia subornos regulares a diversas autoridades e policiais. Ela diz que os policiais costumavam devolver à dona da loja todas as meninas que tentavam fugir.
Ao tentar reportar o caso ao Comitê de Investigação russo, órgão semelhante à Polícia Federal no Brasil, ela recebeu como retorno uma tentativa de prisão por imigração ilegal, mas após uma longa negociação, ativistas conseguiram libertá-la mais uma vez.
As investigações sobre o período de dez anos em que foi mantida como escrava foram encerradas, mesmo sem avançar e sem incluir a prisão de nenhum dos acusados.