Com a renúncia do Papa Bento XVI, que passou a valer a partir de 20h desta quinta-feira (28), 16h no horário de Brasília, a Igreja Católia fica sem um líder, no período conhecido como Sé Vacante. Esse intervalo termina com a eleição do novo pontífice pelo Colégio de Cardeais, o conclave, que ainda não tem data marcada.
Bento XVI, de 85 anos, anunciou surpreendentemente ao mundo, em 11 de fevereiro, que renunciaria. Ontem, o alemão deixou o Vaticano de helicóptero em direção a Castel Gandolfo, residência papal de verão, que fica a 30 quilômetros da Santa Sé, onde disse que não é mais pontífice, "mas um simples peregrino encerrando seu caminho nesta terra".
Ele vai passar as próximas semanas no local, enquanto o conclave escolhe seu sucessor, e em aproximadamente dois meses voltará ao Vaticano para levar vida contemplativa em um mosteiro.
De acordo com especialistas em Vaticano, entre a efetivação da renúncia e o início da votação dos cardeais há um grande movimento interno no Vaticano para decidir detalhes sobre o conclave, além de uma articulação velada para debater o destino dos votos.
Nesta sexta (1º), no primeiro dia de Bento XVI como Papa Emérito, o cardeal Angelo Sodano, decano do Colégio Cardinalício, enviará formalmente a convocação para que cardeais sigam até Roma para o conclave. Feito isso, os cardeais já podem começar a se reunir para refletir sobre a votação. A previsão é de que 115 cardeais participem da sucessão ? aptos a votar e a receber votos.
Dom Geraldo Majella Agnelo, cardeal arcebispo emérito de Salvador, disse que na próxima segunda-feira (4), às 9h30 (13h30, horário de Brasília), acontecerá a primeira reunião do Colégio de Cardeais para decidir detalhes sobre o conclave.
A grande dúvida, segundo ele, é saber se a votação será adiantada, possibilidade que se tornou viável após alteração do Código Canônico feita por Bento XVI, na última segunda (25) possibilitando que os cardeais possam iniciar o conclave antes do prazo anteriormente estipulado para escolha do novo Papa, de 15 dias após a morte ou renúncia de um pontífice.
De acordo com o cardeal Dom Raymundo Damasceno, de 76 anos, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e arcebispo de Aparecida (SP), as reuniões pré-conclave podem ser encontros "de 2 dias, 3 dias, 4 dias", com sessões "na parte da manhã e durante a tarde".
"Os próprios cardeais decidirão a quantidade dessas congregações gerais (...). Oficialmente, seremos convocados amanhã [sexta-feira], por correspondência que será enviada ao local de cada um dos cardeais para lermos e vermos quais serão as orientações que serão nos dada nesse momento do pré-conclave e, talvez, já com informações para o conclave", explicou Dom Damasceno.
Segundo Domingos Zamagna, mestre em ciências bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, até a escolha do novo Papa todos os oficiais responsáveis por dicastérios (ministérios e congregações da Igreja) ficam impedidos de exercer suas funções. Apenas tarefas simples poderão ter continuação.
No entanto, quatro funções importantes permanecem no poder durante a ausência do líder da Igreja Católica: o camerlengo, que vai presidir o conselho de cardeais antes do conclave e a reunião que vai escolher o novo pontífice; o penitenciário-mor, responsável pelo Tribunal da Penitenciária Apostólica, que cuida do perdão a casos graves; o cardeal vigário-geral para a diocese de Roma, que atua na administração da Igreja na região de Roma; e o cardeal arcipreste da Basílica de São Pedro e vigário geral de Sua Santidade pela Cidade do Vaticano, responsável pelas necessidades espirituais da Cidade do Vaticano.
De acordo com o Frei Evaldo Xavier Gomes, consultor jurídico-canônico da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a residência papal e o escritório que era utilizado por Bento XVI são lacrados até a escolha do novo Papa.
"As janelas dos aposentos, que ficam abertas constantemente para a Praça de São Pedro, permanecem fechadas. Ninguém pode sentar no Trono de São Pedro [que fica na Basílica de São Pedro] durante a Sé Vacante", explicou.
O religioso disse ainda que são mantidos ritos e celebrações da Igreja que acontecem no tempo da Quaresma ? atual período litúrgico, que antecede a Semana Santa. Mas há uma alteração que deve ser realizada por todos os sacerdotes nas missas.
Durante a Oração Eucarística, rito onde, para os cristãos católicos, o pão e o vinho se tornam o Corpo e Sangue de Jesus Cristo, não se pronuncia o nome do Papa. "É a única coisa que altera durante esse período e é uma forma dos católicos perceberem que a Igreja está em um processo de transição", esclareceu o frei.