Ao longo dos últimos 30 dias, e num ritmo cada vez mais acelerado, a guerra no Oriente Médio tem deixado um rastro de destruição expressivo naquele que é seu principal cenário: Gaza. A faixa de terra adjacente a Israel e banhada pelo mar Mediterrâneo já era marcada por habitações em grande medida precárias, baixo acesso a suprimentos e grande densidade populacional --6.000 pessoas por quilômetro quadrado--, fruto de sua enxuta área e de sua grande população (2,1 milhões). Agora, é também um território de guerra.
O primeiro mês do conflito para o qual ainda não há vislumbre de um fim deixou, até esta segunda-feira (6), mais de 10 mil palestinos mortos na região, reconhecida como um território palestino ocupado. Outros 1,5 milhão (ou mais de 60% da população) tiveram de deixar suas casas. E 260 mil habitações foram parcial ou completamente destruídas.
Todos os números têm origem no Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas. Agora tida como um grupo terrorista por boa parte da comunidade internacional após os brutais ataques de 7 de outubro no sul de Israel, a facção é, também, um partido --que em 2006 chegou a ser referendado nas urnas para governar.
Organismos como as Nações Unidas, na ausência da capacidade imediata de checar os números em campo, dada a frequência dos bombardeios, usam os números das autoridades locais. E, frente às críticas internacionais, notadamente as de Tel Aviv, que descredibiliza as cifras, a pasta da Saúde passou a informar, em seus últimos relatórios, que as estatísticas dos escritórios em Gaza têm sido supervisionadas pelo Ministério da Saúde em Ramallah, na Cisjordânia ocupada --este governado pela Autoridade Nacional Palestina.
O drama escala em especial na falta de acesso a serviços de saúde, não apenas para os feridos do atual conflito, mas para tantos outros com doenças crônicas ou enfermidades adquiridas nas últimas semanas. A ministra da Saúde palestina, a médica e diplomata Mai Al-Kaila, afirmou em comunicado que "a catástrofe em Gaza" está se agravando devido à incapacidade dos hospitais e demais centros de saúde de fornecerem tratamento aos feridos, uma consequência da escassez de suprimentos médicos e também de combustível.
Segundo os dados palestinos, 16 dos 35 hospitais com capacidade de internação em Gaza pararam de funcionar, e 51 dos 72 demais centros de atenção primária fecharam as portas devido à falta de combustível. É justamente o acesso limitado à gasolina, o que por consequência dificulta o bombeamento de água, um dos pontos mais críticos nesta etapa do conflito armado. Somente na Cidade de Gaza, a mais populosa da faixa, isso também levou 25 estações de bombeamento de esgoto a pararem de operar, e a administração local afirma que, em breve, há risco de vazamento e inundação dos dejetos pelo município.
Têm se multiplicado os relatos de infecções respiratórias, diarreia e sarampo, em especial nos 150 superlotados abrigos da agência de refugiados da ONU que abrigam cerca de 717 mil deslocados desta guerra ao longo de toda a faixa e onde, pela presença da organização, é mais fácil documentar os casos de doenças transmissíveis. Conforme os escritórios de Gaza, há no território palestino cerca de 350 mil pacientes com doenças crônicas, como diabetes e câncer.
Há ainda mil palestinos que precisam periodicamente realizar diálise; ao menos 80% dos centros onde há máquinas para o procedimento, no entanto, estão no norte da faixa --a região mais bombardeada por Israel e também aquela que Tel Aviv exige que seja desocupada sob a ameaça de uma invasão por terra.
A representação da OMS (Organização Mundial da Saúde) para territórios palestinos também tem soado o alerta sobre mulheres gestantes e puérperas. Segundo o braço da ONU, há cerca de 50 mil mulheres grávidas em Gaza e uma média de 180 dá à luz a cada dia. A organização projeta que 15% delas sofrerão complicações relacionadas à gravidez ou ao parto e precisarão de assistência médica.
Também as crianças são protagonistas neste conflito. Com aproximadamente 41% de população com idades até 14 anos, Gaza é majoritariamente jovem. A média de filhos nascidos vivos por mulher gira em torno de 3,3, enquanto a média global é de 2,3. Assim, são também as crianças palestinas boa parte das vítimas --até aqui, mais de 4.600, segundo as cifras do Ministério da Saúde local. A cifra levou diferentes autoridades globais, mais recentemente o secretário-geral da ONU, António Guterres, a chamarem o território foco do conflito de um "cemitério de crianças".
(Com informações da FolhaPress)